Correio da Cidadania

Projetos financiados pelo BNDES causam danos sociais e ambientais

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"A preocupação com o meio-ambiente não é tradicional em nenhum lugar do mundo. E esse é um processo de aprendizado. Há uma resistência grande por parte das empresas e do banco, e os grupos de defesa do meio ambiente devem manter a pressão para que o BNDES adote essa cultura", afirma o professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Fernando Cardim.

 

A declaração sustenta o rótulo de "desenvolvimentista" dado às ações do BNDES, com recorrentes críticas aos danos ambientais dos empreendimentos estimulados e questionamentos sobre a efetiva geração de emprego e renda, e consolidação de uma economia com base em produtos primários.

 

Se no governo Lula, o banco recuperou uma real preocupação com o desenvolvimento, abandonada na gestão FHC, parece, no entanto, priorizar a formação de grandes conglomerados monopolistas de empresas nacionais.

 

Atualmente, o BNDES é o terceiro maior banco de fomento do mundo. Em 2010, será capitalizado com mais de R$ 100 bilhões. Em 2008, os empréstimos de R$ 128 bilhões superaram a soma das quantias equivalentes do Banco Mundial (R$ 46 bilhões), do Banco Interamericano de Desenvolvimento (R$ 14 bilhões) e do Eximbank dos Estados Unidos (R$ 16 bilhões).

 

Hoje, sua atuação concilia socorro a empresas, subsídio a multinacionais e financiamento de grandes fusões com discurso nacionalista. Carlos Lessa, ex-presidente do banco no início do governo Lula, acredita que o banco "teve um papel importante no enfrentamento da crise econômica". Entretanto, o economista considera o cenário econômico problemático, especialmente devido à manutenção da política econômica conservadora do Banco Central.

 

Criado em 1952, durante o segundo governo Vargas, o BNDES sempre teve um papel essencial na economia brasileira. Com o banco, Getúlio visava financiar empreendimentos industriais e de infra-estrutura. Concebido para fomentar amplos setores da economia, terminou por assumir, nos anos 1970, o estímulo à chamada substituição de importações. Seu papel não é apenas o de execução, mas também de formulação de políticas. Entretanto, sem nunca perder a centralidade na economia nacional, sua forma de atuação sofreu constantes mutações.

 

Por Leandro Uchoas, Brasil de Fato.

 

 

BNDES não prioriza critérios ambientais

 

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) apresenta falta de transparência com relação aos critérios para a sua política ambiental. A denúncia é feita por Gabriel Strautman, secretário executivo da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais. "Devemos exigir que o banco adote critérios claros e transparentes para sua política ambiental pois, atualmente, não sabemos como ele enquadra o risco de um projeto de hidrelétrica, por exemplo." A crítica recai sobre um banco público que tem a missão de financiar projetos de interesse público, mas está de costas para isso e critérios ambientais não são considerados como deveriam para a liberação dos financiamentos.

 

A agressiva política de crescimento a qualquer custo tem levando à destruição massiva da sociobiodiversidade e à desterritorialização de comunidades tradicionais. Isso foi agravado pelo processo de flexibilização da legislação ambiental e pelo desmonte do sistema de gestão ambiental para torná-lo adequado às metas estabelecidas pelo governo federal. Desse modo, o BNDES cumpre um papel importante para a concretização de tais políticas ao agir como avalizador de financiamentos mesmo antes da finalização dos procedimentos legais de licenciamento, criando um ambiente de negócios bastante favorável às empresas. Um exemplo típico dessa postura foi o financiamento das usinas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, em que o BNDES sozinho assumiu o compromisso de financiar 80% dessas polêmicas obras, mesmo antes de qualquer avaliação de viabilidade econômica e socioambiental do projeto ter sido realizada.

"Cada vez mais o banco vem operando a partir de uma lógica privada que leva em conta basicamente critérios técnicos e financeiros e desconsidera os aspectos sociais e ambientais. Isso explica porque ele financia projetos de pecuária na Amazônia, por exemplo. Então nos perguntamos se o banco sabia ou não sabia que determinado problema iria acontecer, como por exemplo, a morte de dezenas de toneladas de peixes durante a construção da barragem de Santo Antônio. Antes de liberar o financiamento, deveria, minimamente conhecer os problemas sociais e ambientais que esses projetos podem causar. Por isso consideramos que o BNDES também é responsável pelos danos socioambientais que acontecem em todos os grandes projetos que financia", declara o secretário da Rede Brasil.

 

Alexania Rossato, Brasil de Fato.

