Estados Unidos e Brasil: apreciações políticas desiguais
- Detalhes
- Virgílio Arraes
- 12/06/2018
Diferentemente de Lula da Silva em duas gestões (2003-2010), adepto animado da denominada diplomacia presidencial, Dilma Rousseff não demonstrou interesse maior por política externa. No entanto, ela não podia furtar-se a subscrever determinados compromissos da área, entre os quais os relacionados com os Estados Unidos.
Em maio de 2013, a Casa Branca desejava do Planalto aproximação comercial, em especial no segmento militar, esportivo e educacional. A visita do vice-presidente Joe Biden, ainda que de curta duração, ao país reiterava isso.
No campo político, Washington diferenciava Brasília quando comparada a Caracas, por tentar conciliar democracia e desenvolvimento com êxito. Os programas sociais nacionais eram analisados por outrem e implementados do Caribe até a África - http://www.presidency.ucsb.edu/ws/index.php?pid=121045. Por conseguinte, segundo a visão do dignitário estadunidense, o país seria um exemplo para o globo.
A despeito das palavras amistosas e entusiasmadas do mandatário norte-americano, como requer o protocolo diplomático tradicional, sobre o status quo nacional, a economia brasileira patinhava: a inflação, considerados doze meses, situava-se próxima do teto fixado, quase 6%, e o dólar iniciaria sua valorização acelerada – ao cabo de 2013, sua alta seria de quinze por cento.
Em sendo assim, a menina dos olhos da presidente Dilma, a taxa de juros Selic, não se manteria em patamar menos elevado, conforme ela de modo correto aspirava. Na casa dos 7% no começo daquele ano, ela chegaria a 10% ao final - https://www.bcb.gov.br/Pec/Copom/Port/taxaSelic.asp.
Além disso, enquanto os Estados Unidos falavam em parcerias comerciais futuras, a China, mais dinâmica, prometia auxílio para os governos sul-americanos, via investimentos ou empréstimos. Ao passo que o vice-presidente fez curto deslocamento ao continente – apenas três nações – o presidente Xi Jinping encontrou-se com vários dirigentes da região uma semana após a viagem de Biden.
Entre os principais países ibero-americanos, a atenção maior de Washington voltava-se em ordem de preferência para México, com quem compartilha fronteira tortuosa, e Brasil. Entre estes e a politicamente distante Venezuela, localizava-se a hesitante Argentina. Com Colômbia e Chile, o relacionamento era estável. Desta feita, havia boas oportunidades para investidas chinesas no restante do território.
De toda maneira, ainda repercutia em solo pátrio a repercussão das denúncias de espionagem por parte do governo norte-americano à comunidade mundial. Oficializadas por ex-funcionário da Agência Nacional de Segurança - Edward Snowden, residente nos dias atuais na Rússia - Washington embaraçava-se para explicar a acusação e, por conseguinte, refutá-la.
Grandes potências supervisionam com zelo as atividades da sociedade internacional, quer governamentais, que particulares, mesmo as de seus aliados, independentemente do porte econômico ou militar ou da proximidade momentânea ou histórica. O constrangimento maior à Casa Branca foi ter sido denunciada por cidadão seu, não agente russo ou chinês, por exemplo.
Desde o atentado terrorista de setembro de 2001, questões vinculadas ao valor dos direitos humanos ou até da privacidade reduziram-se em função da invocação da prioridade de segurança nacional.
Queixar-se da postura de Washington era medida correta de Brasília, porém sem tomar medidas reais para proteger mais os dados de seus próprios habitantes seria apenas retórica diplomática, a esfumaçar-se em breve no acúmulo de notícias diárias das agências governamentais ou dos portais privados.
Leia mais colunas do autor
Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.