Correio da Cidadania

O marasmo eleitoral com uma ponta de tensão

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Mato Grosso participará do teste de integridade da urna com biometria —  Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso
Escrevo essa peça faltando 15 dias para a votação do primeiro turno das eleições e dá para afirmar que essa é a eleição presidencial mais chata de todos os tempos, a mais previsível. Ao menos é o que nos mostram as pesquisas de intenção de voto que se sucedem. Todas mostram, um pouco mais ou um pouco menos, uma vantagem considerável de Lula sobre Bolsonaro nas simulações de primeiro turno. Tudo bem que a memória não é algo a se cultivar nos tempos instantâneos que vivemos.

Vou me deter apenas no certame presidencial, mas espanta que pouca atenção seja dada ao legislativo, logo não será surpresa se a tal “correlação de forças” continuar sendo muito desfavorável.

O frenesi que se observa entre apostadores e animadores de torcida nas redes sociais que refletem o campo que quer ver Bolsonaro longe da cadeira presidencial remete a saber: 1) se o certame vai se decidir no primeiro turno; 2) se teremos mais um mês de uma escalada das tensões que é promovida, e até certo ponto desejada, para não cairmos no marasmo completo; 3) se teremos um golpe, ou ao menos uma tentativa, por parte de Bolsonaro.

No mais, tudo indica que Lula vencerá, nem que seja num segundo turno em que a agonia será produzida e aceita a cada instante até o final de outubro se não nos for concedida a graça de que tudo se encerre no dia 02 de outubro.

Mas por que falar do marasmo?

Porque nos meios de comunicação (de massa ou de nicho, como as redes antissociais) alguma tensão está no ar. Dizem e repetem que as instituições tentam domar o capitão presidencial, que invariavelmente consegue sempre ir um pouco além dos limites que se tornam imaginários e esgarçam o papel institucional.

Mas foram essas mesmas instituições (MPF, STF, TSE, Câmara e Senado) que nos trouxeram até aqui, ao permitirem a cassação de Lula em 2018 e a eleição de Bolsonaro com a série de atrocidades promovidas pelo então candidato Bolsonaro, com direito a “metralhar os vermelhos”. Tudo dentro da normalidade inexistente. As instituições nos salvarão? Bolsonaro conseguiu nos rebaixar o horizonte político a tal ponto que nos tornamos defensores das instituições da democracia burguesa liberal. “É preciso entender a correlação de forças” é uma expressão que voltou com muita intensidade.

Nos meios de comunicação de massa, jornais impressos, portais de notícias, canais fechados e abertos de TV, o que se passa é uma “polarização”, em alguns momentos parece até que são consultores gratuitos do capitão que têm dificuldade em chegar ao segundo turno. Entendo que, ao mesmo tempo que precisam oferecer emoção para os telespectadores não podem deixar que Lula ganhe no primeiro turno, para poderem ter margem de negociação ampliada. Logo, sua contribuição e cumplicidade com o capitão são comoventes, ainda que finjam se revoltar. É um morde e assopra que acaba normalizando uma extrema direita que nem deveria estar concorrendo por seu objetivo de destruir o tabuleiro do jogo da democracia liberal (pois é, não estou nem falando de manter perspectivas revolucionárias).

Nas redes sociais, ao menos no campo da disputa política, o que conta é ganhar entre quem pensa parecido e expurgar o mal maior num festival de bloqueios que levam a uma sensação de estarmos fazendo a nossa parte para nos livrar de Bolsonaro. No entanto, é o terreno em que o capitão possui mais seguidores, ainda que Lula venha ganhando posições importantes. É onde se sedimentam as posições desses candidatos junto a sua base virtual, que dificilmente se entrelaça com o concorrente oposto.

O capital político principal de Lula é ter junto de si os três principais candidatos de 2010 (José Serra está cogitando se manifestar nesse sentido – o que, depois de Alckmin como vice, não seria nada demais, mas simbólico). O que mudou nos 12 anos que separam 2010 do ano corrente?

Eis a questão mais profunda que pode nos levar a uma reflexão ainda momentânea, mas não mais instantânea. Sim, teve um golpe que foi normalizado pelo processo de impeachment, essa parte só se vê nas redes sociais, pois os meios de comunicação de massa normalizaram o “governo Temer” e sua ponte para o futuro do pretérito que nos trouxe Bolsonaro de brinde.

No mais, vim aqui para colocar o papo em dia, de repente volto mais vezes. O fato é que, sem maiores problematizações que não cabem aqui, ao menos para mim entendo que a única forma de tirar Bolsonaro é votando em Lula. Se para mim isso está claro, melhor fazer logo, até porque nem tudo se resume a voto e Bolsonaro pode muito bem, normalizado como está, continuar como um líder de oposição “democrática”. Sim, contém ironia nas aspas, mas preocupação concreta com o que virá.

Bem sei que existem aqueles que me alertam que Bolsonaro será inundado com processos de todos os lados e será humilhado, se encaminhando para o ostracismo. Para esses, prefiro recomendar muita calma: primeiro vamos tirar o capitão de onde ele está. Acho que o voto em Lula é o caminho. E depois? Vai ser preciso muita ação, muito mais do apertar os botões da urna eletrônica, escrever um post ou uma pecinha como essa. Quem sabe esse marasmo no ar já é algo proposital para o que nos aguarda?

Marcelo Castañeda é sociólogo e professor da UFRJ.

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