“Americanalhização” da política
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- Léo Lince
- 16/07/2010
Carlos Nelson Coutinho, estudioso sério da nossa realidade, definiu com precisão o processo em curso no atual momento brasileiro: "americanalhização" da política. Isso mesmo. Uma democracia formal e banal, onde a política, apequenada, se deixa colonizar pelo jogo pesado dos pontos fortes da economia. Na matriz de origem, o padrão já não presta. A cópia, então, é um desastre total.
A batalha travada no bojo da luta que superou o autoritarismo militar, apesar das conquistas obtidas, não resultou em uma nova república, nem constituiu a nova gramática do poder. A perspectiva de uma democracia de massas, substantiva, revolveu camadas profundas, mudou muita coisa da morfologia da sociedade, mas não conseguiu fechar o circuito da mudança.
A transição negociada de cima amainou o impulso da resistência democrática. O surto neoliberal, com Collor e FHC, preparou as bases da recomposição do domínio oligárquico. Depois, em novo impulso, a esperança venceu o medo. Mas, com a corrupção programática do lulo-petismo, as cartas da política foram outra vez embaralhadas, dando lugar ao quadro atual.
Não se estimula mais o debate de idéias, programas, projetos coletivos. Primeiro, cuidou-se de desideologizar a política. Na seqüência, despolitizar a sociedade civil, desativar a militância republicana e desmobilizar a cidadania. Cidadão não é mais o soberano da política, mas o encurralado que recebe bolsa, cota, cheque mensal. São mensalistas do leviatã benevolente.
Por outro lado, na base pulverizada que aprisiona os parlamentos aos executivos, prospera o fisiologismo da velha aritmética do poder. Máquinas eleitorais acoitadas na máquina dos governos. A pequena política dos partidos não-ideológicos, de base social heterogênea, cartéis de diferentes lobbies, ajuntamentos para o mero desfrute do poder. Políticas públicas universais? Ideologia, coisa superada. Movimento social autônomo? Um estorvo a ser criminalizado.
No centro do modelo dominante está a apologia da privatização. Ao mercado, deus de prótese, cabe a primazia na tarefa de regulamentar os conflitos de interesses e ordenar as demandas sociais. A auto-organizarão da sociedade? Tudo bem, desde que orientada para interesses corporativos, setoriais ou privatistas. Os largos espaços da mídia se abrem para o debate de escolhas, até importantes, desde que situadas no plano do privado, das cotas, dos focos, resultados pontuais.
Ao mesmo tempo, o arranjo intra-oligárquico que define a posse do poder político, nos executivos e nos parlamentos, opera em segredo, no recôndito das fortalezas inexpugnáveis do privado. A mídia grande, associada ao modelo dominante, constrói a polarização de fancaria, ancorada nas coligações partidárias invertebradas, sopas de letrinhas intercambiáveis ao câmbio do dia.
Serra e Dilma, o candidato oficioso e a candidata oficial do condômino de poder que nos governa, vão receber a quase totalidade do financiamento privado de campanha e do fundo partidário, vão ocupar a parte do leão do horário eleitoral e da cobertura dos meios de comunicação de massas. Afinal, eles são artífices e beneficiários da "americanalhização" da política brasileira.
Léo Lince é sociólogo.
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Comentários
dos movimentos sociais, é a formação de correias de transmissão de discursos/poder nos canais de controle social criados após a Constituição de 1988. conselhos, conferências nacionais,aparelhados pelos partidos, dizendo amén `as políticas que vêm do Planalto. um projeto fascista. é assustador.
ótima reflexão.
sinceros parabéns.
abraços e tudo de bom,
Os sindicatos foram se dissolvendo. Os objetivos sociais foram perdendo espaço para os donos dos cifrões daquí e de fora. Opovo perdeu noção de cidadania e nacionalismo. A Bandeira foi rasgada, na verdade de tudo.
O Sr. FHC foi o responsável pela desestruturação de nossa sociedade, das classes trabalhadoras e tudo isto para atender os interesses das potências internacionais. Sempre foi claro que os sentimentos desse ilustre que passou pela Presidência estava, esteve e está através de seu Partido Político sempre voltado aos interesses internacionais.
Tomara que não voltem ao poder seus discípulos para que não fiquemos nas esquinas colhendo assinaturas contra apagões, vendas da Petrobras, etc, etc, etc. Tomara que possamos dirigir e encontrar somente os pedágios que já existem de 40 em 40 km; que não se estenda por todo território nacional. Tomara que não tenhamos altas nos preços de combustíveis à cada mês e que nosso Ministro da Economia não tenha que viajar para o FMI com cuiazinha nas mãos pedindo esmolas para não sei o que que ninguém nunca viu.
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