Militantes do PSOL denunciam contaminação da água em Lençóis Paulista
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- Andrea
- 11/05/2011
Na noite de segunda (9/5), ocorreu na Câmara Municipal de Lençóis Paulista uma audiência pública, parte do processo de elaboração de um plano de sustentabilidade e saneamento básico. Este plano prevê controle social, que deve ser feito por todos, até porque envolve investimentos na casa de 150 milhões de reais. Comparecemos a esta audiência Paulinho Rodrigues, Henrique Sá e eu, Rodolfo Pelegrin, militantes do PSOL. O vídeo da sessão está disponível neste link. Este texto é um relato da atividade, e também um chamado à ação.
Foi apresentado um relatório sobre a situação do saneamento básico e dos recursos hídricos que o sustentam pelo engenheiro contratado para elaborá-lo, Julio Perroni. O diagnóstico foi cuidadosamente confeccionado, com muita coerência aos dados fornecidos pelo Comitê Gestor da Bacia Hidrográfica (conheça aqui), e apresenta informações importantes e também preocupantes sobre a questão. Certos pontos chamaram a atenção, alguns deles por omissão.
Perroni demonstrou grande conhecimento do tema. Indicou a falta de cobertura vegetal nativa (reduzida a cerca de 3% na parte do município que fica na bacia do Rio Lençóis) como um grande problema, e o mau planejamento urbano como fator que compromete a qualidade e disponibilidade da água. Informou que as perdas no sistema da cidade são da ordem de 48% hoje. Indicou que a LWARCEL – fábrica de celulose de propriedade da família Trecenti, da qual faz parte o atual vice-prefeito - faz grande captação de água via poço, o que rebaixa o lençol e, além de reduzir o estoque de água, acarreta maiores custos para bombeamento no futuro.
Passou pelas propostas, onde se encontrava uma em especial, prevendo uma taxa que comporia um fundo para recuperação do sistema hídrico. Indicou que a medição das APPs não é feita corretamente, pois conta-se do rio, e não das extremidades da largura máxima de seu leito na cheia. Propunha também incentivos para agricultura permanente e uso de técnicas de consórcio florestal etc. Apresentou também uma série de soluções técnicas – para as construções urbanas – que, apesar de interessantes, não vem sendo utilizadas nem incentivadas pela prefeitura, e fez uma crítica severa à forma como hoje são projetados e construídos os loteamentos (visando a venda do maior número possível de terrenos, criando bairros comparáveis a guetos, e sem a menor preocupação ambiental), com autorização do executivo local.
Da proposta consta a possibilidade de substituir a atual ETA (Estação de Tratamento de Água, localizada na rua XV), para evitar os prejuízos causados pelas enchentes (sinal claro de que elas devem continuar acontecendo). Duas alternativas principais foram lançadas: uma nova ETA no Jd. Ubirama, ou uma série de novos poços, com destaque a uma bateria deles na mata entre o Ubirama e a Facol. Mas indicou que, segundo as projeções de crescimento populacional, considerando que o Rio Lençóis mantenha sua vazão, o perímetro urbano teria volume de água mais que suficiente daqui a 20 anos apenas reduzindo as perdas do sistema.
Quando abriram para perguntas,
rapidamente nos adiantamos e fizemos os primeiros questionamentos. Entre eles:
- Por que o foco na questão domiciliar, se agricultura e a indústria
consomem 0,55 dos 0,57 metros cúbicos
de água captados por segundo no município?
- Já que a LWARCEL consome o estoque de água e aumenta o custo de
captação, ela não tem que pagar?
- Se é pra promover e investir em uma agricultura diversificada e de
baixo impacto, por que não cumprir a lei e fazer reforma agrária nas terras
públicas do município, que somam 14% de sua área total?
- Não é absurdo que o contribuinte pague para compensar os impactos das
empresas, através de mais taxas?
- Principalmente, por que a questão dos contaminantes da água, em
especial os agrotóxicos e a vinhaça, não foi tratada neste relatório?
É necessário dizer que nenhum dos argumentos colocados por nós foi rebatido
pelo engenheiro. NENHUM!
