Estados Unidos: contornar a China sem confronto
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- Virgílio Arraes
- 05/05/2023
O alvorecer do século vinte e um não traz consigo a paz almejada pela sociedade planetária após três confrontos mundiais na centúria anterior: ao contrário, registra o primeiro ano do segundo milênio ataque inesperado aos Estados Unidos (EUA) em suas cidades mais importantes: na política, Washington; na economia, Nova York.
Como resposta a inimigo a princípio misterioso, ainda que não secreto, o governo estadunidense direcionaria sua retaliação imediata à contraparte afegã, controlada, por sua vez, por segmento fundamentalista: talibã, estruturado no sul da Ásia nos últimos anos da Guerra Fria.
Isolado havia muito no sistema internacional, ao ser reconhecido por apenas três nações naquela altura, o país não granjearia solidariedade, mesmo entre vizinhos; bastante empobrecido, não teria condições, em primeiro vislumbre, de resistir ao poder bélico norte-americano.
Em poucas semanas, a vitória assomaria no horizonte aos olhos do Ocidente; a democracia iria superar a teocracia, embora pela força, não pela negociação. A Casa Branca aparentaria, portanto, ter capacidade suficiente de transformar regime hostil em próximo.
Contudo, o roteiro delineado mais pelo Pentágono, menos pelo Departamento de Estado, iria se alterar de maneira rápida, ao ser executado em solo afegão, de sorte que passaria a promover ao invés de aliança o afastamento das diretrizes delineadas pela coligação norte-atlântica.
A dificuldade de implementar a proposta de modificação política não desestimularia Washington de aventurar-se cerca de 2500 quilômetros de distância de Cabul, ao invadir Bagdá com o propósito de destituir a duradoura ditadura local, também vinculada a ele em tempos idos.
De novo, o fracasso se repetiria, a despeito da diferença de poderio militar. Uma e outra disputa haviam sido formulados por agremiação neoconservadora, situada na órbita do Partido Republicano e por conseguinte muito influente na administração de George Bush Jr.
No momento da rivalidade amero-soviética, parcela do grupo, em especial a de ascendência russo-ucraniana, rodeava em torno do ideário trotskista. À proporção que o conflito bipolar se dissipava, ele ruma para perspectiva conservadora e adapta o conceito de revolução contínua para implementar capitalismo contemporâneo, ou seja, o da democracia neoliberal, não comunista.
Dois impasses médio-orientais – Afeganistão e Iraque – contribuiriam para a derrocada republicana na eleição presidencial de 2008, vencida pelo senador Barack Obama, professor de direito constitucional. Conquanto não na intensidade alardeada na campanha como oposição, os democratas reduziriam a atuação castrense nos dois países.
Em 2017, haveria o retorno dos republicanos com Donald Trump, empresário polêmico, cuja pauta em política externa era a de diminuir a presença norte-americana no globo, embora sob perspectiva financeira, ao aludir de modo geral a gastos de trilhões de dólares ao longo de anos com defesa dos aliados – https://www.npr.org/2017/01/20/510629447/watch-live-president-trumps-inauguration-ceremony . Assim, sua gestão, posto que mantivesse tensão com adversários, não desencadearia confrontação nova.
No atual quatriênio presidencial (2021-2024), Joe Biden, antigo vice de Obama, depara-se com uma guerra em execução, a da Ucrânia, e uma em latência, a de Formosa (Taiwan). Suas contendoras, Rússia e China, são potências nucleares e membros fixos do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU).
Referente àquela, Washington pode, caso avalie ser risco de desgaste crescente, afastar-se da desinteligência ucraniana-russa, porém na segunda a imbricação econômica torna-lhe mais difícil adotar mesma medida.
Em um traço, outrora, era essencial a manutenção contínua de fontes de petróleo como a média-oriental; hoje, é a de semicondutores como a formosina. A fim de garantir o acesso a elas, os Estados Unidos não poderão, desta vez, valer-se do embate militar.
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Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.