Correio da Cidadania

Inexorabilidade da geração nuclear

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A meu ver, existe para o grupo de ambientalistas que é, de forma enfática, contra a geração nuclear, a triste notícia que está no título. Falo com relação ao médio e longo prazo, pressupondo que a espécie humana sobreviva. A fusão nuclear seria a grande esperança da espécie, mas os últimos experimentos não vislumbram a sua viabilidade técnica, quanto mais sua atratividade sob o aspecto econômico.

 

As reservas dos combustíveis fósseis são limitadas e, possivelmente, ao final do horizonte de estudo, grande parte das térmicas convencionais estará desativada. Restará a hidráulica, a eólica, a solar e a biomassa. Notar que estas quatro fontes são ou sazonais ou intermitentes. Por isso, qualquer unidade geradora, que as utilize, não é considerada como supridora de energia elétrica firme, o que a usina nuclear faz.

 

Além disso, quanto às duas primeiras, existe uma limitação física para a fonte, análoga à finitude das reservas de combustíveis. Quanto à solar, eu torço para que desenvolvimentos a barateiem, pois ela será a redenção do Nordeste brasileiro. Contudo, a verdade é que, hoje, ela é comparativamente cara e há dúvida se seu preço diminuirá muito no futuro. Aliás, uma previsão garantida é que, devido ao preço da energia crescer acima do crescimento médio do preço das commodities, o uso da energia terá de ser certamente repensado.

 

A produção da biomassa compete diretamente com a produção de alimentos e as áreas destinadas aos parques eólicos e solares não são desprezíveis. Por exemplo, usa-se como capacidade máxima de geração através de eólicas 10 MW (megawatt), em um km². Assim, para um parque eólico ter capacidade equivalente à usina de Itaipu, que gera 14.000 MW, são necessários 1.400 km², quase a área da cidade de São Paulo (1.523 km²).

 

Quanto a outras energias alternativas (geotérmica, energia das marés etc.), se ainda não despontaram é porque não são tão viáveis. Por outro lado, a demanda por eletricidade pode subir muito acima do crescimento da demanda dos demais produtos da economia, se for incentivado o transporte de massa elétrico. Um dos setores campeões na emissão de gases do efeito estufa é exatamente o de transporte. Este fato dará maior importância ao problema da escolha das fontes geradoras para o suprimento nacional.

 

Mesmo com este quadro futuro nada promissor, existe hoje oposição articulada contra a geração nucleoelétrica. Chegou-se ao cúmulo de, em artigo, um autor ligar a denúncia da Operação Lava Jato sobre o recebimento de dinheiro pelo presidente da Eletronuclear com “deixar-se de lado a segurança de Angra 3, que é uma exigência fundamental no uso da tecnologia nuclear”.

 

Não vi, em lugar algum da mídia, a informação que a aparente corrupção estava relacionada à diminuição do nível de segurança da usina. Este autor busca, obviamente, sensibilizar a sociedade contra a energia nuclear, atuando no medo até compreensível que ela provoca, pois foi introduzida para a humanidade com a morte instantânea de 210.000 pessoas em Hiroshima e Nagasaki.

 

Gostaria de alertar aos leitores que todas as fontes geradoras, com possibilidade de expandir a capacidade instalada do país em mais de 3.000 MW por ano e a preço competitivo, trazem algum dano para o meio ambiente no momento da geração e, no caso da nuclear, se ocorrer um acidente. Por exemplo, os gases do efeito estufa são lançados na atmosfera, em quantidade variável, na geração térmica a gás natural, diesel, óleo combustível, carvão mineral e outros combustíveis.

 

Então, na fase de planejamento, quando térmicas forem adicionadas ao sistema elétrico, é preciso juntar o custo da mitigação do dano ambiental acarretado pelo aquecimento global aos custos tradicionais de operação, manutenção etc. É mais justo fazer este procedimento do que se adicionar ao custo da energia nucleoelétrica os gastos com a mitigação dos danos causados por um hipotético acidente nuclear, como é proposto em artigos de posição contrária às nucleares. Afinal de contas, o acidente nuclear é um evento de ocorrência aleatória, enquanto o lançamento de CO, CO2 e demais gases do efeito estufa é um evento de ocorrência garantida.

 

Ouve-se frequentemente que a energia nuclear é insegura, tanto que ocorreram os acidentes de Chernobyl e Fukushima. Chernobyl é consequência de um mundo com grande disputa ideológica, em que os Estados Unidos (EUA) queriam fazer fracassar, a qualquer custo, a economia da União Soviética (URSS). Em meados da década de 1980, os EUA fizeram um acordo com os países árabes para estes inundarem o mercado mundial de petróleo. Assim, o barril chegou a US$13, que era o preço de 1972. Este era o principal produto de exportação soviético, que gerava divisas e lhe permitia importar insumos, bens e serviços do ocidente.

