Correio da Cidadania

Mudam as penas, ficam os falcões

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Nos últimos meses, as pesquisas norte-americanas mostram o presidente George W. Bush estacionado em 62% de rejeição, o que mostra uma firme tendência contrária. Apesar de o Partido Republicano dispor de candidatos fortes, as chances dos democratas emplacarem o próximo presidente são altas.

 

No entanto, a julgar pelo que os principais nomes da oposição – Barack Obama e Hillary Clinton – vêm dizendo, pelo menos no Oriente, não se deve esperar grandes mudanças na política externa da Casa Branca.

 

A senhora Clinton tem se revelado um falcão de fazer inveja ao próprio Bush. Ela foi o último senador democrata a admitir seu erro no apoio à invasão do Iraque. No ano passado, depois de defender o aumento das tropas americanas para 200 mil soldados, acabou aceitando a retirada, porém, condicionando-a a “deixar um contingente menor nas áreas seguras com maiores efetivos na área de inteligência e capacidade de atacar com rapidez”.

 

Não é preciso dizer que o governo iraquiano teria uma independência muito restrita tendo essa força estacionada no seu território, pronta para “atacar com rapidez” caso ele resolva aliar-se a seus irmãos xiitas do Irã ou revogar a nova lei do petróleo que está lhe sendo imposta goela abaixo.

 

Hillary já se revelou implacável inimiga do Irã, taxando-o de ameaça aos Estados Unidos e Israel. Chegou ao ponto de criticar Bush, que teria perdido tempo com negociações diplomáticas em vez de apelar logo para sanções econômicas e ameaças.

 

As ações de Israel na Palestina vêm sendo aplaudidas pela pré-candidata democrata como o muro de Sharon, que corta cidades e propriedades rurais da Cisjordânia, anexando grande porções do território árabe. Coerente, ela protestou contra a Corte Internacional de Justiça por ter condenado o muro. Na invasão do Líbano, aprovou as ações militares de Tel Aviv apoiando “o que fosse necessário para defender Israel contra o Hamas, o Hizbollah, o Irã e a Síria”. Finalmente, declarou que só aceitaria a existência de um estado palestino se negociado pelas duas partes, pois “uma declaração unilateral é absolutamente inaceitável e representaria o fim da ajuda americana”. Posição que desobedece decisão da ONU, exigindo que Israel respeitasse a independência da Palestina, retirando-se de lá.

 

Hillary levou longe seu radicalismo ao censurar o senador Barack Obama, por ter declarado que, eleito presidente, negociaria com o Irã, a Síria, a Coréia do Norte e a Venezuela. “Irresponsável e ingênuo”, fulminou, pois esses “inimigos” usariam as reuniões para propaganda...

 

Embora não tão duro quanto Hillary, Obama, em essência, não diverge dela. A não ser talvez no “affair” Iraque. Ele foi dos únicos senadores a votar contra a invasão quando todo mundo nos Estados Unidos era a favor.

 

Quanto à Palestina e ao Irã, Obama surpreende. Rotular o papel de Sharon no conflito de “absolutamente importante e construtivo” foi algo digno de Cheney. Mas ele foi adiante. Sustentou ser necessário continuar a prestar assistência militar ao exército israelense, fornecendo avançadas armas e equipamentos. Como Bush, ele não aceita conversar com o Hamas. Foi co-patrocinador do Ato Anti-Terrorismo Palestino de 2006, que conclamava a comunidade internacional a evitar contatos e financiamentos para o governo do Hamas “até que ele reconheça Israel, renuncie à violência e desarme-se”. Não exigiu reciprocidade – os israelenses poderiam continuar a praticar “assassinatos seletivos” dos suspeitos e negar-se a reconhecer o estado palestino nos limites definidos pela ONU.

 

Quanto ao Irã, Obama é quase tão agressivo quanto Hillary. Com ela, acha que o programa atômico desse país tem de ser detido - se não pela diplomacia, que seja pela força. Obama deplora pois isso alienaria a simpatia do povo árabe mas, para ele, o que vem em primeiro lugar seria a segurança de Israel, assombrada pelos avanços nucleares de Teerã. Tudo isso foi declarado em alto e bom som, em Washington, na reunião da AIPAC (America Israel Public Action Comittee), o mais poderoso lobby judaico dos Estados Unidos.

 

Seis mil pessoas, judeus e não-judeus, dezenas, talvez centenas, de congressistas e altas personalidades do governo como o vice-presidente Dick Cheney estavam presentes nessa reunião, onde os candidatos a presidente reafirmaram seu amor por Israel.

 

Todos eles cortejam os votos judaicos, mas os democratas não podem nem pensar em perdê-los. Sem eles, sua vitória democrata nas eleições de Nova Iorque ficaria em risco, pois a população judaica do estado é muito grande. E como Nova Iorque é o estado que dispõe de maior número de votos eleitorais, uma derrota aqui significaria provavelmente pôr a Casa Branca novamente em mãos republicanas.

 

Historicamente a comunidade judaica americana sempre apoiou teses progressistas, como os Direitos Humanos e o fim da guerra do Vietnã. Judeus destacaram-se como intelectuais, jornalistas e políticos de esquerda. Natural que a maioria judaica preferisse os democratas em função da postura mais aberta do partido.

 

Esta situação foi mudando à medida que se repetiam os atentados terroristas contra a população de Israel. O número dos defensores dos direitos dos palestinos diminuiu, enquanto crescia a aceitação das ações violentas do governo e do exército de Israel como necessárias à segurança da nação. Hoje, embora existam ainda diversos intelectuais e jornalistas judeus americanos que favorecem a causa dos palestinos, a comunidade como um todo adota uma posição de franco apoio aos governos israelenses.

 

Para não perder votos certos, Hillary e Obama, que nos Estados Unidos são considerados de esquerda, no que se refere ao Oriente Médio praticamente referendam a política pró Israel do presidente Bush.

 

De acordo com dados da Comissão Eleitoral Federal dos Estados Unidos, nas últimas eleições, Hillary Clinton foi quem recebeu mais financiamentos do lobby de Israel, “excedendo por larga margem todos os outros democratas e republicanos”.

 

Em 2008, ela ou Barack Obama poderão ganhar a Casa Branca. Nesse caso, o fim da era Bush será muito festejado em todo o Oriente Médio.

 

Teme-se que seja por nada.

 

 

Luiz Eça é jornalista.

 

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