A viagem de Dilma aos Estados Unidos
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- Virgilio Arraes
- 17/07/2015
O primeiro semestre de 2015 registrou uma situação singular na história recente do país: índices de impopularidade inauditos para uma dirigente ainda nos primeiros momentos de um mandato, atribuídos às apurações de denúncias de larga malversação de recursos públicos, com abrangência a membros de dois poderes, e, em especial, à elevação da inflação conjugada com uma recessão, originada de maneira parcial na indevida aposta de longa estabilidade dos preços de produtos primários exportados.
Como desdobramento também incomum do extemporâneo desmoronamento sociopolítico, o PT aceitou tornar-se acólito, ainda que com lamentos esparsos, do PMDB, de sorte que uma coabitação involuntária, mas necessária, se estabeleceu no Palácio do Planalto, com o propósito de assegurar a sobrevivência no dia a dia.
Assim, a partir da atual articulação, as negociações com o Congresso deslizaram para as mãos da vice-presidência, de forma que refletisse o novo equilíbrio entre as duas tensas agremiações à frente do Executivo há dois pleitos.
O primeiro sinal notório da perda de maior autonomia na presidência da República para Dilma Rousseff havia sido a entrega da condução da economia a um ministro desvinculado do trabalhismo logo na transição de uma gestão à outra, com a finalidade de desemborcar a administração anterior, supostamente enfronhada na heterodoxia, mas já bastante distante na realidade de uma postura progressista.
Diante das duas transferências reais de poder, a presidente se transformou, de modo simbólico, de chefe de governo em representante do Estado, o que faculta a ela o desempenho de funções diplomáticas com tempo e, por que não, até com maior empenho que na sua primeira administração.
Destarte, é provável a possibilidade de deslocamentos ao exterior com mais frequência, haja vista a oportunidade de se apresentarem à comunidade internacional os pontos positivos do país, sem desconsiderar às vistas do decadente trabalhismo brasileiro a existência de boa parte deles ao suposto virtuosismo dos últimos quatro governos.
Na ótica presidencial, isso tudo teria sido materializado em uma sociedade tornada uma das grandes exportadoras globais, com uma classe média cada vez mais bem estabelecida e com visibilidade planetária, ao sediar de maneira sucessiva dois importantes eventos esportivos: Copa do Mundo em 2014 e Olimpíadas em 2016.
Quase dois anos de atraso se observada a programação original, Rousseff retribuiu a visita de Barack Obama ao Brasil, ocorrida em março de 2011. Curiosamente, a situação da mandatária era bem diferente naquele momento, dado que havia muito otimismo, ainda mais após um crescimento superior a 7% em 2010.
A Petrobras era a menina dos olhos do Planalto, em função da sua capacidade de investimento e do entusiasmo com a prospecção da área do chamado pré-sal. A magnitude da própria empresa seria atestada pelas acusações ao governo norte-americano de espioná-la, o que concorreria para a suspensão do deslocamento da governante a Washington no segundo semestre de 2013.
Na recente viagem, ela se limitou na prática a ser uma caixeira viajante, ao buscar a atenção de investidores estadunidenses para a aplicação de recursos no desenvolvimento da combalida infraestrutura brasileira.
Por fim, a ida à Universidade Stamford, uma das principais do mundo, e a uma unidade da Agência Nacional da Aeronáutica e do Espaço (NASA) poderia contribuir para a presidência refletir sobre o quão inconsequente ele havia sido no início do corrente ano, ao anunciar ser o país a pátria da educação.
Se houvesse hesitação de monta quanto a isto, bastaria ao Planalto conhecer as instituições similares brasileiras, muitas das quais em greve há semanas por ansiar condições de trabalho mais adequadas.
Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.