Movimentos cobram programa anticapitalista para sair da crise
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- Vinicius Mansur, Radioagência NP
- 30/01/2009
Belém - Os presidentes Hugo Chávez, Fernando Lugo, Evo Morales e Rafael Correa (de Venezuela, Paraguai, Bolívia e Equador, respectivamente) tiveram um encontro com os movimentos sociais na tarde desta quinta-feira (29). Cerca de 1,5 mil pessoas ouviram as lideranças governamentais e populares que apresentam a Alternativa Bolivariana das Américas (Alba) como uma das saídas para a crise econômica mundial.
Após as falas das lideranças sociais e dos presidentes, o integrante da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, encerrou o ato cobrando medidas concretas para responder a crise econômica e para pôr em ação unitária as forças populares e os governos progressistas.
"É o momento da unidade popular. Já não podemos perder tempo entre nós, que um é amarelo, o outro é vermelho. Aqui se resolve unificando as forças populares com os governos progressistas para poder ter mais força para enfrentar a crise do capital. Então, o que necessitamos é construir um programa mínimo para passar do neoliberalismo para medidas anticapitalistas."
Entre as medidas que devem constar neste programa, Stédile apontou a recuperação da soberania dos povos sobre seus recursos naturais, como o petróleo e a energia, e a criação de uma moeda regional, capaz de reduzir a importância do dólar na região. Stédile ainda apontou a necessidade de se democratizar os meios de comunicação e que "não devemos ter medo de começar a falar na nacionalização dos bancos".
A Alba é um modelo de integração dos países da América Latina, idealizado por Chávez em 2001 para se contrapor à proposta dos Estados Unidos de instituir a ALCA (Acordo de Livre Comércio para as Américas).
Amazônia não é vazio a ser ocupado, observam participantes
Por Maurício Hashizume, Repórter Brasil
Belém – Representantes de comunidades, de organizações da sociedade civil e pesquisadores reunidos no Fórum Social Pan-Amazônico 2009, dia especial dentro do Fórum Social Mundial dedicado aos temas da Amazônia, repudiaram, nesta quarta-feira (28), o entendimento da região como "fronteira" a ser ocupada. Diversos atores sociais presentes no encontro defenderam, em várias mesas e debates, a valorização da região como ela é - com suas riquezas naturais, seus povos tradicionais e suas culturas -, e não como um "vazio" a ser ocupado por empreendimentos vindos de fora da Amazônia.
"O principal problema hoje são as hidrelétricas. Essas obras prejudicam a vida dos povos indígenas", afirmam, em uníssono, indígenas Krahô e Arara, um dos 16 diversos povos afetados pela construção da Usina Hidrelétrica (UHE) de Belo Monte, uma das grandes obras de infra-estrutura que fazem parte dos planos governamentais mais criticadas no Fórum Social Mundial. Além dos deles, outros 13 povos - Kaiapó, Mundurucu, Assurini, Araweté, Panará, Kararó, Mbengokre, Kokramouro, Juruna, Xipaia, Kuruaya, Apinajé, Paracanã e Xikrim - reunidos em 14 aldeias, sofrerão impactos da construção da obra no Rio Xingu.
Aldalice Moura, da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong), ressalta que os povos originários marcam forte presença no Fórum porque são os que mais sofrem com essas grandes intervenções vindas de fora no ambiente amazônico, moldadas na lógica do desenvolvimento econômico, mas não no humano.
Nesse sentido, os povos de nove países da chamada Pan-Amazônia que vêm resistindo à pressão "externa", servem, segundo ela, de inspiração qualitativa não só ao Fórum como ao mundo, com seus conhecimentos e seus modos de vida sintonizados e equilibrados com a natureza.
Liderança quilombola do Pará, Daniel Souza lembra que os descendentes de escravos que fugiram para a floresta mantêm, assim como os indígenas, uma relação menos degradante com o meio ambiente. "Em toda a campanha para a preservação da Amazônia, nós estamos lá. É só conferir no mapa: em praticamente todas as grandes áreas preservadas da floresta, há índios e quilombolas", declara. "Mas como sempre e também neste caso, a população negra é esquecida",
Segundo ele, existem pelo menos 320 núcleos quilombolas só no Pará (94 deles já reconhecidos pelo Estado), quarto estado em número de comunidades. Elas estão espalhadas pela região tocantina (sudeste paraense), em Guajará (Moju e Abaetetuba) e Ananindeua, mas o maior território (400 mil hectares) já titulado fica em Oriximiná, na região oeste. "Nós, quilombolas da Amazônia, ainda somos ‘peixe pequeno’. Há 13 anos conseguimos o primeiro título". Indígenas de outros países que fazem parte da Amazônia também estão preocupados com o futuro da floresta.
Originário do Peru, Miguel Palacin, representante da Coordenação Andina de Organizações Indígenas (CAOI), relata que os movimentos indígenas dos países andinos estão propondo uma mobilização mundial para salvar a "Pacha Mama" (Mãe Natureza), que inclui obviamente a Amazônia, em 12 de outubro deste ano (marco da colonização, data da chegada da primeira expedição europeia ao continente americano). A água é um recurso sagrado. Não queremos que destruam nossa identidade, nossa vida".
"No lado do Oceano Pacífico da América do Sul, os movimentos indígenas andinos e amazônicos já uniram suas lutas. Queremos agora nos unir também com os indígenas do lado do Atlântico." Essas entidades compartilham uma visão de que a Amazônia é um espaço "esvaziado", onde é possível aplicar alternativas "inovadoras" de conservação.
A referência socioambiental que deu origem a muitas ONGs nos últimos anos, segundo ele, não basta. Práticas com base no entendimento da região como "laboratório" não deixam de ser violentas e usurpadoras. Para ela, é preciso que as próprias comunidades se unam e ajam coletivamente para buscar formas de garantir conquistas, de acordo com os seus valores e suas necessidades, frente às ameaças que vêm de fora da Amazônia.