Infelizes coincidências: o abuso de poder contra negros e pobres no Brasil e nos EUA
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- Thiago Gabriel
- 13/08/2014
No ultimo sábado (9), a polícia do estado do Missouri, nos Estados Unidos, assassinou o jovem negro Michael Brown em um bairro pobre próximo à cidade de St Louis. Brown tinha 18 anos, estava desarmado e, segundo testemunhas, não ofereceu resistência à abordagem. A versão da polícia alega que ele teria tentado tirar a arma dos policiais e só então foi alvejado com tiros no peito e na cabeça.
Logo após o assassinato, moradores do bairro e de comunidades próximas iniciaram uma revolta contra as forças policiais. Nas ruas, denunciavam o abuso de poder contra negros e pobres.
Cena dos protestos que tem acontecido no Missouri, em Ferguson (EUA)
Os protestos se estenderam, ganharam adeptos e na noite do dia seguinte milhares de pessoas foram às ruas para realizar uma vigília exigindo punição aos culpados. Durante os atos, algumas lojas foram saqueadas, o que motivou a Polícia a aplicar o uso de gás lacrimogêneo e de balas de borracha; 32 pessoas foram presas. As cenas tomaram os telejornais de todo o país.
Durante os protestos, um policial foi flagrado por câmeras dizendo “Venham, seus animais”. Outro oficial afirmou que a vítima levou “mais de dois tiros, mas não muito mais que isto”. A polícia de St. Louis afirma que vai investigar a morte do jovem, mas pediu calma aos moradores da região.
O clima de tensão segue em St. Louis, onde as manifestações acontecem diariamente com repressão policial, que já realizou mais de 50 prisões, e o apoio da SWAT, sua força de elite. No bairro de Fergunson, onde o jovem foi assassinado, 60% da população é composta por negros, enquanto 94% dos policiais são brancos.
Outro caso recente gerou revolta na região de Staten Island, em Nova Iorque. Eric Garner, um homem negro de 43 anos, foi abordado pela polícia local acusado por venda ilegal de cigarros.
Ao notar a arbitrariedade da prisão, Garner afirma que não será levado e pede para “ser deixado em paz”, declarando não ser a primeira vez que é parado pela polícia a troco de nada. Em nenhum momento, Garner oferece resistência física à prisão. Os policiais então o agarram e passam a enforcá-lo. Ele reclama diversas vezes por não conseguir respirar. Alguns minutos depois ele já está morto.
As cenas do homicídio foram gravadas pelo celular de Ramsey Orta, de 22 anos. Orta foi preso algumas semanas após a morte de Garner sob a estranha acusação de porte de armas e liberado dias depois.
A família afirma que policiais vinham seguindo seus passos desde que a filmagem percorreu o mundo. Nenhuma arma foi encontrada. Ele acredita que foi tudo uma grande armação policial, acusando o oficial que o prendeu de lhe dizer “tudo que vai, volta”.
O porta-voz de uma associação da polícia de Nova Iorque chegou a afirmar que “as cenas de uma operação policial nunca são bonitas”. Continuou dizendo que Garner não morrera por estrangulamento, mas sim por “desrespeito às forças policiais”, criticando ainda a forma como policiais são vistos em Nova York e a falta de credibilidade dada pela população às autoridades, mesmo após casos como esse.
A morte de Eric Garner ainda provoca a revolta de muitos cidadãos americanos. Entidades de defesa dos direitos civis estão organizando uma grande marcha, em Nova Iorque, para o dia 23 de agosto.
Outro vídeo viralizado na internet flagra o abuso da força policial em um trem do metrô de Nova Iorque, em maio deste ano (2014). Um homem negro não-identificado dormia no trem depois de voltar do trabalho. Os policiais entram no vagão e tentam efetuar a prisão. O homem resiste e pede para que a operação seja filmada por outros passageiros, explicando que estava apenas dormindo. Logo, mais policiais chegam e conseguem paralisá-lo de forma violenta, levando-o à delegacia. O motivo alegado pelo departamento de polícia é que ele estava ocupando mais de um assento, o que configuraria um crime na cidade.
Pelo vídeo é possível notar que o trem está praticamente vazio.
Confira:
Infelizmente, os assassinatos recentes de negros não são novidades nas ações policiais pelos Estados Unidos.
Em 1991, a polícia de Los Angeles espancou Rodney King, um taxista negro, parado sob a acusação de dirigir em alta velocidade. As agressões foram filmadas. No ano seguinte, um júri inocentou os agressores, gerando revolta da população. As ruas foram tomadas por uma onda de insatisfação de cidadãos cansados de sofrerem os abusos de uma polícia sectária e racista. Foram seis dias de tumultos, provocando 53 mortes.
Protesto em 1992 nos EUA
Em 2012, mais um caso de impunidade gerou manifestações por todo o país. Trayvon Martin, 17, foi assassinado a tiros por George Zimmerman, segurança de um condomínio onde o jovem estava hospedado, na Flórida. Zimmerman foi inocentado de culpa pelo júri da Califórnia, que considerou a ação como legítima defesa. Novamente, o povo protestou violentamente exigindo justiça no caso.
Protesto em 2012 nos EUA
Os fatos recentes envolvem o abuso de poder das polícias norte-americanas e o direcionamento da violência aos cidadãos negros e pobres e às comunidades periféricas. Uma triste coincidência com a Polícia Militar no Brasil, que também possui alvos definidos e utiliza a violência de forma arbitrária e desproporcional.
Dados recentes da Secretaria de Segurança Pública paulista mostram que a PM de São Paulo matou mais em cinco anos do que todas as polícias norte-americanas juntas. Para muitos, os números devem ter soado como o retrato de uma polícia decente nos EUA. Fatos como estes mostram que o racismo e a violência estão institucionalizadas dos EUA ao Brasil, e por todo o planeta.
Por Thiago Gabriel, Revista Vaidapé.