Correio da Cidadania

Petro supera a tempestade

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Gustavo Petro toma posse como primeiro presidente de esquerda da Colômbia –  Mundo – CartaCapital
Juan Barreto / AFP

Diversos fatos relativamente recentes mostram que o governo presidido e dirigido por Gustavo Petro parece ter começado a superar os obstáculos que a oligarquia e a classe política tradicional impuseram durante os dois primeiros anos de sua administração. Essas barreiras e armadilhas foram a concretização da política de bloqueio institucional, guerra jurídica e cerco informativo, que faziam parte do que o presidente chamou de “golpe brando”.

As crises, apagões e catástrofes que a oposição previu ficaram apenas nos anúncios e alertas frustrados. Desde o desabastecimento de medicamentos até o colapso financeiro e material do sistema energético, passando pela suposta crise do setor de saúde e da emissão de passaportes, tudo acabou sendo desmentido pela realidade. Toda a estratégia para criar pânico e gerar um clima de incerteza parece entrar em fase de esgotamento.

Da mesma forma, outros desastres que os inimigos imaginaram ou desejaram não se concretizaram. A greve dos transportadores foi enfrentada e resolvida com certa rapidez e oportunidade, a COP 16 foi realizada em Cali sem maiores problemas e em um clima de tranquilidade, e a gestão econômica começa a mostrar resultados positivos em algumas áreas produtivas, como a agricultura, enquanto a inflação está em queda e o desemprego permanece controlado. Além disso, contra todas as previsões, o trâmite legislativo das reformas sociais avança no Congresso.

Agora que Donald Trump foi reeleito presidente dos EUA, o novo desejo e anúncio catastrófico é o de um confronto com o governo de Petro. Alguns setores da extrema direita e analistas a seu serviço preveem a intervenção do governo dos EUA na Venezuela e, consequentemente, o rompimento das relações diplomáticas entre os dois países. Esse é o novo pânico utilizado para criar incerteza e pessimismo.

Por outro lado, é inegável que o desempenho de alguns ministérios melhorou substancialmente, e começam a aparecer resultados importantes (agricultura, comunicações, minas e energia, interior, etc.). Da mesma forma, a gestão de funcionários como Carlos Carrillo na UNGRD (Unidade Nacional de Gestão de Riscos de Desastres) e Gustavo Bolívar no DPS (Departamento da Prosperidade Social) demonstra não só aprendizado, mas também que, apesar das diferenças ideológicas, é possível e necessário trabalhar com prefeitos e governadores de todo o país e com setores de todas as tendências políticas.

Enquanto isso, alguns setores minoritários da esquerda, que se apresentam como “radicais” e “nacionalistas”, acusam Petro de “ser a continuidade do neoliberalismo” e “instrumento do império estadunidense para derrotar a insurgência armada”. Tais críticas surgem porque o governo progressista realizou o ajuste no Fundo de Estabilização dos Combustíveis e aumentou o preço da gasolina e do diesel e, além disso, teve que reduzir o orçamento nacional devido a decisões da Corte Constitucional (impostos sobre royalties). Além disso, foi forçado a intervir com as Forças Armadas no Cañón del Micay (ver aqui).

O que esses colegas não entendem é que a continuidade neoliberal não depende da vontade do governante. É uma questão de correlação de forças. Quando os setores democráticos e populares não acumularam uma força significativa e majoritária para promover uma ruptura estrutural, qualquer tentativa prematura nesse sentido resulta em desgaste para o governo e para os próprios setores democráticos e populares. Isso é comprovável.

Está claro que, com uma pequena vantagem eleitoral e com um movimento social fraco, burocratizado e dividido, com alguns setores sociais ainda instrumentalizados pela “polícia rural a serviço dos narcotraficantes” disfarçada de insurgência, não é possível realizar uma “revolução antineoliberal” apenas a partir do governo. Essa crença é fruto da persistência dos “sonhos insurrecionais” ainda presentes na mente de alguns líderes, que, se postos em prática, se tornariam aventuras insignificantes e tentativas fracassadas. Isso é o que precisa ser revisado.

As experiências da Venezuela, Equador e Bolívia demonstram que a pressa só leva ao cansaço. Nesses países, os governos socialistas tentaram superar o neoliberalismo e não conseguiram. E isso mesmo contando com mais força eleitoral, social e político-organizativa em comparação com a Colômbia. Além disso, tinham em mãos recursos econômicos significativos resultantes da bonança dos preços das commodities durante a primeira década do século 21.

Toda essa experiência deve ser estudada em detalhe para extrair lições que ajudem a replanejar a estratégia. A questão a ser resolvida é: como acumular força social e política em meio a um exercício governamental alternativo e de caráter popular? Como fortalecer os movimentos sociais sem cooptar seus líderes nesse processo? Como governar para toda a sociedade e conquistar outros setores sociais e econômicos, como as “classes médias”, pequenos e médios empresários e produtores, profissionais precarizados e alguns setores da burguesia emergente, que têm contradições reais com a oligarquia financeira e o império estadunidense? Essas e outras perguntas precisam ser respondidas.

Agora que o governo progressista começa a respirar e pode tranquilamente passar para uma fase de ofensiva tática e estratégica, é necessário levantar esse tipo de questionamento para não cair em triunfalismos infantis que sempre conduzem à aventura, à arrogância sectária e à autoderrota. Os avanços e conquistas relativas obtidos com o PDA (Polo Democrático Alternativo, partido de Petro), que foram muito mal administrados por seus dirigentes, são antecedentes a serem considerados para manter a unidade do Pacto Histórico e avançar com consistência nesta etapa de acumulação de forças.

Um governo progressista firme, mas prudente, somado a um movimento social autônomo e independente, parece ser a fórmula para avançar com consistência. Claro, sem ilusões vãs e sem voluntarismos aventureiros.

Fernando Dorado é ativista social, dirigente sindical de trabalhadores do setor de saúde e eletromecânicos. Colabora com movimentos sociais do Vale do Cauca, Colômbia. Deputado entre 1994-1997.
Traduzido por Gabriel Brito, editor do Correio da Cidadania.

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