Correio da Cidadania

Estados Unidos: a corrosão da força política

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Imagem: Pentágono

Nas últimas semanas, observaram-se nos Estados Unidos dois singulares acontecimentos para a única superpotência do século 21 até agora.

O primeiro foi o balão da China a vagar pelos seus céus por vários dias. Segundo Pequim, o aeróstato nem seria de vigilância castrense, mas de monitoramento climático, nem se dirigiria àquele país, fato derivado de condições meteorológicas adversas, porém deveria sobrevoar área do Pacífico ocidental.

O segundo foi a revelação em rede social de documentação confidencial relativa à Guerra da Ucrânia por cabo da Guarda Nacional Aérea de Massachussetts, o qual trabalhava no setor de defesa cibernética.

A reação ante os dois eventos corrosivos seria, contudo, célere: abate da aeronave, apesar de protestos do governo chinês, e prisão do militar, passível de condenação, depois do devido processo, de quinze anos.

Coube, após a conclusão da Guerra Fria, a políticos de extração socialista do outro lado do Atlântico Norte classificar o inconteste poderio norte-americano de maneira sintética: hiperpotência por Hubert Védrine, ministro das Relações Exteriores de Jacques Chirac, e potência de postura unilateral por Lionel Jospin, primeiro-ministro da França - https://www.nytimes.com/1999/01/07/world/french-premier-assails-us-over-iraq-air-strikes.html

O exercício cotidiano da superioridade estadunidense no cenário internacional manifestava-se de modo inadequado perante o direito. Para tanto, evoquem-se exemplos vívidos na memória da opinião pública ao redor do planeta, assinalada por duas duradouras confrontações na Ásia: a do Afeganistão, embora chancelada pela Organização das Nações Unidas (ONU) diante dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, marcada pela descoberta de tratamento deplorável à parcela de prisioneiros; a do Iraque – conhecida como II Guerra do Golfo – ocorrida logo depois sob alegação da existência de armas de destruição em massa (ADMs), jamais localizadas pela coligação liderada pela Casa Branca.

No século passado, ao encerrarem-se dois confrontos de extensão mundial, governos reuniam-se com o propósito de arquitetar nova ordem, ainda que sem ouro-fio entre vencedores e perdedores: Versalhes, França, em 1919 ou Potsdam, Alemanha, em 1945.

Com o encerramento da rivalidade amero-russa, não haveria medida similar, por opção expressa de Washington, desejoso de implementar o ideário democrata neoliberal como vagalhão, ou seja, o quanto possível.

Em plano secundário, permaneceriam pontos relevantes para a sociedade como a preservação do meio ambiente e a redução do arsenal atômico em países detentores de ogivas e suas quantidades. Nenhuma delas mereceu a atenção necessária até os dias atuais; ao contrário, há a piora na lide dessas questões: amplia-se o aquecimento global e aumenta-se o número de nações nuclearizadas.

Chegam os Estados Unidos ao presente momento com autoridade desgastada por equívocos na tarefa de assegurar a estabilidade na globalização, quer pela diplomacia, quer pelas forças armadas, e, portanto, com prestígio diminuído, haja vista a ocorrência de duas ações desfavoráveis graves à Casa Branca no intervalo de poucas semanas.

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Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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