Duas sentenças-chave contra ilegalidades e arbitrariedades da era Bush
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- Andrea
- 28/04/2009
Enquanto continua nos Estados Unidos o debate sobre a responsabilidade das torturas aplicadas a suspeitos de terrorismo, o Poder Judiciário deste país prossegue exercendo sua independência da Casa Branca e do Congresso. Um tribunal federal rejeitou os esforços da administração de Barack Obama para atrasar uma audiência de um prisioneiro da base militar de Guantânamo, em Cuba, que questiona as razões de sua detenção. Outra corte federal ordenou a desclassificação de um "substancial número" de fotos mostrando abusos de presos por parte de pessoal militar norte-americano no Afeganistão e no Iraque.
No caso de Guantânamo, um juiz federal rejeitou o pedido do Departamento de Justiça para negar ou adiar um recurso de hábeas corpus apresentado por Mohammed Jawad, sob custódia norte-americana desde que era adolescente. Em fevereiro, o governo apresentou uma moção, continuando com os esforços da administração anterior, de George W. Bush, para adiar o processo até que uma comissão militar completasse o caso contra ele, mesmo após Obama ter ordenado a suspensão de todos os procedimentos das comissões militares.
"A sentença é uma vitória do direito de impugnar detenções indefinidas", afirmou Jonathan Hafez, do projeto de Segurança Nacional da União para as Liberdades Civis Norte-americanas (Aclu) e conselheiro no hábeas corpus de Jawad. "O caso de Mohammad Jawad representa a completa injustiça e o fracasso de Guantânamo. O detido foi mantido preso ilegalmente durante mais de seis anos com base na evidência que o juiz de uma comissão militar concluiu ser produto de torturas. Apesar disso, o governo persiste em mantê-lo na prisão", disse Hafetz. "Tentamos impugnar vigorosamente a detenção em um tribunal federal à luz da última sentença do juiz de que este caso deve correr sem demora", afirmou.
Hafetz acrescentou que a ordem do tribunal "enfatiza a importância de uma revisão judicial independente para os presos detidos há anos sem acusação formal. Uma imediata audiência de hábeas corpus é necessária especialmente porque a saúde mental e física do senhor Jawad continuam sofrendo com as duras condições em que está detido em Guantânamo". Essa "ordem reconhece seu direito de apresentar-se perante um tribunal", acrescentou. A Suprema Corte decidiu no ano passado que os presos em Guantânamo têm direito a impugnar suas detenções em tribunais civis dos Estados Unidos.
A decisão foi um dos vários reveses do governo Bush. Jawad está sob custódia norte-americana desde que foi capturado quanto tinha possivelmente 14 anos. É um dos presos de Guantânamo investigados por crimes que supostamente cometeram quando eram crianças. O ex-promotor da comissão militar encarregada de seu caso, Darel Vandeveld, apresentou uma declaração de 14 páginas apoiando o recurso do hábeas corpus, reconhecendo que as falhas no sistema tornam impossível "abrigar a mais remota esperança de que a justiça seja uma meta alcançável". Na declaração, Vandeveld descreve as torturas que Jawad sofreu sob custódia dos Estados Unidos.
Na outra decisão judicial relevante, o Departamento de Defesa foi ordenado a divulgar um "número substancial" de fotos mostrando os abusos cometidos por pessoal militar norte-americano contra prisioneiros no Afeganistão e no Iraque. A desclassificação foi ordenada em resposta a um pedido apresentado pela Aclu em 2004 com base na Lei de Liberdade de Informação, e inclui fotografias feitas em outros lugares sem ser Abu Ghraib, prisão tristemente célebre pelas imagens dos abusos ali cometidos e que percorreram o mundo (hoje faz cinco anos que o mundo viu pela primeira vez as chocantes fotos da prisão de iraquiana de Abu Ghraib, exibidas no programa norte-americano 60 Minutos).
"As fotografias fornecem provas visuais de que os abusos contra prisioneiros não eram casos isolados, mas algo propagado, além das paredes de Abu Ghraib", disse Amrit Singh, advogada da Aclu. "Sua revelação é fundamental para ajudar o público a entender a escala e o alcance dos abusos cometidos contra presos, bem como para responsabilizar as autoridades por admiti-los", acrescentou. O governo Bush se negara a divulgar essas imagens, disse a Aclu, argumentando que causariam indignação pública. Mas, em setembro passado, um tribunal de apelações sentenciou a favor da divulgação das fotos, considerando-as de significativo interesse público.
"A divulgação das fotografias serve como recordação de que os abusos cometidos contra prisioneiros em centros de detenção administrados pelos Estados Unidos eram algo sistemático", disse Jamelle Jaffer, diretor do projeto de Segurança Nacional da Aclu. "Alguns dos abusos ocorreram porque altos funcionários civis e militares criaram uma cultura de impunidade na qual os abusos eram tolerados, e alguns foram expressamente autorizados. É imperativo que os altos chefes que os permitiram ou autorizaram agora sejam responsabilizados por suas ações", acrescentou.
Fonte: IPS/Envolverde.