Correio da Cidadania

Guerra da Ucrânia: hora de diplomacia

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Foto: Kremlin / Commons Wikimedia

A expectativa da sociedade internacional seria o 9 de maio próximo, efeméride de celebração de vitória da antiga União Soviética sobre a Alemanha nazista em 1945, assinalar no mínimo a interrupção do conflito de Moscou contra Kiev, cujo início ocorreu em 24 de fevereiro último.

No esperado dia, a Rússia comemoraria o eventual êxito marcial, embora o noticiário global registre circunstância bastante distinta do quadro a ser aclamado pelo Kremlin, visto que o avanço das tropas tem ocorrido de modo lento.    

No entanto, este propósito já teria sido alterado pelo governo moscovita à proporção que a data vindoura iria cunhar não o tão aguardado cessar-fogo, sob alardeio de sucesso, porém o começo oficial da confrontação bilateral, ao encerrar a considerada fase de operações especiais, direcionadas desde os primórdios a conter a extrema direita em solo ucraniano, em especial em Mariupol, até há pouco tempo cenário de intensos combates.  

Sem sombra de dúvida, desentendimentos entre países não se desdobram por causa única apenas. No caso, influência econômica em decorrência da circulação de fonte energética fundamental para a Europa ocidental como o gás natural ou também política para Vladimir Putin como obtenção de prestígio interno diante do desgaste junto à população depois de mais de duas décadas à frente do poder.

A futura declaração de guerra pelo Kremlin, negada após intensa divulgação nos meios de comunicação, significaria elevar em curto prazo a escala da movimentação em território adversário e, por conseguinte, ampliar os custos da investida, em momento de dificuldade econômica extrema por conta das inúmeras medidas de retaliação dos países euro-americanos, sem esquecer o aumento de feridos, mortos e refugiados.

Uma consequência inesperada da invasão para Moscou tem sido a recuperação do status do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, muito desgastado internamente até o alvorecer do ataque, contudo em ascensão em virtude da tenaz resistência pessoal diante do assalto russo – apesar do convite estadunidense para refugiar-se no exterior, ele optou por permanecer e de imediato solicitaria auxílio castrense ao arco norte-atlântico.

Fortalece-o bastante a visibilidade propiciada por incessantes contatos com dirigentes ou parlamentos, a ponto de receber em Kiev o próprio primeiro-ministro britânico Boris Johnson, entusiasta do auxílio militar ao país invadido, ou o titular do Departamento de Estado norte-americano, Antony Blinken, ele mesmo neto de ucranianos.

Distante do tom belicoso de parcela de vizinhos, a Santa Sé tem reiterado a via diplomática, sem afetar o tom de firmeza na interlocução do tema: em meados de março, o papa Francisco admoestou o patriarca de Moscou Cirilo sobre seu apoio à ação do Kremlin.

O pontífice expressou a preocupação de que sua contraparte não se tornasse mero ‘coroinha de Putin’, por causa desse posicionamento incomum. A declaração papal geraria queixa pública do patriarcado em vista do tom adotado.

No entanto, a proximidade entre Estado e Igreja na Rússia é tão evidente, a ponto de a Comissão Europeia, presidida por Ursula von der Leyen, avaliar a inclusão da máxima autoridade religiosa daquele país na próxima lista de pessoas conectadas com o governo russo a sofrer variadas sanções – de congelamento de bens a proibição de viajar ao território de seus membros.

Antes que o 9 de maio acarrete a manutenção da guerra ou mesmo sua ampliação, a Santa Sé poderia ofertar os bons serviços aos contendores, de forma que se contrapusesse aos esforços belicistas dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha.

 

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Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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