Correio da Cidadania

Carta pública das militantes Presas na Operação 12 de julho, no Rio

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Fomos presas no dia 12/julho de 2014 e uma pergunta ainda permanece: Qual a nossa acusação?

 

Somos indignadas, engraçadas, libertárias, professoras, resistentes, corajosas. Somos produtoras, garçonetes, trabalhadoras, sem carteira assinada, advogadas, mídia-ativistas. Também mães, filhas, irmãs, tias, primas, netas. Somos amigas, amadas e amantes. Somos mulheres e somos presas políticas.

 

Numa ação arbitrária, com um processo forjado, provas plantadas, menores presos, violências e ameaças, fomos jogadas no cárcere com outras exploradas e excluídas como nós. A ressocialização desse sistema está presente apenas na estampa dos nossos uniformes. O isolamento e a invisibilidade não ressocializam ninguém. E mesmo com todo o assédio, com as quatro a seis horas em transportes precários, com salários insuficientes para pagar o alto custo de vida na cidade, como professores sem condições dignas de trabalho e sem salário, como negras discriminadas, não nos calamos perante o Terrorismo do Estado, pois tudo isso é uma forma de dizer que é melhor ficarmos caladas e submissas.

 

É preciso denunciar ainda que a operação do dia 12 de julho foi um grande conluio do Estado, com mandados expedidos sem nenhuma prova concreta e executados sem que nenhum crime tivesse sido cometido, apenas com intuito de impedir que houvesse manifestações na final da Copa. Para garantir o espetáculo do Mundial e o lucro de poucos, muitos perderam suas casas, alguns perderam suas vidas, outros tantos seus empregos, greves foram criminalizadas e nós fomos presas.

O que ocorre no país hoje é perseguição política. Há anos as pessoas têm ido às ruas com suas reivindicações diante da percepção das contradições dessa sociedade doente na qual vivemos, sofrendo sequestros-relâmpago, infiltração de policiais, quebras de sigilo telefônico, processos administrativos, violência policial (inclusive com óbitos), tiros com armas letais, ameaças diretas e indiretas, cassação de salário; e agora, como em outros momentos da história, estão sendo encarceradas por suas posições políticas diante do crescimento e ameaça concreta deste movimento à ordem dominante. Assim, movimentos sociais e políticos estão sendo transformados em associações criminosas.

 

Militamos em vários espaços distintos. Somos companheiras de luta, sim. O que une é a luta por uma sociedade mais justa, mesmo que muitas de nós só tenham se conhecido aqui, atrás das grades. Paralelo a isso, a grande mídia cria um espetáculo, fabrica líderes fáceis de matar e tenta calar as nossas vozes.

 

Nos tiraram a única coisa que nos dizem que temos: nossa liberdade fora desses muros, nossa liberdade de ir e vir, mas só nos lugares que nos permitirem.

 

(Liberdade) de comprar o que não precisamos ter. Liberdade para sermos exploradas, caladas, submissas, discriminadas, assediadas. Liberdade de ter as chaves das nossas celas.

 

Declaramos que a liberdade que queremos é maior que esta. É a liberdade de saber que nós não moraremos na rua porque ninguém mais mora na rua. Liberdade para nos alimentar, mas porque sabemos que ninguém passa fome. Liberdade de amar quem quisermos porque somos livres e só seremos livres quando ninguém mais for escravo.

Evocamos a todas(os) para lutarem nas ruas, para criarem cada vez mais espaços de resistência e que nossa perseguição, sofrimento e cárcere não sejam em vão.

 

Chamamos também a todas(os) que ocupam lugares privilegiados nessa sociedade desigual — juristas, intelectuais, jornalistas, sindicatos (em especial o SEPE), organizações de direitos humanos, formadores de opinião, a comunidade da UERJ (que inclusive tem uma professora entre nós) e universidades — a tomarem um posicionamento público.

 

É sempre bom lembrar que quem se cala diante das injustiças contribui para a manutenção desta situação. A luta continua, voltamos para a rua, ninguém fica para trás.

 

Penitenciária Feminina de Bangu, Pavilhão 8 — Anexo 2

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