 

Com a queda do preço do barril e a escalada dos gastos militares, a economia da URSS ficou desorganizada, passando a existir escassez de tudo no país, inclusive de energia elétrica. Desta forma, foi determinado à usina de Chernobyl gerar energia mesmo durante a troca de elementos combustíveis, o que era uma imprevidência e foi uma das causas do acidente. A seguir, fez-se fracassar aquela experiência de socialismo e, de passagem, aplicou-se golpe mortal à energia nuclear.

 

No caso de Fukushima, inseguro é o Japão. Para o terremoto e o tsunami ocorridos, a usina de Fukushima se saiu até muito bem. Este país está no ponto de encontro de três placas tectônicas, sendo uma temeridade construir qualquer usina nuclear nele. O Japão não dispõe de energético algum para a geração elétrica que precisa. Por isso, até a nuclear é lembrada.

 

Mas ela só poderia ser usada lá se projetada para resistir a situações de extrema severidade, o que faz a energia gerada ficar cara. Por outro lado, não se levanta o número gigantesco de horas de geração nuclear sem acidente relevante que a França exibe.

 

No setor elétrico, assim como em outros setores econômicos, o que existe realmente é uma intensa batalha comercial. Muitas vezes, inocentes úteis ajudam gratuitamente grupos econômicos a aumentarem suas receitas, por aderirem a determinadas fontes por razões perfunctórias. É difícil encontrar estudos em que os aspectos positivos e negativos de cada fonte sejam mostrados. Estes ajudariam muito a sociedade.

 

Um fato preocupante é que a movimentação de um grupo de ambientalistas é sempre na direção de desacreditar as fontes geradoras que trazem vantagens comparativas para a sociedade brasileira. Além da nuclear, a construção de grandes barragens é alvo de críticas descabidas. Toda a sociedade brasileira se beneficia com a existência de reservatórios plurianuais, aqueles que acumulam chuvas de mais de um ano. Eles podem ser usados para, além de gerar eletricidade em épocas de estiagem e acompanhar a curva diária da demanda, transformar em energias firmes as gerações intermitentes de solar e eólica, garantindo o fornecimento mesmo em momentos sem insolação ou vento e dispensando o acionamento das caras térmicas a combustível.

 

Entretanto, estes reservatórios foram fortemente combatidos por vários grupos: alguns, com razões verdadeiras, outros com interesses escusos. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) é um dos grupos que têm plena razão em reclamar, pois muitos ribeirinhos viram promessas recebidas não serem cumpridas e foram alvo de maus tratos de, principalmente, empreiteiras contratadas pelo setor elétrico.

 

O exemplo do outro grupo é o seguinte. Uma comunidade de menos de 230 índios em Belo Monte, com a ajuda de entidades ambientais com intensões escusas, está forçando a construção de um canal mais extenso que o do Panamá, para suas terras não serem inundadas. Com o perdão dos indigenistas, mas será que não existe outra forma de trazer felicidade para estes duzentos e poucos índios?

 

Também por interferência de grupo ambientalista, a capacidade de geração desta usina foi diminuída, transformando-a em uma usina a fio d’água, praticamente sem reservatório. Neste momento, estou conclamando toda a sociedade brasileira a participar da criação do Movimento dos Atingidos por Falta de Barragens (MAFB), pois, graças ao que ocorreu em Belo Monte, Santo Antônio e Jirau, hidroelétricas que foram construídas sem grandes barragens, nossa energia elétrica estará necessariamente mais cara.

 

A situação brasileira quanto à disponibilidade de fontes geradoras no país é confortável, pois possuímos, em razoáveis quantidades, todas as reservas geradoras de eletricidade. Possuímos aqui instalados, também, todos os grupos estrangeiros, que atuam no setor, querendo, além de lucro no mercado brasileiro, remeter produções de nossos minerais energéticos para o exterior. O que falta é a compreensão por parte da sociedade para respaldar decisões dos governantes que irão resultar em benefícios para ela própria.

 

Em um ponto, concordo com os críticos moderados: a energia nuclear só deve ser adotada se houver uma cultura de segurança no governo sedimentada. A Comissão Nacional de Energia Nuclear ou a agência governamental a ser criada deve continuar sendo rigorosa na avaliação da segurança das usinas nucleares. E o Ministério Público e o Judiciário, como não poderia deixar de ser em um Estado de direito, devem continuar testando todas as eventuais dúvidas da sociedade.

 

 

 

Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.

Blog do autor: http://paulometri.blogspot.com.br/

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