João Teimoso neoliberal
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- Paulo Metri
- 08/02/2013
O brinquedo de criança João Teimoso é um cilindro de plástico cheio de ar, com a figura de um boneco desenhada e uma base bem pesada e arredondada. Ele tem a característica de nunca ficar deitado, por mais que a criança o soque ou chute. Ele balança em todas as direções, mas sempre retorna à posição vertical, não sendo nunca nocauteado.
Os legados da minha geração são a abertura política e a recente inclusão social. Derrubou-se a ditadura militar, contudo, a ditadura midiática se fortificou, no mesmo período. Chega a ser hilário, mas muitas pessoas pensam que, hoje, se está em uma democracia plena. Em outro viés de análise, conseguiu-se substancial melhoria na distribuição de renda na última década, mas, em paralelo, se criou um enorme passivo de riquezas, composto das remessas futuras de lucros e recursos naturais das empresas estrangeiras aqui instaladas. Quem irá pagar esta fatura são as próximas gerações. A troca de benefícios atuais pouco expressivos por razoáveis perdas para as gerações futuras é lastimável. Tento, a seguir, explicar esta afirmação.
Hoje, o neoliberalismo está voltando com força total, depois de quase ter levado o mundo ocidental a uma convulsão em 2008. Desde então, os criminosos se esconderam e os governos, principalmente dos desenvolvidos, os protegeram. Agora, os habitantes dos em desenvolvimento começam a ouvir de novo a cantilena neoliberal. Os devotos desta seita nunca param de insistir, parecendo um João Teimoso. Contudo, para eles retornarem, contam com a alienação do povo, tão bem construída por sua própria mídia.
O devoto presidente Fernando Henrique Cardoso publicou em 3/2/13 em jornalões o artigo “Pessoas e histórias”, onde explicita seu pensamento. Lá, ele diz, textualmente: “Quem ainda pensa em ‘controle coletivo’ dos meios de produção? Só mesmo os nacional-desenvolvimentistas que amam o capitalismo dirigido e identificam o Estado com o coletivo, mas nem por isso são de esquerda”.
Tomo só esta afirmação de FHC, dentre outras tantas contestáveis do artigo, para efeito didático. No parágrafo acima, ele lança a tese que uma estatal, por exemplo, não seria do coletivo. Se não existir controle social sobre a estatal, ele está certo, pois ela poderá ser dominada por grupos de interesse, quer sejam econômicos ou corporativos. No entanto, ele não sugere este controle social sobre as estatais e, como sabemos, propõe a privatização delas. Mas, se forem privatizadas sem a existência de verdadeiras agências reguladoras, que visem proteger a sociedade, estará sendo implantado um sistema que também não atende ao coletivo. Então, um problema importante é não existir controle social sobre as atividades econômicas.
Estranhamente, FHC se cala sobre o cooptação das agências por grupos econômicos. Note-se que a cultura da usurpação de bem público pelo setor privado é tão arraigada na nossa sociedade que, certamente, as agências reguladoras não permanecem imunes a estes predadores sociais. A providência realmente eficiente, que é conscientizar a população para exigir que estatais e agências sejam suas, é sempre esquecida.
Além disso, é óbvia a importância de estatais em setores estratégicos de países de desenvolvimento tardio. Finalizando as referências a FHC, divirjo quando ele acha que o "capitalismo dirigido" é ruim. Implícito está que o certo, para ele, seria o "laissez-faire", que fez o ocidente entrar na crise de 1929 e repetido nos anos que antecederam 2008.
Neste momento, o João Teimoso neoliberal está se levantando com ataques maciços à Petrobras. Declara na mídia, controlada por ele: “o lucro da Petrobras foi corroído por uso político da estatal”, “o valor de mercado da empresa está baixo hoje”, “a empresa não terá capacidade para bancar os 30% de cada consórcio do Pré-sal”, “erradamente, ela não investiu em refinarias”, “a ineficiência da gestão da era Lula está se refletindo agora, pois a produção foi 2% menor que a do ano passado” etc. Haja paciência para retrucar tanta imprecisão e deturpação lançada por metralhadora giratória. Entretanto, em respeito àqueles que a falta de escrúpulos da mídia do capital poderá iludir, terei paciência. Tento explicar, a seguir, o que se passa na verdade.
