Tradutor de neoliberalês para discursos sobre petróleo
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- Paulo Metri
- 04/11/2013
O neoliberalês é falado por disseminadores da teoria neoliberal, a serviço dos donos de capital, que usufruem a difusão de versões equivocadas da realidade. Os que possuem fluência neste idioma divulgam a ilusão neoliberal como teoria benéfica à população e não mostram como ela é produtora de massas excluídas. A verdade é que a dominação através da força bruta, a ignorância das armas, o pelourinho e o pau-de-arara não são mais suportados pela sociedade. Era preciso inovar na maneira de dominar. O bem-vindo conceito de “Direitos Humanos” não incluiu, infelizmente, o ser humano estar protegido da usurpação capitalista, indutora de fome e miséria, como um atentado ao direito humano de viver uma vida digna.
Então, o neoliberalês foi criado exatamente para suportar a exploração de massas ingênuas. Além da linguagem e da teoria, era preciso possuir o veículo transmissor da deturpação dos fatos com capilaridade máxima, de forma a atingir toda a população com as teses prejudiciais a ela própria. Aproveitando uma tendência histórica, a mídia tradicional foi usada pelos concentradores de riqueza para impor os pensamentos danosos à população, usando atitudes humanas baixas, como mentir e omitir. Assim, esta mídia pratica o roubo de interpretações múltiplas e de maior fidelidade à realidade dos fatos.
Ocorreu o leilão de Libra e muitos neoliberais estão escrevendo artigos, dizendo que foi um fracasso, porque não houve competição e, assim, o ágio foi zero. Chegaria a ser engraçado, se não fosse doloroso, o fato de eu, acabrunhado por Dilma não ter determinado a entrega de Libra para a Petrobras sem leilão, seguindo o artigo 12 da lei 12.351, ter que me intrometer nessa discussão. Em respeito aos desavisados da sociedade: apesar de o leilão não ter sido a melhor alternativa, de forma alguma é isto que estão querendo transmitir.
Um deles chegou a dizer que está na Constituição, no capítulo da ordem econômica, o Brasil ser uma economia de mercado, onde há necessidade de existir competição e que o governo Dilma busca o estatismo e desestimula a competição. Para começar, recomendo a ele ler, no capítulo da ordem social, a quantidade de deveres do Estado brasileiro não cumpridos.
Este articulista se prendeu no fato de que não houve competição em torno da percentagem que iria para o Fundo Social, que era a regra deste leilão. Lembro que nunca se pode atestar que uma competição foi verdadeira, pois sempre pode estar havendo acordo entre os competidores, no qual compensações para os escalados perdedores podem ter sido previamente combinadas. Lembrar que o capital, podendo minimizar os riscos de insucesso, fará o que for necessário.
Mas, vamos supor que existiu real competição no leilão de Libra, entre dois consórcios, e o vencedor ganhou com o percentual de 45% para o Fundo Social (o leilão foi ganho com 41,65%). Acontece que um percentual mínimo decente estabelecido pelo CNPE, MME, ANP e Presidência da República teria sido algo em torno de 65%. Nem todo resultado obtido por competição é bom para a sociedade, haja vista o exemplo da Vale, que foi vendida por uma bagatela por competição.
O “estatismo” citado pelo articulista é porque a Petrobras é a operadora única do Pré-sal, ela tem 30% de participação em todos os consórcios e foi criada a empresa Pré-sal Petróleo SA (PPSA). A Petrobras é a operadora única para as compras no país poderem ser maximizadas, uma vez que as empresas estrangeiras possuem blocos no Brasil desde 1999 e nenhuma delas comprou, até hoje, uma única plataforma aqui. A Petrobras tem 30% de participação nos consórcios porque seria impossível ser a operadora única sem esta participação. Finalmente, a PPSA foi criada porque há a necessidade de se ter, em cada consórcio, custos muito bem apropriados. Não esquecer que, quanto maior for a declaração de custos, menor será o valor a ser remetido pelos consórcios para o Fundo Social.
Concordo com estes articulistas, quando dizem que os R$ 15 bilhões de bônus de assinatura podem ter espantado potenciais candidatos. Certamente, o governo contava com estes recursos para fechar suas contas e abriu mão de maiores remessas para o Fundo Social no futuro.
Como se não bastassem os especialistas sistematicamente veiculados pela mídia do capital, que também os remunera, o ministro Lobão disse, em fogo amigo, que não se podia entregar Libra para a Petrobras, sem leilão, porque “não era justo doar um bem público para entes privados, uma vez que 52% dos acionistas da Petrobras são privados”. Aliás, estre raciocínio do ministro é repetido por inúmeras pessoas de bem.
Realmente, 52% das ações da Petrobrás estão nas mãos de entidades e pessoas, que não são o Estado brasileiro. São particulares, fundos de pensão etc., ficando com o Estado só 48%. Assim, ela é uma empresa de economia mista. No entanto, não vejo nenhum inconveniente nisso, por duas razões. A primeira é que ela continua sendo controlada pelo Estado, pois a maioria das ações ordinárias, as únicas que têm direito a voto em assembleias, pertence à União. Aliás, desde a sua fundação, ela tinha permissão para lançar ações em bolsas.
A segunda razão é porque a venda de ações de uma empresa em bolsa pelos controladores da mesma tem o objetivo de arrecadar recursos, em condições mais atrativas do que tomar empréstimos em bancos. O dinheiro obtido com o lançamento de ações em bolsas tende a ser uma captação barata. A empresa só precisa entregar aos acionistas anualmente os dividendos – se tiver lucro. Além disso, estes dividendos não precisam consumir a totalidade do lucro do ano. Pela Lei das SA, os dividendos devem ser, no mínimo, igual a 25% do lucro do ano, que é o único valor que muitas empresas repassam aos acionistas. Provavelmente, o que a Petrobras paga de dividendos, hoje, é menor do que os juros que ela pagaria por um empréstimo de valor igual às captações já ocorridas.
Por outro lado, a riqueza que a Petrobras possui, na qual estão todos seus campos de petróleo, só será dividida na proporção das ações se ela for liquidada. Que eu saiba, ninguém está pensando em liquidar a Petrobras, então, estas riquezas serão produzidas e vendidas aos poucos, formando os lucros.
A venda de ações da Petrobras na Bolsa de Nova York já é outra história e foi, realmente, uma ação errada, por tolher graus de liberdade na administração da empresa.
Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia
Blog do autor: http://www.paulometri.blogspot.com.br/