À caça de uma bandeira
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- Paulo Metri
- 20/12/2013
Em palestra para empresários e investidores americanos, o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, declarou que: “O Brasil trabalha para se transformar numa economia ágil, com qualidade nos serviços públicos e privados”. E continuou dizendo: “Esse é o passo que vamos dar nos próximos anos, depois de consolidarmos a democracia, estabilizarmos a economia e promovermos a inclusão social. O próximo consenso social é o da competitividade”.
Concordo em parte com ele, pois a sociedade brasileira conseguiu forçar a ditadura a aceitar eleições diretas para todos os níveis, que o Congresso elaborasse uma Constituição com mais garantias políticas e sociais, a moeda fosse estabilizada e ocorresse a inclusão social. Divirjo dele com relação ao desejo da sociedade brasileira para o futuro ser o aumento da competitividade. Sem querer negar a importância de se ser competitivo, mas, nesta afirmação, o ministro está mais revelando o seu próprio desejo que o do povo.
Contudo, ele trouxe uma sugestão de bandeira para o povo empunhar. Creio que a escolha de bandeiras pelo povo passa pelos cidadãos fazerem avaliações do que seria prioritário dentre as propostas dos candidatos a cargos eletivos. Infelizmente, a mídia do capital procura influenciar a escolha das propostas prioritárias. Por exemplo, hoje, ela se esforça para que, na próxima eleição presidencial, o combate à corrupção seja o objetivo principal e único.
Obviamente, o objetivo da mídia corrompida é derrotar o PT nesta eleição e, por isso, tem se esforçado para que este partido, como um todo, seja identificado como corrupto. O tema já foi exaustivamente tratado na mídia independente e, por isso, me restrinjo a dizer que os comprovadamente envolvidos em falcatruas devem ser punidos dentro da lei, não importando em que partidos estejam. Como sempre, há uma luta renhida pelo poder e a trama de comunicação desta mídia atesta que as administrações do PT incomodaram os detentores de capital pela inclusão social realizada. Poder-se-ia até dizer que, neste embate, há a velha luta de classes.
Os presidenciáveis trazem bandeiras as mais diversas, como o “choque de gestão”, que parece não ter sido aceito pela população. Mas ainda está em uma fase inicial de indefinições. Salvo engano, o PT irá continuar a bater na tecla da “inclusão social”, pois realmente falta muito a ser feito nesta área. Mas não sei se o povo se contenta só com ela ou quer algo mais.
Minha proposta de bandeira é a da “soberania”, que reconheço ser difícil de comunicar. Para a população, a luta pela soberania pode significar o retorno dos militares ao poder, uma vez que eles usavam muito este termo. Ou a proibição da criação de áreas indígenas que se transformarão em novas nações, a serem desmembradas do nosso território. Ainda, para o povo, a soberania pode ser entendida também como termos o controle das nossas fronteiras, pelas quais não passariam contrabando, drogas e armas.
Estas associações são corretas, mas soberania é algo bem superior. O que mais a caracterizaria seriam as ações dos representantes do Estado visarem exclusivamente a proteção e o bem-estar da população do país. Por outro lado, a soberania de uma nação só pode existir por exigência dos nacionais querendo se proteger de exploração estrangeira. Contudo, existem políticos que chegam ao poder ludibriando o povo e cuidam somente dos interesses do capital internacional. Não sentem constrangimento algum por estarem drenando recursos da sociedade, que poderiam alimentar programas sociais. São agressores da nossa soberania.
Há sempre o argumento que o capital internacional complementa as necessidades de investimento do país, quando os recursos nacionais são escassos. Isto pode ser verdade, porém, os incentivos e os privilégios só podem ser destinados aos nacionais. Divirjo do mantra que é ouvido irresponsavelmente em vários órgãos do governo de que basta uma empresa estar pagando salários e impostos para ela ser bem vinda ao país. Uma empresa genuinamente nacional pagaria os mesmos salários e impostos e, adicionalmente, tenderia a comprar bens e serviços necessários ao negócio no país, a contratar aqui desenvolvimentos tecnológicos e a não remeter o lucro para o exterior. Isto traz uma diferença imensa para o desenvolvimento nacional. O artigo 171 da Constituição, que foi revogado nos sombrios anos 90, tratava da proteção à empresa nacional genuína. Em outras palavras, estamos recriminando o modelo de desenvolvimento dependente.
