Correio da Cidadania

As saídas, se existem, virão por baixo

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Depois de uma semana que balançou o PMDB por conta de áudios que colocaram todos os limites do seu protagonismo como cabeça do governo interino à prova, a delação de Marcelo Odebrecht em curso promete um verdadeiro tsunami a atingir PMDB, PT, PSDB e PP.

 

No andar de cima de uma representação apodrecida, temos os lances que deixam à mostra a sensação de que não há saídas, e creio que não há mesmo nada que dê esperança no terreno institucional da representação, no curto e médio prazo. O governo interino de Temer começa sem qualquer lua de mel com o mercado, com a mídia e até mesmo sua base parlamentar já começa a cobrar a fatura do apoio que golpeou Dilma e o PT e permitiu que ocupasse essa posição, que considero cada vez mais provisória.

 

Assim, não se vislumbram quaisquer saídas das crises atuais pelo cenário institucional, seja pela permanência claudicante de Temer, seja pela improvável volta de Dilma ou mesmo pela convocação de novas eleições, que ganha força com a nova revoada de áudios que circulam. Afinal, no cenário de eleições, basta perguntar: quem serão os candidatos? Não se produzem lideranças de uma hora para outra e, fora Lula, quem pode ser tido como liderança?

 

Dado o pessimismo sobre o cenário nacional, que flutua à deriva dos interesses dos fluxos globais do capital financeiro e achata os interesses locais, colocando as eleições municipais em segundo plano no momento em que são fundamentais (para redimensionar o próprio jogo político em escala nacional a partir do local), resta ponderar para as lutas que se tecem e mobilizam a cena política da sociedade, desde o andar de baixo, que muito interessa.

 

Cabe destacar que não é fácil mobilizar, ao menos não tão fácil quanto parece. Também não é de se crer que estejamos no ponto de uma mobilização em múltiplas escalas e permanente, de forma a mudar as estruturas que temos, o que causa desalento, como apontei no início do texto. Mas o fato é que, se existe alguma brecha para a mudança e a prática democrática, essa está no terreno da sociedade, mesmo com todas as dificuldades.

 

Nesta seara, com todas as dificuldades e passando junto com o “Fora Temer” (que para alguns é um “Volta Dilma”) e olhando para o cenário a partir do Rio de Janeiro, onde vivo e acompanho mais de perto os processos, diferentes frentes se apresentam, com destaque para os estudantes secundaristas que mantêm suas ocupações há mais de dois meses, em paralelo à greve dos profissionais de educação, prestes a completar três meses, numa combinação que acabou por deflagrar ocupações por outros estados, tais como Rio Grande do Sul, Paraná e Ceará.

 

Recentemente, o estupro coletivo de uma menina deflagrou uma onda de manifestações organizadas por uma vibrante rede feminista que se espalhou pelo país. Some-se a isso a resistência que os favelados desempenham nos seus territórios com capacidade de articulação entre diferentes favelas e temos um cenário de movimento no âmbito da sociedade, nesta esfera descolada e tida como dominada pela institucionalidade.

 

Ali, apresenta-se potencial de mudar as estruturas, em especial se essas lutas começarem a se articular e somar forças com as áreas que serão mais afetadas pelo governo interino de Temer, e por qualquer governo no médio prazo: a educação e a saúde públicas, sem falar nas questões envolvendo moradia e mobilidade urbana. O caldeirão está esquentando. Por acaso, estamos entrando em junho.

 

Leia também:

 

‘Governo Temer não tem legitimidade política e capacidade operacional pra articular saídas à crise’ – entrevista com o economista Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo

 

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“Teremos um governo de crise permanente, que lembra o final do mandato de Sarney” – entrevista com o historiador Lincoln Secco

 

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Marcelo Castañeda é sociólogo e pesquisador do Programa de Pós-Graduação da UFRJ.

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