Guerra da Ucrânia: deslocamento dos campos de combate
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- Virgílio Arraes
- 22/12/2022
Com o encerramento da Copa do Mundo no Catar, momento de destaque da Argentina ao superar nos pênaltis a França, a atenção das sociedades do arco norte-atlântico deve deslocar-se de novo para o confronto russo-ucraniano, alentado por constantes investidas do Kremlin não só à tropa inimiga, porém à infraestrutura do combalido país.
Com o inverno consolidado no leste do continente, Moscou concentra sua atuação militar na destruição das usinas de energia de diversos municípios, ao incluir até Kiev, a capital. Embora os ataques a determinados alvos civis tenham sido estruturados a datar de outubro, seus efeitos negativos intensificaram-se de modo recente, em decorrência da mudança de temperatura – o sistema de calefação, por exemplo, será prejudicado.
Com o incomum recuo dos efetivos das áreas assaltadas desde a última semana de fevereiro no território vizinho, por conta da perda do controle de cidades de importância como Kherson, a Rússia adotou tática diferente com o propósito de poupar seus contingentes, agastados pelo ritmo desfavorável do andamento da invasão, apesar da ufania da proclamação da incorporação de quatro regiões a sua soberania em setembro.
Necessários, os reparos imediatos aos serviços públicos nem sempre são possíveis ao corpo técnico kievita, de forma que o objetivo do inimigo moscovita com relação à devastação efetuada é abalar ainda mais o moral da população diante da crescente condição prejudicial no cotidiano em quase um ano de guerra.
Aos dois contendores, ampliam-se os custos financeiros das escaramuças; na parte ucraniana, eles são minorados por causa da assistência ocidental, em especial da anglo-americana, mesmo circunscrita em sua maioria a equipamentos bélicos.
A despeito do auxílio, o produto interno bruto (PIB) deve encolher quase um terço consoante avaliação recente do Fundo Monetário Internacional (FMI), bem distante do estimado do agressor – algo próximo de três pontos e meio - https://www.imf.org/en/Countries/UKR; https://www.imf.org/en/Countries/RUS
Em vista de quadro socioeconômico muito adverso, pressiona Mariyinsky seus aliados, a Casa Branca, em especial, a alargar a ajuda na quantia - situada na faixa dos vinte bilhões de dólares em 2022 – e no escopo, conquanto a contrariedade de vários parlamentares da agremiação republicana, céticos de resultados benéficos mútuos.
No olhar dos representantes da oposição ao governo de Joe Biden, a continuidade da disputa contribui para dificultar a recuperação econômica da América do Norte e da União Europeia (UE) – a inflação em nações como Grã-Bretanha e Alemanha supera os dois dígitos anuais, malgrado a cotação do petróleo estar em queda, com pequenas variações, a datar de junho - https://www.eia.gov/dnav/pet/hist/LeafHandler.ashx?n=pet&s=rwtc&f=w
Mesmo assim, aguarda o presidente Volodymyr Zelensky socorro social de Joe Biden, ao prover a seu povo programa de renda mínima em torno de cinquenta dólares mensais por habitante, segundo o Washington Post. Com população estimada pouco acima de quarenta milhões, inclusa a parcela de ascendência russa, o benefício custaria cerca de dois bilhões de dólares mensais – https://www.washingtonpost.com/world/2022/12/15/ukraine-economy-russia-war-crisis/
Diminuída a confrontação castrense direta, ao menos de maneira temporária, até em função do inverno, inquietam-se os dirigentes europeus com a possibilidade de Vladimir Putin destroçar a infraestrutura civil e, por conseguinte, pressionar os países vizinhos a acolher milhões de refugiados nos próximos meses – o abrigo em si não seria novidade, porém o ocasional aumento do número de famílias deslocadas, sim.
Desta sorte, a Rússia incorporaria ainda mais ao conflito os membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) sem precisar valer-se de munição convencional. Restaria saber como seria o posicionamento dos Estados Unidos diante deste desdobramento da inglória guerra.
Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.