Em campanha contra o IPEA, Estadão não concede direito de resposta a pesquisador
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- Andrea
- 18/05/2009
Nos últimos tempos, o IPEA, sob direção recentemente renovada, tem publicado diversos estudos e documentos acerca de algumas características do mercado de trabalho, indicadores sociais, econômicos, entre outros.
Tais estudos, se levados a sério por governo e supostos responsáveis por bem informar à população, poderiam suscitar novas e necessárias discussões em torno das questões abordadas, inclusive no sentido de buscar a superação de diversas convicções sobre distribuição de renda, emprego, jornada de trabalho, verdadeiro peso da máquina estatal, funcionalismo público, em suma, temas do mais profundo interesse geral.
Talvez por apresentar ao público números e constatações que muito desagradam aos setores dominantes (como o estudo que escancarava a obscenidade da distribuição da renda nacional) o instituto tem sido alvo de ataques dessas parcelas. O interesse é claramente o de desqualificar o trabalho de um instituto independente, que não costuma realizar trabalhos e pesquisas sob encomenda de grandes grupos interessados, como os Estudos de Impacto Ambiental que tanto vemos nosso governo engolir e que são providenciados pelas próprias empresas envolvidas nos negócios – esses são contestados pela mídia?
Por conta disso, o Correio da Cidadania, no que foi seguido por alguns outros blogs e meios alternativos, publica carta-resposta a um editorial acusatório do Estadão, o qual apontava para uma suposta ‘politização do IPEA’. A mensagem foi enviada ao próprio jornal, que apesar de possuir até um manual sobre como se fazer jornalismo, esqueceu-se de seu mais básico princípio: escutar o outro lado. Por conta do ‘deslize’, o artigo do pesquisador Eneuton Dornellas Pessoa de Carvalho recebeu seguidas negativas de publicação, tendo o jornal permitido somente algumas linhas na seção de cartas dos leitores. Ainda assim num sábado de feriado emendado, certamente com o intuito de garantir a mesma repercussão de seu Editorial. Ou alguém duvida do sentido democrático de nossa mídia?
A carta que o Estadão se nega a publicar
Encaminho e-mail que estou repassando para os blogs independentes e para os portais que discutem comunicação.
Como fiquei rouco de tanto gritar, tentando um direito de resposta no Estadão, que obviamente o jornal negou, encaminho meu protesto aos blogs, na esperança de que pelo menos seus leitores possam ter acesso à informação completa.
Na segunda-feira 13 de abril, o Estadão publicou o editorial "A Politização do Ipea", acusando estudos recentes do Ipea de não serem técnicos, mas políticos. Não é o primeiro desde que a nova diretoria assumiu.
Tentei por todos os caminhos o espaço de um artigo na página 2 para esclarecer o assunto, já que num período de dez dias, houve um colunista do jornal desqualificando os estudos em sua coluna, uma nota no mesmo tom na coluna da Sonia Racy e o editorial. O jornal negou o espaço.
Depois de muita insistência, consegui apenas a publicação de uma carta da assessoria na seção de cartas dos leitores no dia 18 de abril, um sábado, emenda do feriado de Tiradentes.
Um dos autores do estudo se sentiu pessoalmente atingido pelo editorial que desqualificava seu trabalho, solicitou também o espaço de uma carta para poder dar seus argumentos, já que em momento algum, apesar das críticas, o jornal procurou ouvir os autores dos estudos. Regrinha básica do jornalismo: ouvir o outro lado.
Dia 27 de abril, encaminhei pedido por e-mail ao jornal, que o ignorou, sequer me mandou resposta. Insisti nos pedidos, pois o jornal vem desqualificando a atuação do Ipea sistematicamente, em colunas, reportagens, artigos e três editoriais. Negou ao Ipea um direito de resposta decente, o espaço de artigo na página 2, mais nobre e mais longo para se defender democraticamente. Publicou apenas aquela carta minha na seção dos leitores, nada mais justo, portanto, publicar também uma carta de um dos autores criticados. Apenas ontem, dia 6 de maio, recebi um email lacônico negando espaço ao autor.
