Sobre as contínuas arbitrariedades da PM e do Judiciário: a quem serve esse direito penal?
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- 01/11/2013
Nota do Movimento Passe Livre São Paulo
Na última quarta-feira, 30 de outubro, o Juiz Alberto Anderson Filho, da Primeira Vara do Tribunal do Júri, negou a liberdade a Paulo, preso na última manifestação da Semana Nacional de Luta por Transporte Público, absurdamente acusado de tentativa de homicídio sem que haja qualquer indício de que ele encostou no Coronel da Polícia Militar. O magistrado sustenta a sua decisão “como garantia da ordem pública”.
O teor da decisão deixa claro que o Judiciário não têm provas da acusação que é feita contra Paulo, mas o mantém preso simplesmente por participar do protesto. Na visão do magistrado, todo protesto depois de junho seria uma “quebra da ordem pública”. Nas palavras dele:
“São alguns poucos, em relação às centenas de milhares que anteriormente participavam, e estes, queira ou não, causam enorme prejuízo para a coletividade, bloqueando avenidas importantes, rodovias, e facilitando a ação de grupos de vândalos e malfeitores. Inquestionável que tais atitudes provocam intensa perturbação da ordem pública.”
Tal decisão é gravíssima e expressa violento atentado não apenas contra os direitos fundamentais de Paulo à liberdade, à presunção de inocência e à ampla defesa, mas também contra a liberdade de todas as pessoas que protestam contra a arbitrariedade do Poder Público e buscam melhores condições de vida.
Não parece coincidência que essa decisão venha no mesmo momento em que explode uma revolta popular na periferia da zona norte de São Paulo, onde familiares, amigos e moradores do bairro lutam para que o assassinato do adolescente Douglas, e poucos dias depois de Jean, pela Polícia Militar não seja mais um a ficar para a história sem respostas e sem responsabilizações.
O magistrado defende que as manifestações atentam contra a ordem pública e, consequentemente, todos que participam dela devem ser reprimidos e, se possível, presos, exatamente como ocorreu no Jaçanã: uma bomba foi atirada de um helicóptero e quase uma centena de prisões de manifestantes foi realizada.
Enquanto Paulo é acusado, sem provas, de tentativa de homicídio contra o Coronel agredido, o PM que atirou e matou Douglas é acusado apenas de homicídio culposo, sem intenção de matar. As prisões para averiguação, figura comum nas periferias de São Paulo, também continuam sendo amplamente utilizadas, com 77 das pessoas presas desta forma nas recentes manifestações na zona norte, liberadas por não haver qualquer prova contra elas.
Isso tudo apenas evidencia o que já denunciamos: o Sistema Penal é seletivo, funcionando apenas para criminalizar a pobreza e todos que lutam contra uma ordem que é feita apenas para explorar e oprimir os de baixo. Receoso com a revolta da população, o Judiciário sequer se dá ao trabalho de cumprir as mais básicas garantias constitucionais. A instrumentalização do direito para proteger determinados interesses, em um contexto de avanço das lutas sociais, fica cada dia mais clara.
Ninguém pode ser preso por participar de uma manifestação. Ninguém pode permanecer preso se não há prova especifica da autoria do crime de que está sendo acusado.
O MPL se solidariza com a população em levante na zona norte, que luta contra o extermínio sistemático de seus jovens, quase sempre negros, pela PM.
Entendemos que a repressão que tem se operado nas manifestações na Vila Medeiros, que é a mesma que ocorre todos os dias nas periferias de São Paulo, é ainda mais grave do que o que temos visto nas recentes manifestações de rua, que acontecem no centro da cidade, e são amplamente cobertas pela mídia. As poucas imagens que vimos deixam isso evidente. O objetivo é claro: manter o povo calado e de cabeça baixa contra essa ordem policial e judicial orientada a nos criminalizar.
Não nos calaremos diante desse descalabro. Adotaremos todas as medidas necessárias para reverter a decisão do Juiz Alberto Anderson Filho, que, sem o menor pudor, criminaliza as manifestações populares.
Além do Paulo, outras 6 pessoas seguem presas por lutar por um transporte sem catracas por enquadramento claramente inconstitucional no crime de “formação de quadrilha”. A eles também somos solidários e protestamos pela imediata soltura de todos.
Não podemos silenciar diante desse terrorismo de Estado.
TODA VITIMA É UMA VITIMA POLÍTICA!
TODO PRESO É UM PRESO POLÍTICO!
TODA FORÇA PARA QUEM LUTA POR UMA VIDA SEM GRADES E SEM CATRACAS!
Decisão do juiz: http://saopaulo.mpl.org.br/wp-content/uploads/2013/10/decis%C3%A3o-liberdade-anderson.pdf
Vídeo do helicóptero lançando bomba na manifestação: http://coletivodar.org/2013/10/estado-em-guerra-com-o-povo-helicoptero-da-pm-lanca-bomba-em-protesto-e-fere-manifestante-em-sp/