Salário mínimo, lucro máximo
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- Leo Lince
- 24/02/2011
A sabedoria popular dos grandes sertões, recolhida por Guimarães Rosa e posta na boca do jagunço Riobaldo, ensina que "passarinho que se debruça, o vôo já está pronto". Sendo assim, o governo da presidenta Dilma começa carregado de maus prenúncios para quem trabalha e vive de salários.
Não é o caso de levantar escândalo de começo, pois "só aos poucos é que o escuro é claro". Mas é caso para botar as barbas de molho. As primeiras medidas do novo governo, apesar do slogan publicitário, evidenciam uma clara opção preferencial pelos ricos. Basta ver o aplauso entusiástico do coro dos contentes.
O aumento na taxa básica de juros, o corte bilionário no orçamento e, principalmente, o arrocho do salário mínimo, todas são medidas articuladas de um ritual quase religioso. É o batismo de fogo do novo governo e de sua equipe. Nele, como se vê, se reafirmam os votos de vassalagem aos dogmas da ortodoxia dominante, e aos magnatas supremos do capital financeiro.
Dia sim e outro também, os grandes jornais associados aos pontos fortes da economia abrem editoriais para "orientar" o governo. Os daqui e os lá de fora. Guido Mantega, que nos tempos do Meirelles fingia contraponto, agora é chamado pelo Financial Times de "falcão fiscal convertido".
Acabou a "esquizofrenia", agora a Fazenda e o BC apontam para a mesma direção. Todos gostaram muito da embocadura inicial do governo Dilma e querem mais, muito mais. Apesar do estrago provocado pelos quatro cantos do mundo, os ideólogos da supremacia financeira estão em plena ofensiva em nosso país. E o Brasil é a bola da vez.
A batalha do salário mínimo produziu um espetáculo revelador. A presidenta e seus ministros, além dos deputados e senadores da base de apoio do governo, que acabaram de receber aumento real entre 62% e 142% em seus contracheques, organizaram uma verdadeira operação de guerra contra o aumento do salário mínimo. Impressionante a desfaçatez. Não pode, desequilibra as contas públicas, implode a economia, é contra o Brasil. Foi espantoso ouvir a velha falácia conservadora na boca de ex-líderes do sindicalismo que já foi combativo. Cômico e trágico.
O corte dos gastos, que vai sacrificar políticas públicas essenciais; o aumento dos juros, que vai desacelerar o crescimento da produção; e o arrocho salarial, que vai intensificar a exploração do trabalho, todas elas são medidas voltadas para a formação de superávit primário. Ou seja, grana reservada para pagar em dia os juros da dívida! Em 2011 o Brasil deverá gastar cerca de 230 bilhões com os juros. A grande meta de toda economia do setor público é juntar dinheiro para garantir o ganho do especulador.
O gráfico em forma de torta que fornece uma visão geral do que foi o orçamento brasileiro em 2010, sem dúvida, é de cortar os pulsos. Qualquer um que o contemple ficará pálido de espanto. A dívida come mais de metade da torta: 53,85%. O resto, a banda menor da torta, é o que sobra para cobrir todas as demais despesas e investimentos da máquina pública brasileira. Um absurdo. No entanto, apesar dos sacrifícios crescentes, o tema é sempre mantido fora do debate. Auditoria da dívida? Nem pensar. Trata-se de assunto proibido, tamanha é a hegemonia do pacto conservador que nos governa.
Essa é a dura realidade que já cravou sua marca nas feições da nova administração. No governo da presidenta Dilma, assim como nos anteriores, a economia política do capital continua ganhando de goleada da economia política do mundo do trabalho. Salário mínimo, lucro máximo.
Léo Lince é sociólogo.
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Comentários
É nossa que botamos no puder políticos ordinários. Eles continuam lá... Em todos os mandatos... Não muda nunca, são sempre os mesmos.
01 - O Brasil pagou ou não a sua dívida externa? Entendi que nossas finanças estavam sanadas. Tão sanadas que emprestamos dinheiro para o FMI. No entanto, parece que estou entre os idiotas brasileiros, que mesmo lendo, acompanhando ainda são enganados pelas retóricas petistas. Pagamos mais 50% dos valores orçamentários em juros de qual dívida?
2 - Qual é a lógica: Pagamos a dívida e, continuamente registramos grandiosa arrecadação tributária... e ainda assim assistimos cortes orçamentários na saúde e educação. Como se explica esta porcaria?
3 - O problema, penso, nem é o de ter apoiado a Presidenta DILMA, mas é o de saber que não havia nenhum outro candidato que pudesse modificar, para melhor, a vida do povo.
04 - Minto... havia Plinio, mas os/as eleitores/as ainda não conseguem entender isso.
Merecemos o governo que temos.
É muito fácil indignarmo-nos com as ações e atos dos nossos políticos. Só esquecemos que quem os elegeu fomos nós. Portanto...
A indignação é improdutiva se não vier acompanhada de uma ação pertinente.
A indignação não adianta nada, se não tomarmos uma posição definida e nos perguntarmos: "O que estou fazendo para ajudar a dar um basta nisso?"
Estamos participando ativamente da vida política do país? Lembramos o nome do vereador, do deputado estadual que ajudamos a eleger? Visitamos o gabinete de algum desses nossos representantes alguma vez? Cobramos deles o cumprimento das promessas de campanha? Participamos de alguma reunião (ou comício) do partido do nosso representante? Conversamos com alguém dessa turma que alega que a melhor coisa a fazer é anular o voto, para fazê-lo mudar de ideia?
"... A presidenta e seus ministros, além dos deputados e senadores da base de apoio do governo, que acabaram de receber aumento real entre 62% e 142% em seus contracheques, organizaram uma verdadeira operação de guerra contra o aumento do salário mínimo. Impressionante a desfaçatez.."
Essas pessoas foram eleitas por nós...
Parabéns.
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