Não são esperadas ações soberanas dos atuais partidos de direita, pois eles são os representantes dos interesses estrangeiros. Dirigindo a análise para os de esquerda, infelizmente o de maior aceitação eleitoral, o PT, não tem entendido que se busca ser soberano para nossa sociedade poder usufruir um futuro melhor. Talvez por ter nascido no ABC paulista, onde há grande concentração de subsidiárias de empresas estrangeiras, a maioria dos integrantes deste partido não acredita nos benefícios de ações soberanas. Este partido, que fez uma expressiva inclusão social, continuaria na vanguarda da inclusão, um nível acima, se absorvesse esta bandeira.
Assim, a face de direita do PT ocorre exatamente quando toma medidas não soberanas. Por exemplo, a presidente Dilma promoveu as três rodadas de leilões de áreas de petróleo, mostradas a seguir, no presente ano, tendo derrotado seus antecessores, que só conseguiram duas em um ano.
A 11a rodada ocorreu em maio de 2013, regida pela lei das concessões, que entrega a totalidade do petróleo descoberto a quem o descobre. Nela, 142 áreas foram arrematadas, inclusive as da margem equatorial, que deve conter, segundo a diretora-geral da ANP, 7,5 bilhões de barris e se transformará em uma nova província petrolífera brasileira. Em uma primeira estimativa, estimo que US$ 4 bilhões por ano, durante 35 anos, serão perdidos pela sociedade brasileira, que poderia utilizá-los em programas de saúde, educação, saneamento, moradia, transporte etc. Agora, a quase totalidade dos US$ 4 bilhões por ano será remetida para o exterior pelas empresas estrangeiras proprietárias. Para beneficiar a sociedade, seria necessário que a margem equatorial fosse declarada como área estratégica e, assim, fosse utilizado o artigo 12 da lei 12.351, transferindo a área para a Petrobras sem leilão. Esta empresa assinaria um contrato de partilha com a União, comprometendo-se a entregar 60% do rendimento líquido para o Fundo Social.
No leilão do campo de Libra, em outubro de 2013, foram entregues 10 ou mais bilhões de barris para um consórcio com 60% de participação de empresas estrangeiras. O prejuízo é deprimentemente maior, US$ 17 bilhões por ano. Com relação a este campo, a Petrobras poderia tê-lo recebido também por ser estratégico, sem leilão, utilizando o mesmo artigo 12 da lei 12.351. Novamente, o Fundo Social poderia receber, no mínimo, 60% do rendimento líquido.
Na 12a rodada de novembro de 2013, áreas foram entregues para exploração de gás de xisto, tendo ocorrido a repulsa unânime das entidades ambientalistas, que pediram à presidente somente uma moratória, enquanto não se conhece a extensão dos danos ao meio ambiente causados pela tecnologia do fracking para produção do gás de xisto. Nesta rodada, o prejuízo não será só financeiro, mas também ambiental em regiões onde há aquíferos, que poderão ser contaminados.
Cabe alertar que o argumento de que a Petrobras não pode sozinha arcar com tantos investimentos não é verdadeiro. Em primeiro lugar, a ANP, sem dar nenhuma explicação para a sociedade, determinou essa enxurrada de leilões. Eles não eram necessários para o atendimento da demanda nacional, já que esta está garantida, no mínimo, até 2040 pela Petrobras. Também, de posse de contratos de concessão ou partilha com a União de campos de petróleo, ela conseguiria facilmente empréstimos internacionais.
Soberania pode não eleger o próximo candidato a presidente, mas faria um bem imenso para o povo. Entretanto, interesses externos sobre nossas riquezas corrompem nossos candidatos antes da eleição. Seria maravilhoso, para usufruto do brasileiro, se surgisse um verdadeiro estadista, que abraçasse esta causa e explicasse para a população o significado de soberania. E ganhasse a eleição.
Paulo Metri é conselheiro do Clube de Engenharia e colunista do Correio da Cidadania.