De início, ele deslocou a questão, dizendo que estava falando só de abastecimento urbano, e que tem questões que fogem ao âmbito municipal. Disse que há muito tempo se discute cobrança pelo uso da água, mas ela nunca ocorreu, e que deve ocorrer no futuro, sabe-se lá quando. Defendeu que o governo pague compensações para quem preservar em suas terras (absurdo, pagar para que aquele que lucra com a destruição cumpra com as leis). De falar sobre a reforma agrária ele nem passou perto.
O mais importante que ele disse, não sem se contradizer posteriormente, foi que os agrotóxicos e a vinhaça não são problema aqui, dada a existência de uma camada basáltica protegendo o aqüífero. Mais séria, entretanto, foi sua declaração que veio a seguir: contaminação de lençol freático, em Lençóis Paulista, ocorre em apenas 2 pontos: IQB (empresa situada no distrito industrial e que há anos leva a fama de contaminadora) e LWARCEL. Quem assistir ao vídeo verá que a afirmação do engenheiro é inequívoca: são dois casos de contaminação.
Marise – ex-prefeito e atual diretor do SAAE – pediu a palavra, e disse que a contaminação de uma empresa (IQB) teria sido detectada no terreno da outra, eximindo a LWARCEL de responsabilidade sobre o passivo ambiental. Ofereceu-se para receber qualquer cidadão que queira saber mais sobre o tema, e vamos tratar desta oferta mais à frente.
Outros cidadãos presentes questionaram a apresentação. Um deles perguntou por que a prefeitura não usa uma sequer das soluções técnicas apresentadas em suas obras – e ouviu da responsável pelo planejamento urbano que ela “tinha ido fazer um curso em São Paulo” e que ia começar a usar estas técnicas. Outro questionou o plano de furar novos poços na cidade, já que isto compromete os estoques futuros. Neste caso, o engenheiro disse que o mais inteligente é proteger os recursos hídricos superficiais (rios, córregos) do que comprometer a água do subsolo, que será necessária para as próximas gerações.
De forma intrigante, Marise disse logo na sequência que está furando poços e vai furar mais... Ou seja, usaremos cada vez mais água mineral para dar descarga no banheiro. Vale a pena lembrar que durante a apresentação, ficou evidenciado que, combatendo os desperdícios do sistema, poderíamos passar mais de 20 anos utilizando as mesmas fontes de hoje, sem risco algum de desabastecimento! Mesmo assim, Marise está investindo grandes somas na perfuração de novos poços. No decorrer da resposta do engenheiro, ele reconheceu também que os agrotóxicos são um grande problema, que há substâncias cancerígenas nos suprimentos de água e que não são feitos devidamente as análises para detectar estas substâncias.
Devemos ressaltar, a partir do ocorrido, que:
(1) Soluções aparentemente técnicas escondem propostas políticas, e encobrem interesses privados;
(2) A participação nestes processos é necessária, inclusive para fiscalizar a aplicação de milhões de reais provenientes de nossos impostos, e pode gerar um ganho qualitativo para a sociedade;
(3) O boato de que a fama da IQB serve para encobrir contaminação de importantes empresas lençoenses pode corresponder à realidade.
Ao menos uma ação de grande importância deve ser realizada a partir desta audiência: reunião de um grande grupo de cidadãos, com o intuito de exigir o mais rápido possível explicações do prefeito Marise, diretor do SAAE, sobre a questão da contaminação da água! Publicizar os fatos dos quais temos conhecimento também é, a partir de agora, tarefa de todos!
Lembro que os fatos aqui relatados foram registrados em vídeo (que pode ser conferido clicando aqui), e, esperamos, logo devem estar à disposição dos cidadãos. Nossa participação ocorre a partir de 1h04min do vídeo. Em breve divulgaremos uma versão em que seja mais fácil ouvir nossa participação.
Nossa luta não pode se restringir à água: contaminantes agrícolas e industriais estão presentes no solo, no ar e nos alimentos, frequentemente tirando de todos o direito à plena saúde, e por vezes até a vida. O PSOL de Lençóis Paulista vai fazer esta luta e espera contar com o apoio da juventude lençoense.
Por Rodolfo Pelegrin, militante do PSOL.
Blog: http://rodolfopelegrin.wordpress.com/2011/05/11/contaminacao-da-agua-em-lencois-paulista/