 

 

BNDES-Vale: Uma parceria que devasta o país

 

Ela atua nos cinco continentes. É a segunda maior empresa nacional, e também a segunda maior mineradora do mundo. Porém, em sua forma de atuação, incorpora os maus hábitos da maioria das grandes corporações globais. A Vale tem sido agente de inúmeros casos de destruição ambiental e de exploração massiva do trabalhador. Apesar desse currículo, boa parte de sua expansão se deve ao dinheiro público que recebeu do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

 

"Eles pagam baixos salários, muitas vezes abaixo do mercado. Têm uma grande massa de trabalhadores com padrão de sobrevivência muito baixo, dão pouca atenção à saúde e à segurança do trabalhador, e têm pouco respeito às comunidades atingidas", afirma Guilherme Zagallo, advogado da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

 

Apenas no último ano, a empresa lucrou 13,2 bilhões de dólares, quatro vezes o valor pelo qual ela foi "comprada" nos anos 1990, com dinheiro e participação do BNDES. Banco e empresa estão entranhados em laços complexos. O BNDESpar (holding do banco criada para administrar suas participações em diversas empresas) tem uma participação de 4,2% das ações da Vale, e 12% da Valepar, empresa criada exclusivamente para ser acionista da Vale e que detém um terço do capital financeiro da companhia privatizada.

 

Empréstimos "ocultos"

 

Padre Dario Bossi, do Justiça nos Trilhos, esclarece como os benefícios são concedidos. "Os empréstimos para a construção de sistemas de transporte ferroviário são localizados em rubricas de infra-estrutura, para não deixar claro a quem a operação favorece", diz. Padre Dario conta, também, que, no primeiro semestre de 2008, o BNDES aprovou uma linha de crédito de 7,3 bilhões de dólares para a Vale. Em seguida, o chefe de gabinete do presidente do banco, Demian Fiocca, transferiu-se para a alta direção da mineradora.

 

"O desenvolvimento que o BNDES sustenta é baseado em grandes projetos, com fortes impactos e poucos benefícios [à população]", interpreta. Três exemplos comprovariam a teoria. Um deles é a imensa duplicação dos trilhos no Maranhão, obra financiada pelo banco, que também duplica os impactos sócio-ambientais no trajeto.

 

Enquanto a população local continua paupérrima, R$ 50 milhões em minérios passam diariamente pelos trilhos que atravessam as comunidades. Um segundo exemplo é a construção de uma nova siderúrgica em Marabá. Com investimento de R$ 6,6 bilhões, o projeto gerará, temporariamente, quantidade razoável de empregos. Entretanto, também é certa a devastação ambiental, a imigração masculina em massa, a favelização, e o aumento dos níveis de prostituição e violência.

 

Conflitos emblemáticos

 

O terceiro exemplo é o mais emblemático: o investimento em "reflorestamento", que representa, na realidade, barreiras ao livre desenvolvimento da agricultura familiar. O BNDES prioriza o financiamento ao vasto plantio de eucalipto geneticamente modificado, escanteando o estímulo a pequenos produtores rurais.

 

Ao longo da estrada de ferro Carajás, o investimento da Vale, financiada pelo banco, vai fortalecer a monocultura do eucalipto. "Para além do sonho da preservação da Amazônia, ou do assentamento de pequenas comunidades rurais, afirmou-se mais uma vez a lei do mais forte e o modelo do agronegócio", resume padre Dario.

 

Há ainda conflitos que ganharam contornos emblemáticos, embora raramente cheguem à imprensa (vale lembrar que a Vale tem uma ampla estratégia de propaganda na mídia). A instalação da Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), com participação da Vale, na Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro, é acusada de provocar enorme devastação ambiental, subemprego, exploração de mão-de-obra chinesa precária, e até vínculo com milícia. A empresa já foi embargada duas vezes. O BNDES destinou R$ 1,48 bilhão ao empreendimento.

 

Em abril, outro conflito. Em Barcarena, no Pará, a Alunorte, empresa de propriedade majoritária da Vale, foi multada em R$ 5 milhões por vazamento de lama vermelha e bauxita com soda cáustica. Também foi multada por barrar a fiscalização. A empresa recebeu 92 milhões de dólares do BNDES, ainda no governo FHC (1995-2002). No Canadá, onde a mineradora Inco foi comprada pela Vale em 2006, instalou-se uma greve inédita: 3,3 mil trabalhadores de um país central resistindo a uma empresa brasileira. A Vale é acusada de eliminar uma série de direitos trabalhistas, mesmo lucrando nos últimos dois anos mais do que a Inco em dez anos – 4,2 bilhões de dólares.

 

Por Leandro Uchoas, Brasil de Fato.

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