Sem concessões, Israel enfrenta a opinião pública mundial
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- Luiz Eça
- 21/09/2011
Em reunião do Conselho de Segurança Nacional dos EUA, o ex-Secretário da Defesa, Robert Gates fez um comentário surpreendente: ”O governo israelense é um aliado ingrato”. E esclareceu, dizendo que eles oferecem “nada em retorno” dos maciços volumes de ajuda americanos. Referia-se, entre outros fatos, à intransigência do governo Netanyahu, negando-se a fazer concessões no contencioso com os palestinos.
“Para que?”, responderia o primeiro-ministro israelense. E, de fato, mantendo-se sempre inalterável em suas posições, não cedendo jamais, os israelenses sempre conseguiram tudo dos governos Bush e Obama – aos quais Gates serviu.
Como aconteceu no primeiro ano do governo de Obama, quando Netanyahu recusou-se a interromper a construção de novos assentamentos na Palestina, condição essencial para as negociações de paz se iniciarem, Obama apelou, reclamou, bateu o pé e o máximo que ele conseguiu foi uma moratória dos assentamentos, aliás, parcial e de curta duração.
Ou quando Obama, num assomo de independência, declarou que as negociações sobre o novo Estado palestino deveriam ter por base as fronteiras de 1967. Foi a vez de Netanyahu protestar. Só que seu protesto funcionou. Ele voou a Washington e, de um dia para outro, multiplicaram-se críticas na imprensa à idéia de Obama e o primeiro-ministro israelense foi recebido debaixo de aclamações no Congresso americano. Obama teve de se explicar, só faltou pedir desculpas.
A história ameaça se repetir agora, quando a Autoridade Palestina vai requerer à ONU o reconhecimento do seu Estado como membro pleno.
Há um ano, Obama declarou em alto e bom som que, em 2011, esperava ver a Palestina na ONU, como Estado-membro. Em maio deste ano, Cameron e Sarkozy anunciaram, oficialmente, que seus países, Reino Unido e França estariam prontos a apoiar uma declaração unilateral do Estado palestino se, em setembro, as negociações de paz não tivessem sido relançadas.
Aparentemente, Obama esqueceu seus votos. Afinal, ele os fez faz tempo... Quanto a Cameron e Sarkozy, as negociações de paz continuam mortas, mas, enquanto o inglês mudou de idéia, Sarkozy, ao menos, mantém algum suspense, embora tenha dado muitas pistas de que vai somar com seu colega do outro lado do Canal.
Por sua vez, a Alemanha já anunciou sua posição contra o reconhecimento e a favor de negociações. Curiosa a explicação do Ministro das Relações Exteriores, Guido Westerweller: “A Alemanha tem uma responsabilidade particular em relação a Israel”. Referia-se às perseguições e massacres em massa dos judeus pelos nazistas. Isso reflete um sentimento de culpa bastante discutível. Os alemães de hoje não podem ser responsabilizados pelo que fizeram os alemães de 70-80 anos atrás. Mesmo sem culpa, a Alemanha já doou muitos bilhões a Israel. E se fosse considerada devedora, deveria ser das famílias dos perseguidos, não do Estado de Israel. Finalmente, apoiar a injusta causa israelense é fazer os palestinos pagarem pelos crimes dos nazistas alemães.
Os representantes alemães na ONU e os demais integrantes do chamado “Quarteto do Oriente Médio” – EUA, ONU, Rússia e Comunidade Européia - acham-se, presentemente reunidos, procurando um caminho. Estão muito preocupados com a imagem deles. Sabem que opor-se ao pedido palestino seria “um severo golpe na credibilidade da Comunidade Européia no mundo árabe”. Juppé, ministro das Relações Exteriores da França, ajuntou que seria uma “catástrofe” se a Autoridade Palestina conseguisse os votos favoráveis da grande maioria (prevê-se mais de 150 dos 194 membros) na Assembléia Geral da ONU e fosse vetada pelos EUA no Conselho de Segurança.
Temendo a reação árabe, esses senhores procuram acalmar os israelenses que ameaçam reter os impostos por eles coletados em nome dos palestinos, a quem esse dinheiro pertence de direito. Cruamente falando, isso seria apropriação indébita. A qual, para ser efetivada, Tel-aviv esclarece, bastaria que a Autoridade Palestina levasse adiante sua reivindicação.
