EUA: a antecipação da campanha presidencial em 2024
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- Virgílio Arraes
- 15/02/2024
As prévias republicanas de 2024 realizam-se sem entusiasmo visível, uma vez que nenhum postulante importante conseguiu ameaçar a preferência ao nome de Donald Trump, apesar dos seus inúmeros problemas judiciais e das constantes controvertidas declarações, ao ser a última delas relacionada com a política exterior: o grau de envolvimento dos membros no funcionamento da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN).
Trump vale-se da crítica ao organismo castrense para fustigar de forma eleitoral seu único oponente, Joe Biden, implicado no auxílio maciço à Ucrânia com o objetivo de erodir também o poderio da Rússia e, por conseguinte, o do governo de Vladimir Putin, prestes a inteirar um quarto de século no Kremlin.
Uma das justificativas do conflito entre Moscou e Kiev deriva da possibilidade da gestão de Volodymyr Zelensky de compor a aliança militar, malgrado o desagrado público de anos do vizinho nuclearizado e autoritário. Aderiram às fileiras otanianas nos últimos anos países fronteiriços à Rússia como Polônia ou outrora soviéticos como a trinca báltica.
Posta a cifra destinada por Washington à nação agredida, em torno de 75 bilhões de dólares até dezembro de 2023 - https://www.cfr.org/article/how-much-aid-has-us-sent-ukraine-here-are-six-charts - o candidato republicano provoca as administrações europeias, ao aludir à responsabilidade local a própria proteção, ao ampliar de modo gradativo o percentual do produto interno bruto ao menos para 2%, conforme estipulado em 2006, de sorte que a dependência de socorro norte-americano se reduza aos poucos.
Enfim, o comunicado seria a retomada do tradicional posicionamento do isolacionismo, conceito aplicado em essência a assuntos europeus, não globais. Por outro lado, no mês passado, Biden assinou lei relativa à proibição da presidência da República de retirar-se da histórica aliança norte-atlântica sem expressa autorização da maioria do Congresso - https://www.cbc.ca/news/world/congress-trump-proofs-nato-1.7059768.
De maneira paralela, Biden negocia com o Legislativo o envio de mais 60 bilhões de dólares ao governo kievita. Com dois anos de guerra sem perspectiva de fim, muitos parlamentares hesitam em manter a ajuda e assim provocar descontentamento dos votantes dos distritos a que pertencem diante dos problemas imediatos do cotidiano.
Em face do impasse do quadro militar ao leste da Europa, Trump obriga em toda a extensão da palavra Biden a dedicar maior tempo em pleno momento de disputa da Casa Branca a tema pouco afeito ao dia a dia do eleitorado.
Ao mesmo tempo, ele altera o equilíbrio da balança, ao pender sem hesitação para Putin, ao fixar-lhe no horizonte de 2025, ainda que hipotético, o distanciamento dos Estados Unidos da confrontação ucraniano-russa e deste modo desestimular Zelensky, desgastado por denúncias de malversação do orçamento e por ausência de sucesso na recuperação dos territórios invadidos.
Com declarações controvertidas como esta, Trump já se apresenta perante a população como o candidato do Partido Republicano, não como aspirante da agremiação, e tenta colocar seu adversário em situação antecipada de constrangimento, ao atrapalhar as negociações da Casa Branca com o Capitólio com o propósito de amparar a Ucrânia.
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Virgílio Arraes
Doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.