Guerra da Ucrânia: a conexão entre Rússia e China
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- Virgílio Arraes
- 27/09/2022
Continuam a circular notícias de que as forças russas recuam perante a contraofensiva ucraniana, apoiada por armamentos norte-americanos de alto grau de sofisticação – drones, por exemplo, e misseis de alcance médio. Complementam o auxílio em escala menor aos efetivos países como Grã-Bretanha, recém-enlutada.
Diante do êxito bélico, Kiev solicita a Washington armas de maior alcance, pedido ignorado até o momento pela Casa Branca, receosa de que caso atenda o pleito, a reação do Kremlin poderá ser desproporcional, ao contemplar até o inédito emprego de expediente atômico em solo europeu.
Sem desconsiderar a resposta castrense, a Rússia deve, na prática, acelerar o processo de modificação de cidadania dos moradores dos locais em disputa, ao adotar plebiscitos sem concordância da Ucrânia ou supervisão de organismos internacionais.
De modo paralelo, os dois contendores trocam acusações mútuas sobre a responsabilidade por bombardeios incessantes ao redor da usina de Zaporíjia, a maior da Europa, complexo oriundo do período da União Soviética (URSS). Estariam as cercanias preservadas por um triz.
Embora a edificação em si seja bastante fortificada, seus arredores não teriam o mesmo grau de proteção, de sorte que os reatores poderiam ser danificados, se o sistema de refrigeração não for mantido de forma adequada. A presente situação traz à tona a trágica memória do desastre de Chernobyl, ocorrido nos anos 80, e vívido na sociedade.
A Ucrânia é a segunda consumidora de energia nuclear do continente, ao ser superada apenas pela França. Conquanto seja primordial a desativação provisória da usina, por outro, a população local fica à mercê da sua própria sorte, ao não poder usufruir de infraestrutura básica como calefação ou telecomunicações. Ao mesmo tempo, atividades industriais ou agrícolas, das quais a sociedade depende tanto, inviabilizam-se no curto prazo.
Com a vinda do outono ao cabo de setembro, o leste europeu aguarda chuvas constantes e naturalmente gradativa redução da temperatura, momento a partir do qual se acrescenta maior preocupação e drama aos milhões de habitantes da nação invadida, já em situação muito delicada desde os últimos dias de fevereiro, porque o governo terá ainda mais dificuldades de suprir serviços mínimos como os de saúde e de educação.
Apesar dos inúmeros percalços, a Ucrânia tem obtido apoio maciço do Ocidente, diferente da Rússia, bem isolada no sistema internacional, como demonstra a insatisfação pública de países como a França em manifestação (20 de setembro) no proscênio da assembleia geral da Organização das Nações Unidas (ONU), ao acusar o Kremlin de solapar a paz e, por conseguinte, de ostentar o neoimperialismo - https://www.nytimes.com/live/2022/09/20/world/united-nations-general-assembly
Dada a continuidade da confrontação e por extensão da aplicação de sanções incisivas pelo arco norte-atlântico, Moscou necessita hoje da colaboração política e, em especial, do auxílio financeiro de Pequim e de Nova Deli, ávidos compradores de petróleo, recompensados, por sua vez, por dadivosos descontos pela parceria temporária.
Concernente à China, a Rússia conecta-se também de maneira militar, ao realizar exercícios conjuntos, ainda que ao desagrado dos Estados Unidos. A despeito das diferenças da constituição da soberania da Ucrânia (1991) e de Formosa (1949), Pequim observa com atenção o desdobrar da questão na Europa, por ser-lhe valioso precedente para sua hipotética reconfiguração territorial.
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Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.