Correio da Cidadania

Colômbia reconhece Territórios Indígenas como equivalentes a municípios

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Na semana passada, o governo do presidente de Juan Manuel Santos, da Colômbia, publicou decisão histórica que reconhece as autoridades indígenas como governos locais em três departamentos (Estados) da Amazônia colombiana: Guania, Vaupes e Amazonas. Nas terras indígenas, essas autoridades terão posição equivalente ao de prefeituras, com status de divisão político administrativa.

O Decreto Presidencial n°632 de 2018 (acesse aqui) estabelece os procedimentos para a instalação e funcionamento dos chamados “Territórios Indígenas”, divisões político-administrativas do Estado colombiano. Esses TIs estão previstos na Constituição Política do país desde 1991, mas nunca saíram do papel. A Colômbia, diferentemente do Brasil, estrutura-se como Estado unitário composto pela Nação, Departamentos (Estados), Municípios e Territórios Indígenas. Estes últimos, instâncias de descentralização administrativa e com políticas inéditas na história da Colômbia, careciam de regras para sua implementação até a última semana.

Na Colômbia, as Terras Indígenas (Resguardos), já eram reconhecidas como propriedade coletiva dos povos indígenas (inalienável, impenhorável e imprescritível) desde antes da Constituição de 1991. Mesmo com a mudança constitucional, porém, continuavam administrativamente dependentes dos governos departamentais (estaduais) para a definição e execução de políticas públicas e do acesso a serviços públicos essenciais como educação, saúde e saneamento básico.
 

Maloca em Puerto Ortega, Pirá-paraná, na Colômbia|Aloisio Cabalzar-ISA


Constituição de 1991

A partir da Assembleia Constituinte de 1991, o Estado colombiano avançou na conquista de direitos historicamente reivindicados pelo movimento indígena. Isso incluiu desde a manutenção da propriedade coletiva das Terras Indígenas até o reconhecimento da governança indígena sobre suas terras na categoria de autoridades públicas de nível local. Situação totalmente diferente é a do Brasil, onde os povos indígenas sequer são proprietários de suas terras.

Os Territórios Indígenas foram idealizados como espaços de governo local que não devem ser obrigados a reproduzir a estrutura organizacional dos municípios (Prefeitura, Câmara de Vereadores, entre outros) e, portanto, têm o desafio de inovar na definição de estruturas administrativas eficientes e culturalmente adequadas a cada povo, ou a cada conjunto de povos que se proponham governar conjuntamente numa mesma unidade territorial.

Avanço na conquista de direitos

O ato presidencial recentemente publicado, que promove o funcionamento dos Territórios Indígenas como divisões administrativas e políticas da Colômbia, é produto de mais de 27 anos de luta do movimento indígena. Seu avanço concreto acontece no contexto de pós-conflito armado, em que o Estado colombiano precisa se fazer presente em extensas regiões do país onde instituições governamentais tiveram pouca ou nenhuma atuação durante os últimos 60 anos.

No caso concreto da região da Amazônia colombiana, a possibilidade de criar Territórios Indígenas é, sem sombra de dúvidas, o reconhecimento formal da governança indígena que de fato vinham exercendo as Associações de Autoridades Territoriais Indígenas, as ATTIs, sobre extensos resguardos nos Departamentos do Vaupés, Guania e Amazonas. As ATTIs demonstraram ser, durante os últimos 15 anos, as estruturas de governo mais eficientes para definir e implementar políticas públicas nesses territórios. A expectativa é que, com base nesta experiência pretérita de governo indígena, sejam criados os primeiros Territórios Indígenas no país.


 Dança da Pupunha, com máscaras. Realizada pelos Makuna de Piedra Ñi, rio Pirá-Paraná, Colômbia (2008)|Aloisio Cabalzar-ISA

 
O Decreto publicado pelo governo colombiano não cria automaticamente nenhum Território Indígena, ele apenas prevê as regras para sua formação, sempre a partir da iniciativa exclusiva dos povos interessados. Assim, o funcionamento dos primeiros Territórios Indígenas fundamenta-se na criação de: Conselhos Indígenas, instâncias de governo e representação legal dos TIs; Acordos Interculturais, instrumentos de coordenação entre os TIs e os demais níveis de governo regional e nacional, e por último, os Planos de Vida, instrumentos de ordenamento territorial e planejamento administrativo.

O novo decreto, ao dispor sobre o funcionamento dos Territórios Indígenas, permite não só a garantia da propriedade coletiva das Terras Indígenas, mas o exercício de direitos políticos do autogoverno. Passaram mais de 27 anos desde a mudança constitucional até o início de sua implementação. Seu funcionamento reúne os principais desafios da distribuição de poder local na região da Amazônia colombiana onde, desde a assinatura dos acordos de paz, as taxas de desmatamento só têm aumentado, assim como o avanço da fronteira agrícola e mineral. O contexto atual é desafiador, mas nunca foi melhor.


Por Biviany Rojas Garzón, advogada do Programa Xingu
Fonte: Instituto Socioambiental.

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