Diante da negativa, encaminho aos blogs a carta do pesquisador Eneuton Dornellas Pessoa de Carvalho.
Encareço a você, caro jornalista, que publique esta história e a carta em seu blog.
Muito grato.
Estanislau Maria,
Assessor-chefe de imprensa do Ipea.
A carta: O MITO DO ESTADO INCHADO
Desde que foi publicado o Comunicado "Emprego Público no Brasil: Comparação Internacional e Evolução", que se desenrola polêmica a respeito de um suposto inchaço do Estado brasileiro. Nada mais saudável. Até então, havia somente uma certeza: a de que o Estado brasileiro é inchado e ponto final. Mas baseada em quê? Quais os números? Que critérios de comparabilidade?
Quem se der ao trabalho de ler o Comunicado (http://www.ipea.gov.br/) vai perceber que se trata de algo meramente descritivo, sem quaisquer ilações, para além das que os números podem sustentar. Metodologicamente, tivemos o cuidado e o rigor de levantar, exaustivamente, todas as conceituações para o emprego público, passíveis de operacionalização pelas fontes de dados disponíveis, a saber: os Censos Demográficos, a Pnad e o Rais. Além disso, mapeamos, na literatura internacional, os conceitos de emprego público utilizados pela Cepal, OCDE, OIT e Banco Mundial, e optamos, no caso do Brasil, pelo conceito o mais amplo possível, mesmo em relação aos utilizados por esses organismos internacionais. Por outro lado, estamos cientes das limitações dos conceitos, dado as novas dimensões do emprego público, especialmente no que tange ao universo dos terceirizados no setor público.
A radiografia e a evolução do emprego público, que ora esquadrinhamos, e da qual extraímos o trabalho em tela, faz parte de uma pesquisa mais ampla, que tem como foco a gestão dos recursos humanos no serviço público, desenvolvida em parceria com a Secretaria de Recursos Humanos e a Secretaria de Gestão do MPOG, a Enap, e que conta com a colaboração do IBGE. Institucionalmente, a Pesquisa se insere no âmbito do Eixo Temático de Investigação do Ipea: Estado, Instituições e Democracia.
A propósito, a pesquisa foi concebida a partir da idéia de que o aperfeiçoamento das instituições e dos organismos estatais, voltado para uma atuação cada vez mais qualificada, em prol do desenvolvimento econômico e social do país, é um processo que requer ação continuada. Assim, numa perspectiva de longo prazo, a questão da gestão dos recursos humanos no setor público passa a ser uma área de investigação permanente no Ipea.
Recomendam a boa literatura sobre a gestão dos recursos humanos no setor público, serem fundamental o dimensionamento do número de servidores, sua distribuição, modalidades etc. Só por isso a pesquisa se iniciou com o levantamento do quantitativo do emprego público. Aliás, coisa que nunca se fez. Na última reforma administrativa, nos anos 90, por exemplo, o diagnóstico do Estado inchado fundamentou os Programas de Demissão Voluntária, os denominados PDVs. Nos governos estaduais, a implantação dos PDVs comprometeu a oferta de serviços de saúde, educação e segurança, sem contar que iniciativas desse tipo levam à saída dos bons servidores, mais aptos e dinâmicos, com maior capacidade de inserção alternativa no mundo do trabalho, justamente aqueles os quais uma boa gestão dos recursos humanos deve buscar retê-los.
Do acima exposto, não nos cabe a pecha de defensores do empreguismo público de per si. De outra parte, cientes de que cerca da metade dos jovens, na faixa etária de 15 a 25 anos no país estão fora do ensino médio, e de que somente cerca de 40% das crianças aptas para a educação infantil estão matriculadas na pré-escola, que o Estado brasileiro precisa aumentar e melhorar sua presença nas áreas de fronteira, de conflito agrário e de preservação ambiental, de que a porta de entrada no SUS ainda é estreita e que para estes não cabem a solução do mercado é que identificamos a tendência à expansão dos serviços públicos e, por conseguinte, do emprego público no País.
Eneuton Dornellas Pessoa de Carvalho é pesquisador no Ipea e um dos autores o trabalho "Emprego Público no Brasil: Comparação Internacional e Evolução".