Correio da Cidadania

EUA: a imprudência da escalada na guerra russo-ucraniana

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Biden recebe Zelensky na Casa Branca: EUA garantem | Internacional
Cerca de quinhentos dias de guerra no leste da Europa sem definição de vitória à vista. De um lado, a Rússia, cuja ambiciosa investida na nação vizinha rumo à anexação parcial resultou até o momento em frustração, período distinto do de 2014, quando da conquista da Crimeia, justificada à população local por ter sido até a década de 60 território seu – a doação em fevereiro de 1954 havia sido providenciada por Nikita Khrushchev.

De outro, a Ucrânia, cuja ajuda da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) tem sido fundamental para resistir aos constantes ataques, porém, não a ponto de expulsar os contingentes – públicos e privados como o controvertido Wagner – do governo agressor.

No século passado, o auxílio direto dos Estados Unidos em conflitos na Europa foi essencial para o desfecho favorável a seus aliados. Contudo, impedidos de ingressar face a face na confrontação em andamento, por conta do incomensurável poderio de retaliação nuclear russo, satisfazem-se eles com o despacho de armamentos sofisticados e cada vez mais de alcance devastador.

Eis o impasse político de Washington com seus associados otanianos, entre os quais Londres e Paris. A participação já não oficiosa do arco norte-atlântico em favor de Kiev não inquieta a maioria dos membros do organismo castrense; no entanto, a elevação do patamar do poderio de destruição de Mariyinsky, sim, embora a princípio temporário.

Na Segunda Guerra Mundial, a utilização de dois artefatos nucleares contra o Japão havia sido invocada para pôr a termo a longa duração dos combates – havia o registro de dezenas de milhões de mortes até 1945 sem contar feridos e deslocados.

Nos dias atuais, o uso de armamento mais destrutivo, conquanto sem ser atômico, não asseguraria o encerramento do enfrentamento russo-ucraniano ou ao menos a suspensão via estabelecimento de cessar-fogo.

Além disso, o envio proposto das chamadas bombas de fragmentação não representaria o sucesso das forças armadas quievitas no teatro de guerra; ao contrário, a entrega sinalizaria ao exército moscovita o malogro do apoio ocidental com o material convencional entregue até agora; no entanto, justificaria ao Kremlin a ‘autorização’ para o emprego também de material bélico similar, caso houvesse reversão séria sua nas lutas.

Proibidas por convenção internacional há década e meia por mais de uma centena de países, tais armas não são proscritas nos três maiores envolvidos na disputa: Washington, Moscou e Kiev, porém, interditadas por Londres, Berlim e Paris.

O temor dos parceiros europeus decorreria do fato de que toda retaliação possível russa chegaria a suas populações civis em primeiro lugar – persiste ainda a lembrança da emblemática questão de Suez na época da Guerra Fria.

Ao sinal da união militar de França, Grã-Bretanha e Israel contra o Egito, em virtude da nacionalização do canal, a União Soviética ameaçou bombardear as capitais dos dois primeiros como forma de dissuadir a continuidade da empreitada bélica. Diante disso, os Estados Unidos se posicionariam a favor da retirada dos efetivos dos três.

Nos dias de hoje, a encruzilhada da rivalidade russo-ucraniana amplia-se e passa a abarcar em tese dezenas de países, se considerado o número total de membros otanianos. Como ao tempo de Suez, cabe à Casa Branca a palavra de escalar ou de conter o andamento do dramático conflito no leste europeu.

Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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