Correio da Cidadania

EUA e Israel: unidos pelo regime liberal e o genocídio

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O Liberalismo é uma ideologia forjada por uma nobreza mercantil no século XVII, na Inglaterra e na Holanda, não tardando a ser disseminada nas treze colônias britânicas da América. O ideário liberal, que tomou a forma mais bem acabada com o filósofo inglês John Locke, no final do século XVIII, apregoa a defesa da propriedade, da escravidão, do individualismo, do segregacionismo, da supremacia racial branca anglo-saxã protestante, do elitismo, do autoritarismo e do utilitarismo.

 

O regime liberal dos EUA passou a ser considerado um governo democrático apenas quando o pensador liberal francês Alexis de Tocqueville escreveu A Democracia na América, por volta de 1832. Ele também foi o primeiro intelectual a defender abertamente o extermínio de populações árabes, quando a França invadiu e ocupou a Argélia em 1830.

 

Os EUA nasceram, no entanto, em 4 de julho de 1776, por meio de um fronda de senhores de escravos contra o Reino Unido que buscavam garantir o direito de exterminar os índios para roubar-lhes as terras e de escravizar os negros oriundos da África. Uma vez vencida a guerra de independência contra os britânicos, em 1781, os EUA passaram a ser governados por uma ditadura militar de facto, que, por meio de um golpe de Estado da Convenção Constitucional, estabeleceu a ditadura do general George Washington, visando esmagar as revoltas populares contra o pagamento dos pesados impostos que incidiam sobre a população mais pobre e exterminar tribos indígenas que haviam se aliado à Inglaterra durante o processo de emancipação.

 

Além de ter nascido por meio de frondas, golpes de Estado e ditadura militar – que serviram de inspiração para o despotismo de Napoleão Bonaparte na França, profundo admirador do regime militar de George Washington e do presidencialismo imperial existente na jovem nação ianque –, os EUA, com uma economia assentada na mão-de-obra escrava, se constituíram como um dos primeiros Estados raciais da História, isto é, onde o racismo e o segregacionismo racial eram leis.

 

Até o início da segunda metade do século XX, era comum negros (homens, mulheres, crianças e idosos) serem linchados e queimados vivos em locais públicos nos EUA, especialmente no sul do país, para divertimento de famílias brancas. Muitos destes negros eram enforcados em árvores, permanecendo pendurados por dias. A cantora negra Billie Holiday compôs uma bela e triste canção denunciando as “estranhas frutas” penduradas nas árvores do sul dos EUA. Estranhas frutas do ódio racial imposto legalmente por um Estado liberal, a “democracia dos senhores brancos de escravos”.

 

Toda esta violência racial convivia harmoniosamente com a convocação regular de eleições para os legislativos e executivos estaduais e federal, sem qualquer interrupção desde 1789. Esta é natureza do regime liberal, o estabelecimento de um Estado policial permanente contra as populações pobres e de etnias diferentes daquelas da classe de proprietários, ao lado de um sistema representativo de poder, com eleições regulares.

 

Hoje, o regime liberal dos EUA permite “eleger” um presidente negro (ou quase) ao mesmo tempo em que mantém mais de 2,5 milhões de jovens negros nas cadeias em todo o país. Outros milhares de negros são assassinados nas grandes cidades dos EUA por causa de disputas de gangs, consumo de drogas, sistema de saúde falido e repressão policial.

 

Por este motivo, não podemos estranhar a aliança quase carnal dos EUA com Israel. Suas histórias se confundem e se fundem. Não se trata apenas de uma aliança que é regida por um poderoso lobby, trata-se de um desdobramento quase natural do reconhecimento de uma nação fundamentada no ódio racial e na alienação de terras de povos autóctones a outra nação forjada sob as mesmas bases coloniais, racistas e segregacionistas.

 

Agora, desde o início de julho de 2014, em mais um capítulo de sua história de crimes contra a Humanidade, Israel bombardeia a Faixa de Gaza, exterminando mais de 1800 palestinos, sem que este território possa oferecer qualquer forma de defesa efetiva. O massacre começou dias após “colonos” sionistas assassinarem uma criança palestina na Cisjordânia, queimando-a viva em suposta vingança pelo assassinato de três jovens “colonos” sionistas, de autoria desconhecida até o presente momento. Trata-se, como visto, de uma lamentável repetição dos linchamentos de negros e chineses nos EUA ao longo do século XX.

 

Não faltarão pensadores, até mesmo entre ditos esquerdistas, que dirão que, apesar de toda forma de violência ser promovida contra os palestinos, Israel é uma “democracia vibrante” porque há eleições regulares, partidos esquerdistas legalizados (inclusive o “comunista”), justiça supostamente independente e uma sociedade civil com ampla liberdade de expressão. Só podemos afirmar que quem faz este tipo de declaração, colocando a “liberdade” em termos abstratos acima do direito à vida, está propenso a aceitar e a perpetrar os piores crimes contra a Humanidade.

 

Na verdade, esta declaração é a verdadeira essência genocida do Liberalismo – a ideologia do capitalismo –, que segue sendo, após mais de 350 anos de existência, o maior inimigo da Humanidade.

 

 

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Ramez Philippe Maalouf é mestre e doutorando em Geografia Humana pela USP.

 


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