Correio da Cidadania

Republicanos: pontos contraditórios

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Sacramentada a sua candidatura, John McCain tem um encargo político difícil de superar até o início de novembro: viabilizar a idéia de continuidade dos valores republicanos em Washington sem representar, ao mesmo tempo, a subscrição do fracasso nos últimos anos da administração Bush. Em suma, renovar-se aparentemente perante o eleitorado, porém com o objetivo de que haja a permanência do ideário de seu partido.

 

Um dos primeiros desafios é desfazer a conexão - observada para muitos como praticamente natural - entre o Partido Republicano e os chamados interesses especiais, isto é, questões concernentes às possíveis vantagens das grandes corporações, mas apresentadas à população como se fossem do benefício máximo de todos.

 

No processo eleitoral de 1912, os democratas, simbolizados por Woodrow Wilson, haviam reiterado o posicionamento de defesa dos interesses nacionais, jamais dos especiais, como teriam feito os republicanos, liderados por William Taft. Dividida durante a campanha, em vista da candidatura por outro partido de Ted Roosevelt, a militância republicana assistiu a uma de suas piores derrotas no século XX.

 

Desde daquela época, o Partido Democrata tem enfatizado a sua diferença de postura, de maneira que o próprio Barack Obama a confirmaria. Ao fazê-lo, obrigou McCain a se defender, ao admitir que a Casa Branca tem auxiliado bastante as corporações petrolíferas e posto as considerações de poder acima das de valores.

 

Outro ponto intimidador para os republicanos, ainda que não pessoalmente para McCain, é o tratamento destinado aos imigrantes ilegais, principalmente vindos da América Latina. Tradicionalmente, os republicanos são observados como menos tolerantes com os trabalhadores do terceiro mundo. O postulante, no entanto, compartilha a visão de que é necessário regularizar ao menos parte deles. Assim, as oportunidades deveriam ser iguais para todos, desde que dispostos a trabalhar.

 

Aspecto preocupante para a campanha republicana em setembro é o recente auxílio governamental destinado a dois grandes grupos do setor imobiliário, sob a justificativa de não permitir o desequilíbrio do mercado e conseqüentemente prejudicar a classe média. O socorro contradiz, de maneira incontestável, a usual pregação dos arautos do neoliberalismo de que o Estado não faz bem à economia.

 

Na política externa, ele condenou de forma veemente o comportamento russo no tocante à invasão temporária da Geórgia. No início de agosto, o governo georgiano atacou sem causa a Ossétia do Sul, território fronteiriço da Rússia, cultural e politicamente conectado com o Kremlin em virtude do seu perfil populacional. Nesse sentido, a contrapartida de Moscou foi intempestiva, ao infligir a Tbilisi danos significativos em curto espaço de tempo.

 

Apesar de distinto do caso osseto, McCain não mencionou a impropriedade do confronto com o Iraque, desprovido de embasamento jurídico perante a comunidade internacional e sem solução à vista, dado que as grandes potências não desejam partilhar do ônus de nele envolver-se, ainda que pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Quanto ao Afeganistão, McCain não o invocou, de sorte que é mais um assunto a acentuar a incompetência da política externa republicana nos últimos anos.

 

Relativamente a temas energéticos, a palavra de ordem foi a perfuração de mais poços de petróleo, de modo que a consideração para fontes alternativas seja secundária. Não houve atenção para a importância das alterações climáticas previstas. Enfim, a virtuosidade do discurso foi aplicada para os tópicos não totalmente observados assim pela opinião pública. Enquanto isso, o governo Bush dedica-se a extenuar o país sem que haja de McCain um lamento sequer.

 

Virgílio Arraes é professor de Relações Internacionais da UnB.

 

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