Correio da Cidadania

O tempo das trevas: quando a mudança pode vir do Centrão

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Em meio à lenta substituição do ministro da Saúde, que virou entretenimento nas redes sociais como “efeito Lula”, estamos diante de uma dura realidade: a mudança pode vir do Centrão e isso não é problematizado como retrocesso mas como esperança, em especial pela mídia corporativa.

Além do plano de morte que nos asfixia e deprime, Bolsonaro trouxe um efeito maléfico: rebaixou nosso horizonte político a ponto de que qualquer bote salva-vidas passa a ser visto como algo que vá nos salvar.

No domingo, 14, noticiou-se que Pazuello estava doente e precisaria sair. Depois de ser indicada por Arthur Lira (PP), com apoio do DEM, a médica Ludhmila Hajjar saiu de favorita para, depois de duas reuniões com o presidente, dizer que “não houve uma linha de convergência técnica” com o presidente.

Chegamos ao ponto em que há uma pressão do STF sobre o bolsonarismo, a partir da prisão de Daniel Silveira até chegar na anulação das decisões de Moro sobre Lula. Aproveitando essa brecha política para emplacar um nome no ministério mais rico e problemático durante a pandemia, o que lhe daria alguns cargos de segundo e terceiro escalão, ao Centrão não interessava ter o ministro e o governo poderia dar uma guinada.

Mas o plano de morte do presidente precisa ser mantido. A médica foi atacada pela rede bolsonarista de forma coordenada a partir de domingo, tendo inclusive sido ameaçada no hotel em que estava, de forma a legitimar a “falta de convergência”. Basta que a base fanática virtual, que é real, sinalize e o presidente se ancora. Isso não é democracia.

Podemos supor que o que existe hoje no arranjo de poder é uma tensão entre os militares e o Centrão para controlar o ministério com mais recursos na pandemia. Os mortos, as UTIs lotadas, a falta de oxigênio, tudo isso entra como justificativa.

O regime atual não tem porosidade para o exercício democrático do dissenso. E quando o Centrão se torna esperança de mudança, seja por tentar emplacar um “nome técnico”, seja por poder bandear para Lula, enfraquecendo Bolsonaro, seja porque possa comandar um processo de impeachment, é sinal de que estamos num ponto político muito rebaixado.

Neste sentido, o discurso soa como um bálsamo, mas o “efeito” do discurso não se mantém na inércia. É preciso agir. Não à toa na mesma semana, a PEC 186 foi aprovada na quinta-feira, com alguns atenuantes, mas aprovada.

Marcelo Castañeda é sociólogo e professor da UERJ.

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