Correio da Cidadania

EUA: a valorização momentânea da classe trabalhadora

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Embora seja o país mais afluente do mundo há gerações, os Estados Unidos não costumam compartilhar a enorme riqueza obtida no dia a dia à classe trabalhadora na proporção da prática do outro lado do Atlântico – outrora, chamada de social-democracia.

Lá, o governo quando comparado com os das nações desenvolvidas assegura menos direitos trabalhistas – a modificação da legislação ocorreu gota a gota durante o período do New Deal, encabeçado pelos democratas, de onde emanou por exemplo a Lei de Relações de Trabalho, de 1935 - https://www.nlrb.gov/guidance/key-reference-materials/national-labor-relations-act .

No correr da gestão do presidente Dwight Eisenhower, republicano, houve a fusão das duas grandes entidades sindicais nacionais: a Federação Americana do Trabalho (AFL, sigla em inglês) e o Congresso de Organizações Industriais (CIO). A união teria em seu nascimento em 1955 acima de quinze milhões de integrantes. Seria pujante até a crise econômica dos anos 70.

Com a ascensão do neoliberalismo, o trabalhismo estadunidense sofreria um de seus mais sérios reveses com a doutrina. No primeiro ano (1981) da administração de Ronald Reagan, também republicano, o governo se oporia às reivindicações da Organização dos Controladores de Tráfego Aéreo (PATCO em inglês), entre as quais redução da carga horária e reajuste das horas diárias.

Sob justificativa de garantia da segurança nacional, a Casa Branca iria demitir de maneira sumária a maioria da categoria e substitui-la de modo provisório por controladores civis aposentados e militares da ativa.

Era o alvorecer do mandato de um dos três membros da base neoliberal da fase derradeira da Guerra Fria: a trinca havia sido constituída com a Grã-Bretanha de Margaret Thatcher, do Partido Conservador, e se consolidaria com a Alemanha de Helmut Kohl, da União Democrata-Cristã.

Cerca de quarenta anos depois, os dois principais postulantes à presidência dos Estados Unidos, Joe Biden e Donald Trump, tiveram de reconhecer a importância do movimento trabalhista, ao visitar Detroit, cidade símbolo da poderosa indústria automotiva. A ida é simbólica, em momento no qual o número de cidadãos pertencentes a entidades laborais tem sido o mais baixo dos últimos decênios - https://www.ilo.org/actrav/pubs/WCMS_875943/lang--en/index.htm  .

Nas semanas recentes, trabalhadores de destacados segmentos da economia como os da hotelaria, de bebidas, de editoras e de entretenimento têm feito paralisações com a expectativa de melhorar suas condições cotidianas. É a primeira grande movimentação sindical no país após o declínio da epidemia do vírus corona.

Na eleição de 2016, o aspirante republicano Trump discursou em busca dos votos de localidades onde a indústria havia sido outrora pujante – sua meta era granjear a simpatia de famílias prejudicadas pela constante concorrência de rivais ultramar como Alemanha, China ou Japão, conquanto ele próprio nutrisse pouca simpatia por sindicatos. Mesmo assim, ganharia em centros como Wisconsin, Michigan e Pensilvânia por estreita margem.

No pleito de 2020, seria a vez do candidato democrata, Biden, sair ao encalce do eleitorado de perfil similar e destarte superar seu adversário, ao derrotá-lo em Michigan e de forma mínima na Pensilvânia e em Wisconsin - https://edition.cnn.com/2023/09/25/politics/trump-biden-michigan-union-voters/index.html .

2024 será disputa à Casa Branca mais realista, menos utópica, desde que mantidos Biden e Trump, já bem conhecidos dos votantes. No momento atual, o desfecho das inúmeras greves poderá prejudicar o democrata, caso não haja melhoras ao movimento trabalhista e se prolongue a ponto de prejudicar o crescimento no curto prazo.

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Virgílio Arraes

Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

Virgílio Arraes
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