Brasil-Estados Unidos – receio da militarização na fronteira
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- Virgilio Arraes
- 29/07/2016
Os Estados Unidos costumam avaliar o peso de seus aliados estratégicos ou ao menos preferenciais por segmento. Na América do Sul, no quesito castrense, figura a Colômbia desde os anos 50 do século passado; no comercial, o neoliberal Chile; no turístico, o Brasil, malgrado naquela época a crescente valorização da moeda local – mesmo assim, 600 mil cidadãos visitaram o território brasileiro - http://www.brasil.gov.br/turismo/2011/04/numero-de-turistas-estrangeiros-no-brasil-cresce-7-8-em-2010 .
Em 2009, somente menos de quinze milhões de norte-americanos deslocaram-se ao exterior, tendo os países sul-americanos acolhido cerca de 9% apenas - http://www.huffingtonpost.com/william-d-chalmers/the-great-american-passpo_b_1920287.html.
A despeito da boa convivência no turismo, houve um importante ponto de discórdia no setor militar no segundo semestre daquele ano, ainda que não fosse conectada de maneira direta com o relacionamento bilateral.
A questão vinculava-se à suposta ampliação dos contingentes estadunidenses em território colombiano, de modo mais específico com atuação possível a partir de três bases da Aeronáutica – Palanquero, Apiay, localizadas no centro, e Malambo, situada no norte, próxima do Atlântico – duas da Marinha – Bahía Málaga e Cartagena - e duas do Exército – Caquetá, ao sul.
Destarte, não se contemplava a hipótese de edificar uma própria para a utilização dos Estados Unidos. O motivo oficial para maior presença na Colômbia havia decorrido da saída das tropas de Manta, no Equador, em julho.
Havia a hipótese de que este lugar teria sido empregado por Washington para auxiliar Bogotá no combate à guerrilha, especialmente a das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC-EP) - através do envio de informações sobre seus deslocamentos.
Em suma, a narrativa oficial para a Casa Branca seria a execução de um remanejamento, algo de que discordava o Planalto até em decorrência do receio do impacto na região amazônica – a militarização em grau mais amplo.
A justificativa tradicional para a eventual vinda de mais efetivos ligava-se, entre outros assuntos, à necessidade de combate ao narcotráfico, auxílio humanitário e terrorismo, alçado a partir do atentado de setembro de 2001 à categoria de tema inquestionável.
Desde um entendimento de 2004 entre os dois países, oitocentos militares e seiscentos civis poderiam colaborar com as forças armadas locais. Todavia, de acordo com o Departamento de Estado, o número máximo nunca teria sido aplicado - http://www.state.gov/r/pa/prs/ps/2009/aug/128021.htm
Não obstante, outro governo preocupava-se com a proximidade colombo-americana, a Venezuela de Hugo Chávez, receosa de que isso pudesse levar a uma confrontação no continente. A Bolívia também se manifestou de forma negativa, ao afirmar que a guerrilha na Colômbia seria mero pretexto para a presença dos Estados Unidos.
Por fim, temia-se nova disputa armamentista entre países bolivarianos e filoestadunidenses, haja vista a desigualdade de gastos entre Caracas e Bogotá, por exemplo. Apesar da tensão, ela não se consumou até por influência dos efeitos da crise global.
Naquela altura, faltava interlocução política da Casa Branca na correta visão do Planalto com o restante do continente, dado que havia uma transição no Departamento de Estado: Arturo Valenzuela substituiria Thomas Shannon na Secretária de Assuntos do Hemisfério Ocidental, o qual, por sua vez, iria ser o titular da Embaixada dos Estados Unidos junto ao Brasil.
No início de julho, os dois diplomatas compareceram à Comissão de Relações Exteriores do Senado, porém somente tomariam posse em seus cargos no final do ano – de forma respectiva, novembro e dezembro, ainda que no caso de Shannon ele se apresentasse ao presidente Lula da Silva apenas em fevereiro de 2010.
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Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e é professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.