Eu rezo pelo vírus
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- Marcelo Castañeda
- 24/10/2019
A aprovação da Reforma da Previdência foi o limiar da garantia da continuidade do governo Bolsonaro no que diz respeito ao andar de cima. Ganhou uma rodada importante sem muita resistência dos mais afetados, como os trabalhadores formalizados e representados pelas centrais sindicais.
Afinal de contas, como contar com grandes mobilizações se a maioria da população sequer terá aposentadoria e as centrais praticamente aceitaram o destino de uma reforma que estava selada no conluio entre a maioria do parlamento e a grande mídia?
Outro aspecto a considerar na dificuldade de resistência à reforma foi o ataque às universidades públicas que poderiam qualificar a discussão e produzir contrainformação, ainda que desigualmente.
Não é à toa que vieram os cortes no final de abril e o Future-se no início de agosto, deixando caminho livre para o carro-chefe do governo Bolsonaro, que prosseguiu sem grandes alardes.
A próxima reforma vem para completar o serviço: a administrativa vem desmantelar o que é tido como antro de privilégios, o funcionalismo público.
Depois, fala-se numa Reforma Tributária. Tudo isso dentro do mantra liberal que deve se cortar gastos a qualquer preço sem falar em investimentos. Enquanto isso, Bolsonaro diz estar monitorando redes para evitar contágio latino-americano. Eu rezo pelo vírus.
O povo brasileiro não é manso, mas contido por uma máquina de morte chamada polícia e pelos dispositivos de controle e verticalização que, travestidos de esquerda no governo, reprimiram a última insurreição que tomou forma em terra brasilis, em junho de 2013.
Pensando globalmente, a democracia é uma ilusão vendida pelos 30 irrepetíveis 30 anos gloriosos do pós-guerra. O capitalismo é guerra, Estado e coerção. A única esperança advirá da revolta a solapar o que já está falido. Só nos falta ver.
Marcelo Castañeda é sociólogo e professor da UFRJ.