Correio da Cidadania

A (necessária) virada da Virada Cultural em São Paulo

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Desde 2005, já foram realizadas dez edições da “Virada Cultural” em São Paulo, oferecendo 24 horas ininterruptas de programação cultural, com espetáculos de música, dança, teatro, exposições, concertos, exibição de filmes, entre outras atrações, gratuitas, para todos os paulistanos.

 

A Virada Cultural cumpriu um papel importante no atual movimento de apropriação da cidade por seus moradores. Ocupando as praças e ruas do centro, ajudou a reestabelecer um elo – simbólico e real – dos cidadãos com o espaço público e, mais particularmente, com o velho e belo centro da cidade. Sendo festa aberta e pública, a Virada contribuiu ainda para construir um ethos de cidade também como espaço de encontro e festa, historicamente esmagado pela São Paulo máquina de produção que não pode parar.

 

Entretanto, cabe a pergunta: dez anos depois, e em tempos difíceis de contenção de gastos e cortes nos orçamentos – a Virada Cultural significa um investimento altíssimo, de cerca de R$ 14 milhões –, será que não está na hora de rever esse modelo?

 

Hoje me parece muito mais necessário apoiar a imensa quantidade de artistas e coletivos culturais em seus movimentos de ocupação dos espaços públicos com cultura, arte e lazer, além de fortalecer e abrir para estes a enorme rede de equipamentos culturais existentes em toda a cidade – muitos dos quais em precárias condições –, do que promover shows de artistas famosos nas ruas do centro.

 

É possível fazer uma Virada mais autônoma e bem mais barata! Um bom exemplo disso é a Fête de la Musique, realizada pela primeira vez em 1982, em Paris, e que hoje acontece anualmente em diversas cidades não apenas na França, mas também em muitos outros países, sempre na mesma data, 21 de junho, primeiro dia do verão europeu.

 

A organização – a cargo do Ministério da Cultura e das prefeituras, no caso da França – incentiva a participação de músicos amadores e profissionais, organizações e coletivos. Para participar, o artista ou o coletivo deve elaborar um projeto, de acordo com os princípios da festa, e inscrevê-lo por meio de um site.

 

Entre os princípios estão o fim não lucrativo do evento – todas as apresentações devem ser gratuitas –, a diversidade de práticas musicais e a realização de apresentações ao vivo, a participação de artistas amadores e profissionais, o estabelecimento de um pagamento máximo de cachê (que era de 610 euros em 2013) e a proibição de patrocinadores individuais.

 

As apresentações podem ser realizadas em bares, cafés e restaurantes, mas também em espaços públicos como parques, praças e ruas peatonais. Hospitais, presídios, escolas, museus e outros tipos de estabelecimento também são palco para o evento. Uma vez selecionados os projetos, a organização disponibiliza a programação e a divulga nos meios de comunicação.

 

Este é apenas um exemplo de novas possibilidades. O fato é que está na hora de a Virada, em sintonia com as mudanças vividas nas cidades nos últimos dez anos, dar uma virada e se reinventar.

 

Ralquel Rolnik é arquiteta, professora da FAU/USP. Publicado originalmente no Yahoo!Blogs.

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