As ditaduras podem voltar
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- Frei Betto
- 25/07/2009
Todos os ditadores – de Hitler a Médici, de Batista a Stalin, de Franco a Somoza – passam à história como figuras execráveis, cujos nomes, estigmatizados, se associam às vítimas de seus governos tirânicos.
Aliás, Tirano era o comandante da guarda do rei Herodes. Seu nome tornou-se sinônimo de crueldade por se atribuir a ele a execução da ordem real de decapitar, em Belém, todos os bebês, entre os quais estaria Jesus se José e Maria não tivessem fugido com ele para o Egito.
A América Latina carrega em sua história longos períodos de supressão do regime democrático. No século XX, o Brasil conheceu dois: sob o governo Vargas (1937-1945) e sob o regime militar (1964-1985), sem falar dos que governaram sob Estado de Sítio.
O paradoxo é que todas as ditaduras latino-americanas foram suscitadas, patrocinadas, financiadas e armadas pelo governo dos EUA. Até o mandato de George W. Bush, para a Casa Branca, democracia consistia numa panacéia, mera retórica política. Fala-se que nos EUA nunca houve golpe de Estado porque não há, em Washington, embaixada americana...
O recente golpe em Honduras, que resultou na deposição do presidente Zelaya, democrática e constitucionalmente eleito, coloca o governo Obama frente à hora da verdade. Ao receber a notícia, Hillary Clinton, secretária de Estado, vacilou. Talvez tivesse manifestado apoio aos golpistas se o presidente Obama, em viagem à Rússia, não houvesse reagido em defesa de Zelaya como legítimo mandatário.
Ainda assim, os EUA não suspenderam sua ajuda financeira e militar às Forças Armadas hondurenhas, que sustentam o ditador de plantão.
A política externa da Casa Branca trafega sobre o fio da navalha. Sabe que Zelaya está mais próximo de Chávez que dos falcões usamericanos que ainda comandam a CIA. Esta agência, especializada em terrorismo oficial, não foi devidamente saneada por Obama. E, agora, tenta justificar o golpe sob o pretexto, infundado, de que o presidente da Venezuela estaria prestes a remeter comandos militares a Honduras para derrubar os golpistas e devolver o mandato ao presidente Zelaya.
A América Latina conheceu significativos avanços políticos nas últimas duas décadas. Após destronar as ditaduras militares e rechaçar presidentes neoliberais – Collor no Brasil, Menem na Argentina, Fujimori no Peru, Caldera na Venezuela – demonstra preferência eleitoral por candidatos oriundos de movimentos sociais, dispostos a disputar o espaço das esferas de poder com os tradicionais grupos oligárquicos.
É verdade que o uso do cachimbo entorta a boca. Alguns mandatários, em nome da governabilidade, não têm escrúpulos em fazer concessões a velhos caciques políticos notoriamente corruptos, representantes de feudos eleitorais marcados pela mais extrema pobreza.
Quando um líder político de origem progressista se deixa cooptar pela oligarquia conservadora, o que está em jogo, de fato, não é a propalada governabilidade. É a empregabilidade. Perder eleição significa o desemprego de milhares de correligionários que ocupam a máquina do Estado. Nesses tempos de crise financeira não é fácil inserir órfãos do Estado na iniciativa privada. Seria, para muitos, atroz sofrimento perder o cargo e, com ele, as mordomias, tanto materiais - transporte e viagens pagos pelo contribuinte -, como simbólicas - a aura de autoridade que desencadeia em torno ondas concêntricas de bajulação.
Todos sabemos que, hoje, no centro da vida política se sobressai a questão ética. A maioria dos políticos teme a transparência. Por isso, muitos, descaradamente, agem por baixo dos panos, promulgam decretos secretos, acumpliciam-se em maracutaias, tratam como de somenos importância o fato de o deputado do castelo usar verba pública em benefício próprio, ou um senador, ex-presidente da República, incluir sua árvore genealógica na folha de pagamento custeada pelo contribuinte.
Se não se estancar essa deletéria convivência e conivência de lideranças outrora progressistas com velhos e corruptos caciques, não se evitarão a descrença na democracia, a deterioração das instituições políticas, a perda do senso histórico na administração pública. O que constitui excelente caldo de cultura para favorecer o retorno de ditadores salvadores da pátria.
Frei Betto é escritor, autor de "Calendário do Poder" (Rocco), entre outros livros.
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Comentários
Com todo o respeito que senhor me merece acho o seu artigo um tanto quanto extemporâneo. Raciocine comigo: O Senhor participou de toda a trajetória do PT do qual parte da igreja foi avalista. A Articulação, corrente liderada pela Lula, do qual o senhor foi assessor hospedado no Palácio do Planalto, fez uma mudança no PT pela direita, acabando com a democracia interna do partido e com seus núcleos de base. O que passou a valer, a partir daí, foram os mandatos dos deputados e seus séquitos de oportunistas atrás de emprego no Estado. O PT virou o partido da boquinha e muito mais (Nem é preciso relembrar).
Ora, todas os movimentos da Articulação dentro do PT tinham todos os indícios de que a corrente majoritária do partido havia decidido agir em conformidade com a ordem burguesa. E o PT majoritário, mesmo antes de chegar ao Planalto, já tinha se despido de toda e qualquer referencia à ética e ao socialismo, mesmo indefinido, de sua fundação. José Dirceu, Sivinho da Land Rover Defender de 80.000 reais - Delúbio Soares,a República de Ribeirão Preto e por aí vai são frutos e artífices dessa opção pela direita. Este espaço não daria para relacionar as coisas escabrosas feitas pelo \"novo\" PT. Então quando o senhor fala que \"quando um líder político de origem progressista se deixa cooptar pela oligarquia conservadora\",no mínimo o senhor faz um esforço de perda de memória. O PT e o Lula não foram cooptados quando o senhor trabalhava no Palácio do Planalto, foi muita antes, em diversos governos e prefeituras .Frei Betto, com todo o respeito, não esqueça da história. Ela é uma grande conselheira. Achei decente sua saída do Governo Lula, mas o senhor não pode falar dele(Lula) nem de maneira indireta. Desculpe-me a sinceridade.
É interessante escrever artigos ou comentar artigos com rito ideológico. Pelo que eu (não) sei o Presidente de Honduras, senhor Zelaya, não encontrou guarida no Congresso Nacional, tão pouco na Suprema Corte, nas suas pretensões de continuar no Governo. Aqui não se comenta a atuação dessas duas Casas do Governo do Estado de Honduras, que me parece fazem parte do chamado estado democrático. Valem ou não valem as decisões do Congresso e da Suprema Corte Hondurenhas?
Sou mais socialista do que muita gente que se diz defender o Estado Democrático de Direito, na óticas de suas conveniências.
Veja o caso do senhor Fernando Collor perdeu o mandato, eleito democraticamente, e teve os seus direitos políticos suspensos por oito anos, tudo isso dentro das normas constitucionais.
Será que a Constituição por uns e não para outros?
Não conheço os atuais governantes de Honduras, mas por aqui jamais ouví qualquer pronunciamento deles.
Absolutamente não sou de "direita" realço, entretanto as ideologias já estão ultrapassadas, o que importa, hoje em dia, é a defesa incondicional dos direitos de todos.
Hélio Mendes Cazuquel, Presidente da FUNDAÇÃO INSTITUTO DE DIR3ITOS HUMANOS.
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