As empresas estrangeiras tiveram um duro revés depois que o Pré-sal foi descoberto, pois 41 blocos desta área foram excluídos da nona rodada, um novo marco regulatório foi elaborado, retirando boa parte do superlucro petrolífero delas e direcionando-o para a sociedade, entre outros reveses. Agora, elas estão indo a forra, tal qual um João Teimoso. Colocaram seus testas-de-ferro em diversos órgãos, a ponto de existirem alguns que, mesmo fazendo parte do governo brasileiro, atuam contra nossa sociedade. Divulgam nas televisões, rádios e jornais que leilões trazem dinheiro (bônus) para a sociedade, o que é verdade, pois traz algum dinheiro, mas, infinitamente inferior ao que será levado no futuro para o exterior, sem deixar grande usufruto para os nativos. Divulgam que rodadas de leilões correspondem a uma melhoria, o que não é verdade, pois mais corresponde a uma involução. Elas nos obrigam a produzir petróleo muito acima do que precisamos, com valor monetário e estratégico imenso, que só é usufruído pelos donos do campo petrolífero, quando a lei 9.478/97 é usada, e a sociedade ganha uma parcela muito pequena, que são os royalties.
Depois de tanta pressão, a presidente Dilma liberou duas rodadas de leilões de blocos, neste ano, que, no fundo, valem por três rodadas porque a 11ª rodada terá os blocos inicialmente previstos para ela e os da não realizada oitava rodada. Não sei o que a presidente Dilma ouviu, mas foi uma péssima decisão, porque, primeiramente, a Petrobras já tem o petróleo necessário para os próximos 40 anos de abastecimento do país e, em segundo lugar, a Petrobras não irá ganhar muitos blocos e eles serão entregues para empresas estrangeiras, aumentando o passivo de riquezas, que as futuras gerações de brasileiros terão de honrar. Cada concessão assinada sob a égide da lei 9.478, como serão todas as concessões desta 11ª rodada, é leonina em que o leão é o concessionário e a sociedade é quem fica na frente do leão. Em outras palavras, não há razão alguma que justifique ter pressa em fazer leilões.
Vi recentemente um documentário antigo sobre a vida e a obra de Leonel Brizola em um destes bons canais atípicos (TVE, TV Senado, TV Câmara etc.). No programa, a presidente Dilma, em época em que ainda não era presidente, enalteceu as qualidades do político e líder Brizola. Foi então que senti o grande apreço que ela nutre pelo líder. Portanto, peço permissão à presidente para sugerir que ouça um último conselho do grande brasileiro Brizola, que tinha o nacionalismo como uma das suas mais firmes características. No seu discurso na última homenagem que Brizola recebeu da Assembleia gaúcha, pouco antes de morrer, ele diz claramente: “Sou contra as rodadas de leilões de entrega do petróleo nacional”.
A estratégia das empresas estrangeiras foi, primeiramente, concentrar muitos leilões de blocos em um período curto de tempo (2013), para a Petrobras, estando financeiramente asfixiada, não poder participar de todos os leilões. Para os blocos bem promissores e sem a presença da Petrobras como concorrente, as empresas irão combinar quem sairá vencedora e com qual bônus ofertado. E não será possível o governo brasileiro descobrir em que blocos não houve concorrência, mesmo com todo empenho possível. O total de bônus, que já era pouco atrativo, será menor ainda.
No caso tão divulgado pela imprensa da Petrobras segurar os aumentos necessários da gasolina e do diesel para satisfazer a interesses do governo, primeiramente, este assunto veio a calhar porque asfixiou ainda mais a empresa. Depois, fica a pergunta: por que a Petrobras não aproveitou a situação para importar somente a gasolina e o diesel que sua distribuidora iria precisar? Pelo desmonte que foi feito com o término do monopólio e a introdução da lei 9.478, a Petrobras passou a não ser mais responsável pelo abastecimento do país. Também deixou de ter o monopólio sobre a importação de derivados. Então, por que a Petrobras teve que importar derivados e os entregar às distribuidoras privadas, a maioria delas estrangeira, por preço abaixo do que foi comprado no exterior? Seria para ajudá-las a terem boa rentabilidade?
Quanto ao preço de mercado da empresa, entra muito, nesta avaliação, a especulação, sobre o que não opino. Não se está falando sobre o preço da empresa baseado em seus ativos, sua capacidade de gerar lucros, sua capacidade tecnológica etc. Muito mais poderia ser dito, mas certamente estarei deixando o texto mais longo.
Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia.
Blog do autor: www.paulometri.blogspot.com.br