Não se ouve nenhuma condenação internacional a esse autêntico crime que o governo israelense friamente anuncia como castigo a seu oponente palestino. A reação dos representantes ocidentais limitou-se a tentar dissuadir Israel, mostrando que a apropriação provavelmente causaria a queda da moderada Autoridade Palestina. E sua substituição por um grupo nitidamente radical.
Outras medidas punitivas que os israelenses anunciaram como possíveis foram a anexação dos assentamentos a Israel e o cancelamento dos Acordos de Oslo, que concederam à Autoridade Palestina a administração da Cisjordânia e de Gaza. Tanto uma quanto outra implicam em violações de decisões da ONU. Mas isso não preocupa Israel, responsável por muitos ilícitos semelhantes. Nenhum deles punido até agora.
Como sempre, Israel conta com os prestimosos serviços do Congresso dos EUA (“o melhor congresso que o lobby pró-Israel pode comprar”, segundo jornalista americano). Seus integrantes também usaram a linguagem da ameaça para convencer os palestinos. Caso insistam com sua pretensão, seca a fonte de recursos americanos para a Palestina.
Entramos na semana decisiva. Como sempre Israel não cedeu nem um centímetro. No começo, talvez assustado, Netanyahu anunciou “propostas generosas”. Mas, logo deixou disso. Limitou-se a defender a tese das negociações contra o “unilateralismo” palestino. Como se negociações não viessem sendo tentadas há cerca de 20 anos sem o menor sucesso. Como se os palestinos não tivessem direito de pedir reconhecimento ao órgão responsável pela ordem mundial.
As últimas notícias que chegam é que os representantes do Ocidente e da Rússia descobriram um jeito de resolver o problema. Deixar que os palestinos façam seu pedido ao Conselho de Segurança para, em seguida, “congelá-lo” durante uns 6 meses, período no qual, através de negociações bilaterais, seria possível avançar em direção à paz e à concretização da idéia dos “dois Estados soberanos na Palestina.”
Esta solução atenderia ao principal objetivo do “Quarteto do Oriente Médio”, que é preservar o prestígio dos americanos e dos europeus no mundo árabe. Não se está pensando tanto em julgar a justiça da pretensão palestina, pois, nem de longe, existe coragem para votar contra os EUA e seu protegé, Israel.
Aparentemente, todo mundo sairia contente. Mas, a idéia esbarra em dois problemas. Para haver negociações é necessário que Netanyahu concorde em paralisar os assentamentos totalmente. E, mesmo que ele o faça, será que os palestinos vão confiar em que seria para valer?
São barreiras difíceis de superar. O primeiro-ministro israelense está acostumado a conseguir tudo sem dar nada em troca (vide testemunho do secretário da Defesa Gates). Ele sabe que, fazendo pé firme, Obama vai chiar, mas vai vetar. Os principais países europeus não irão contestar o líder da potência ainda hegemônica no planeta. E os palestinos estão cansados dos acenos de Netanyahu, que jamais passaram de acenos.
Enquanto os chefões das grandes potências discutem, o povo já se pronunciou. Recentíssima pesquisa da BBC em 19 países mostra que a maioria da sua população apóia os palestinos. Até mesmo os americanos: 45% pró- reconhecimento versus 36% contra. Mas são dados pouco relevantes.
Para Barack Obama é mais importante a posição dos deputados e dos senadores do que a do seu povo. Para Cameron, Sarkozy e Merkel, o que conta mais é a posição de Obama.
Luiz Eça é jornalista.
Website: Olhar o mundo
Comentários
Analogias a parte, o processo de paz é uma farsa, evidentemente. No mesmo instante em que foi assinado o Acordo de Oslo, os Bulldozers israelenses desapropriavam territórios na Cisjordânia. Diante do aumento dos protestos a favor do Estado palestino em todo o mundo (e inclusive em sua própria casa), o bebezão Natanyaru age simplesmente como um imbecil (que, de fato, é). Os israelenses mais sensatos, como o jornal Haaretz, estão inconformados com a intransigência da direita fundamentalista de seu país.
O Estado palestino na melhor das hipóteses será reconhecido como Estado observador e não como Estado-membro. A questão não é saber se irá ou não ser aprovado o requerimento da OLP na ONU. A questão é saber o que irá acontecer quando não for.
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