A possível divisão dos conservadores nos EUA
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- Virgílio Arraes
- 10/04/2010
A vida política nos Estados Unidos normalmente orbita em torno de dois grandes partidos. Nos últimos vinte anos, porém, houve duas dissensões significativas nas fileiras dos republicanos: uma foi em 1992 e a outra se encontra em andamento.
A primeira foi decisiva para a derrota republicana, sob a liderança de George Bush, na eleição presidencial; a segunda será avaliada em novembro próximo no pleito estadual, onde se renovarão todos os assentos da Câmara e 36 do Senado. Entre uma e outra movimentação, o vínculo tem sido o extremo conservadorismo, notadamente na área econômica.
Presentemente, os conservadores mais insatisfeitos aglutinam-se em torno do chamado Partido do Chá, mas sem ainda uma pauta pormenorizada. No dia-a-dia, vociferam contra o governo Obama, em especial no tocante à reforma ainda em andamento do sistema de saúde.
A oposição à reestruturação decorre do receio de um aumento de impostos da classe média para custear a assistência para pouco mais de trinta milhões de norte-americanos, número ainda insuficiente para cobrir todos os não segurados.
As raízes mais recentes do movimento localizam-se nos anos 30 e 40, após o repetido triunfo dos democratas nas urnas, em função de sua habilidade administrativa para contornar os aspectos sociais mais deletérios da Crise de 1929.
Naquele período, restou ao Partido Republicano reforçar a sua identidade perante o eleitorado, por meio da recusa da falibilidade inevitável dos mercados e da relação próxima entre propriedade privada e liberdade.
A recusa de muitos destes conservadores de aceitar a presença do Estado no cotidiano não decorre totalmente do liberalismo clássico do XVIII, porém da difusão de visões inspiradas no denominado darwinismo social do XIX, ou seja, a sociedade dividir-se-ia entre vencedores e perdedores, com cada um elaborando individualmente o seu destino, ao relegar-se para o segundo plano a estrutura sócio-econômica.
Enfim, a natural sobrevivência dos mais aptos em torno da qual os governos não deveriam interferir.
Com a derrocada dos anos 1930, alterou-se a percepção sobre o papel recolhido do governo; a administração pública poderia ser sim um indutor significativo do desenvolvimento e da distribuição da uberdade, de sorte que a iniqüidade social fosse bastante reduzida. Como resultado de médio prazo da política econômica dos democratas, o país passou a ter a maior classe média do globo.
Contudo, desde a ascensão republicana no final da década de 1960, segmentos mais abastados da classe média sentem-se injustiçados politicamente, ao considerarem que parte da riqueza por eles gerada é transferida, via tributação, para setores mais desvalidos de maneira injusta, por causa da alíquota estabelecida.
A partir de então, emana-se o canto aparentemente mavioso dos republicanos: menos impostos, por conseguinte, mais consumo; assim, mais empregos, logo mais distribuição de renda. Em tal concepção, a pobreza é uma questão individual, jamais coletiva. A intervenção governamental não resolveria porquanto geraria dependência, mesmo eleitoral, e, portanto, desestimularia a atividade econômica.
Aos entusiastas de tal posicionamento, o Partido Republicano não satisfaz mais porque não defenderia os valores tradicionais de modo adequado: a agremiação intimidou-se bastante em função do cronograma eleitoral, com pleitos de dois em dois anos, de sorte que se comportaria sempre com o olhar no dia-a-dia, sem conseguir direcionar-se para os grandes temas.
Diante de tal quadro, os chazeiros poderão na eleição parlamentar de novembro próximo prejudicar mais os republicanos que os democratas, ao dividir os votos mais à direita e, desta feita, auxiliar involuntariamente a periclitante gestão de Barack Obama.
Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.
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