Correio da Cidadania

Grileiros ameaçam comunidades de Casa Nova (BA)

0
0
0
s2sdefault

 

O caso Areia Grande / Casa Nova (BA)

 

Grileiros ameaçam comunidades tradicionais de agricultores no semi-árido da Bahia - e seu modo de exploração sustentável da caatinga - com envolvimento indevido de dinheiro público.

 

Mais de 1.800 pessoas vivendo bem no sertão...

 

Trezentas e trinta e seis famílias, de quatro comunidades do município baiano de Casa Nova, vivem numa área de uso coletivo chamado de Areia Grande, de mata nativa que conta com mais de 13 mil cabeças de cabras e ovelhas, produzem por ano 30 toneladas de mel, e, no período chuvoso, plantam mandioca e outros gêneros alimentícios para seu sustento e comercialização. Um caso exemplar de uso sustentável da caatinga à beira do lago formado pela represa de Sobradinho.

 

A grilagem como história que se repete

 

Mas estes agricultores familiares estão sendo novamente alvo da ação truculenta e violenta de grileiros, com ramificações até o estado de Espírito Santo e a conivência de um juiz local, que recentemente emitiu sentença que obrigaria os camponeses a deixarem as suas terras. Terras que eles e seus antepassados habitam há mais de 120 anos, distribuídos pelas comunidades Melancia, Jurema, Salina da Brinca e Riacho Grande.

 

O conflito estourou no dia 6 de março de 2008, quando às 5 horas da manhã efetivos da Polícia Militar, agentes da Polícia Civil e da Polícia da Caatinga, sob supervisão de um oficial de justiça, entraram na área tentando expulsar, de modo brutal, as famílias. Destruíram casas, inúmeros chiqueiros e currais, roçados, milhares de metros de cercados e exigiram a imediata retirada de cerca de 3.000 caixas de colméias de abelhas instaladas no local há mais de cinco anos pelos apicultores das comunidades. A ação da polícia, naquele dia, transcorreu de maneira truculenta, intransigente, com abuso de autoridade. Documentos e chaves de carros foram sumariamente confiscados; cidadãos submetidos à espécie de custódia ilegal (cárcere privado), postos "de castigo" em viaturas das 7 horas da manhã até 6 da tarde.

 

As comunidades resistem

 

Diante desta situação, as comunidades se mobilizaram para a legítima retomada das terras de uso comum, valendo-se do desforço incontinenti. Respaldadas por audiência acontecida em Salvador, com presença das várias autoridades implicadas e do Ouvidor Agrário Nacional, Gercino Silva, cerca de 300 pessoas das comunidades acampam na entrada da área, impedem a construção de guaritas e forçam a retirada de tratores e homens armados. A preocupação é impedir maiores danos, pressionar pela justiça e por seus direitos como posseiros, e da área como "fundo de pasto". Após tentarem impedir a continuidade da destruição de suas benfeitorias, no final da tarde um grupo com nove capangas encapuzados e fortemente armados, com pistolas e armas de alto calibre, invadiram o acampamento onde estavam resistindo os posseiros, disparando tiros em direção aos mesmos. Fizeram ameaças verbais de morte, agrediram mulheres e crianças fisicamente, espancando-as e queimando-as com tições de fogo. Uma mulher grávida de sete meses perdeu seu filho em decorrência das agressões.

 

Produção parada na iminência de nova invasão

 

Atualmente, as comunidades vivem na iminência de uma nova ação da Polícia Militar e dos capangas contratados pelos "compradores" da terra. "Somos obrigados a mantermo-nos acampados na estrada de acesso à área para impedir uma nova invasão e destruição. Não podemos cuidar dos nossos animais, e a destruição de cercas e chiqueiros nos fez perder metade da criação", revolta-se Valério da Rocha, um dos líderes das comunidades e presidente da Associação de Fundo de Pasto dos Pequenos Produtores do Sítio da Melancia, uma das comunidades atingidas.

 

Laudo técnico identifica prejuízos de R$ 1,79 milhão

 

Um laudo técnico elaborado em junho de 2008 pelos agrônomos Arildo Silva e Silver Farfán constatou que as perdas totais em decorrência da ação da polícia e dos grileiros para as comunidades é de R$ 1.792.99,50, principalmente referente ao sistema de produção de caprinos, ovinos, bovinos, suínos e abelhas africanizadas.

 

Os antecedentes: A "compra" de dívidas legitimando a grilagem e o "escândalo da mandioca" dos anos 1970 e 1980

 

Estas terras foram apropriadas indevidamente nos anos 80 pela desmantelada Camaragibe Agroindustrial S.A., envolvida no rumoroso "escândalo da mandioca", um caso de desvio de dinheiro público ocorrido na virada dos 70 para os anos 80, quando andava em voga o Projeto do Álcool - Pro-álcool. O esquema fraudulento para financiamento de plantio de mandioca e instalação de usinas de álcool consistia, basicamente, na adulteração de documentos que forjavam perdas de safras no momento em que empresários do setor ruralista iam quitar os fartos empréstimos junto a União, através do Banco do Brasil.

 

A dívida da Camaragibe com o Banco do Brasil, algo em torno de 40 milhões de reais atualmente, foi "comprada" por 639 mil reais, numa agência do BB em Nova Iguaçu/RJ, pelos empresários Alberto e Carlos Nizam. Com poderes assim adquiridos de negociação, eles quitam a dívida milionária dos herdeiros por R$ 700 mil e são pagos com os imóveis contíguos supostamente pertencentes à Agroindustrial – as Fazendas Lages, Baixa do Umbuzeiro, Urecê e Casa Nova, exatamente onde estão localizados os "fundos de pasto" da Areia Grande.

 

Audiências não quebram o impasse

 

Numa audiência pública realizada com o Ouvidor Agrário Nacional Adjunto, João Pinheiro de Souza, no último dia 30 de outubro, em Salvador, os representantes das comunidades Melancia, Jurema, Salina da Brinca e Riacho Grande voltaram a denunciar os abusos a que estão submetidos por ação de grileiros e com a conivência do juiz local, que emitiu uma sentença de imissão de posse contra as comunidades, ameaçando a sua existência centenária numa área totalmente preservada de caatinga. 

 

Contatos para mais informações:

 

Assessoria de Comunicação da CPT-BA: (75) 9955.4687

 

E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

Assessoria de Comunidades Tradicionais da CPT-BA: (71) 3328.4672

 

Fonte: CPT (Comissão Pastoral da Terra).

0
0
0
s2sdefault