Para os corações que amam
- Detalhes
- Gabriel Brito
- 03/07/2015
“Ainda vamos pagar caro por essa vitória”. Foi com essa frase que meu irmão definiu o título brasileiro na Copa América de 2007, após um inesperado 3 a 0 sobre a Argentina de Riquelme, Tévez e um iniciante Messi, em Maracaibo.
De fato, pagamos. Após acreditar nos ilusórios resultados e títulos que na verdade não damos bola, baseados em vitórias à base da força, contra-ataque e bola aérea, vimos uma seleção sem recurso algum cair para uma Holanda apenas mediana em 2010 e o ciclo dunguista chegar ao fim.
Pois bem. Em quatro anos de tentativas desesperadas de recuperar o encanto perdido, sem nenhuma reflexão de fundo, muito menos alguma reforma estrutural, a decrépita e corrupta Confederação reelegeu o ex-volante para reabilitar o futebol nacional, após sua maior tragédia.
Mostrando como realmente gostamos de nos enganar, boa parte da crítica, aquela que se rende fácil aos resultados e ao pragmatismo barato, já vendia a ideia de recuperação, vitórias importantes e uma reafirmação do escrete. Não falamos de Rede Globo apenas, mas de parcela dos analistas supostamente mais refinada.
Assim, a nova queda nos pênaltis para o Paraguai, repetindo a sorte de 2011, é uma boa notícia para os que ainda alimentam qualquer ideal em relação ao jeito brasileiro de jogar, no sentido de ver em campo um time que realmente pareça representar nossa maneira de ser e ver o mundo.
Pode demorar, mas é o único horizonte que interessa. Ver um time de mentalidade careta e militarizada, definitivamente, não dá mais e não há título que recompense a rendição à tamanha mediocridade.
Mais uma vez, o Brasil foi um time de uma ou duas boas jogadas, a exemplo da trama do gol, como aquele fiapo de cabelo que comprova o velho DNA. No entanto, logo retrocedeu e deixou os paraguaios emparelharem o jogo.
De igual pra igual, com a mesma previsibilidade de movimentos em campo e esquemas quase espelhados, não é tão difícil o time em desvantagem encontrar uma bola salvadora.
Ainda mais quando o desequilíbrio emocional volta a dizer presente, como demonstrou Thiago Silva e sua privação de sentidos.
Derlis González cobrou o pênalti, empatou e ninguém imaginava que o amontoado canarinho pudesse retomar a rédea da partida, colocar os guaranis contra as cordas e bombardear o adversário até marcar outro gol. Longe disso.
Até o fim, a mesma ladainha. Linhas que se batem o tempo todo feito times de handebol, sem que ninguém passe por ninguém, lançamentos, cruzamentos e, como bem dito nesta crônica, um aparente desespero pelo fim da peleja, pelo menos no lado que um dia levava o jogo ao estado da arte e da autorrealização.
E se nossa torcida esbanja futilidade e “novos hábitos”, sob medida desse futebol gourmetizado, ainda existem povos que se emocionam com seu time.
Findo mais um desengano, o país olhava cabisbaixo os pênaltis. Diante do estado de espírito de cada contendor, o desfecho já se desenhava previsível.
Enquanto nossos sentimentos são cada vez mais gélidos, do lado paraguaio ocorria uma dessas tragédias às quais só o futebol pode emprestar algum romantismo.
Após a cobrança da vitória, do mesmo autor do gol no tempo normal, o coração de Manoel, tio do camisa 10, não aguentou e se despediu desse mundo logo após a classificação. Aqui, seguramente, não haveria a menor possibilidade de ocorrer o mesmo.
Dessa forma, o confronto de Concepción teve um justo vencedor. Boa sorte a Derlis González e bom descanso ao já saudoso tio Manoel.
Gabriel Brito é jornalista do Correio da Cidadania e colaborador da webrádio Central3.
Comentários
de forma concreta, e não há dar voltas
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