Repisando “narrativas” – Tentativa de Síntese Programática II
- Detalhes
- Wladimir Pomar
- 27/11/2015
Apresentamos agora o que compreendemos como as políticas do segundo eixo programático extraído do documento “Mudar para sair da Crise...”:
1. Adotar nova estratégia de desenvolvimento econômico e social;
2. Reurbanizar e humanizar as cidades;
3. Dar à agricultura, além de sua finalidade econômica, uma finalidade social.
Essas políticas são parte de uma estratégia de reorganização estrutural da economia brasileira, a ser acompanhada de reformas políticas democráticas mais profundas.
IV. Adotar nova estratégia de desenvolvimento econômico e social
1. Mobilizar um processo de desenvolvimento industrial que tenha como principais objetivos:
1.1. Gerar empregos;
1.2. Elevar a renda bruta e a renda nacional;
1.3. Alterar a estrutura produtiva, estimulando investimentos de longo prazo em cadeias produtivas industriais estratégicas de desenvolvimento prioritário, a serem definidos e redefinidos continuamente no processo de desenvolvimento, tais como:
1.3.1. Setores de maior agregação de valor, maiores ganhos de produtividade e maior competitividade externa;
1.3.2. Setores que preservem a expansão do emprego e do mercado interno com distribuição de renda e valorização do trabalho.
1.4. Reconstruir, reordenar e modernizar a infraestrutura nacional, tendo em conta o papel que o desenvolvimento social e o mercado interno devem desempenhar no desenvolvimento econômico:
1.4.1. Prioridade para suprir mais de 85% da população brasileira de transportes decentes e baratos, saneamento básico, água potável, educação, saúde, energia elétrica e moradias civilizadas;
1.4.2. Atenção a portos, dragagem, ferrovias, hidrovias, capacidade das rodovias, aeroportos, e energia elétrica, que baixem os custos das exportações e importações.
2. Adotar uma política macroeconômica que dê apoio substancial à nova estratégia de desenvolvimento econômico e social:
2.1. Taxas de juros que estimulem os investimentos produtivos e, ao mesmo tempo, remunerem os títulos do governo;
2.2. Política cambial que proteja a indústria tecnologicamente competitiva;
2.3. Estrutura tributária progressiva, reduzindo ou anulando o peso dos impostos indiretos (consumo e folha salarial) e elevando o peso dos impostos diretos (renda e patrimônio);
2.4. Conjunção de forças entre governo, empresas estatais e empresas privadas para alavancar os investimentos em infraestrutura e inovação tecnológica por meio de parcerias público-privadas, em concessões reguladas de acordo com os interesses nacionais e populares;
2.5. Associação de capitais privados com capitais estatais no adensamento das cadeias produtivas, tanto no mercado interno quanto no mercado internacional, especialmente no âmbito da América Latina;
2.6. Redirecionamento dos incentivos aos investimentos internos e externos com o objetivo primordial de alterar a estrutura produtiva de setores industriais que:
2.6.1 Elevem seu padrão científico e tecnológico e/ou sua capacidade de emprego;
2.6.2 Agreguem mais valor e ganhos de produtividade;
2.6.3 Elevem a competitividade externa;
2.6.4 Revigorem e modernizem seu parque produtivo;
2.6.5 Elevem a qualidade das exportações e promovam a importação de novas e altas tecnologias;
2.6.6 Preservem a expansão do mercado interno com distribuição de renda e valorização do trabalho.
2.7. Regulamentação dos investimentos externos diretos para:
2.7.1. Coibir investimentos de curto prazo que desorganizam as finanças nacionais e desnacionalizam empresas;
2.7.2. Atrair investimentos que se voltem para a instalação de novas plantas produtivas, transferência de novas e altas tecnologias, e aumento da musculatura técnica e científica, tanto das empresas estatais quanto das empresas privadas nacionais.
3. Criação de mecanismos de financiamento de longo prazo, através dos bancos públicos, dos bancos privados, do mercado de capitais, e dos organismos internacionais, em especial do banco de desenvolvimento dos BRICS.
4. Apoio e estímulo ao desenvolvimento de inovações no campo da ciência e da tecnologia para agregar valor a processos produtivos.
5. Transformação de todas as estatais em orientadoras do processo industrial, com poder de realizar acordos com empresas nacionais e estrangeiras em projetos que atendam às necessidades financeiras, tecnológicas e científicas dos setores industriais estratégicos.
6. Reestruturação da engenharia nacional, paralelamente à transformação dos sistemas industriais, comerciais e de serviços monopólicos e oligopólios em sistemas concorrenciais.
7. Apoio especial aos sistemas industriais, agrícolas, comerciais e de serviços, constituídos de micros, pequenas e médias empresas, com baixas tecnologias, mas com alta densidade de emprego.
8. Adoção de uma política agrícola que tenha a elevação da produção de alimentos para o mercado interno como objetivo estratégico na luta contra a inflação.
V. Reurbanizar e humanizar as cidades
1. Considerar a infraestrutura urbana estratégica e prioritária, de modo que a reurbanização siga uma lógica na qual seus espaços sejam abertos à utilização e ao convívio público, atendendo principalmente às grandes massas da população, num ambiente limpo e saudável:
1.1. Realizar investimentos na produção de equipamentos, máquinas e materiais para a construção e a reconstrução urbana;
1.2. Trabalhar de forma progressiva para prover serviços de maneira pública, universal, regular, de qualidade e gratuita, num prazo que permita superar os grandes déficits sociais acumulados;
1.3. Substituir a política privatista que subordina os direitos públicos à lógica da privatização ou da concessão de bens e serviços públicos para a gestão privada e para a obtenção de lucros desmedidos;
1.4. Elaborar políticas nacionais de habitação popular, saneamento e mobilidade urbana com recursos financeiros e institucionais compatíveis com os problemas gerados pelo acelerado processo de urbanização excludente ocorrido a partir de meados do século 20;
1.5. Romper com os carteis presentes na engenharia civil, no setor automobilístico e em outros setores que resistem à implantação da mobilidade urbana por transportes elétricos sobre trilhos, de superfície e subterrâneos;
1.6. Transformar o solo urbano em propriedade pública para moradias, espaços de convívio e civilidade, e palco das principais transformações nas políticas ambientais de cunho sustentável;
1.7. Constituir sistemas nacionais e regionais que evitem impactos ambientais negativos e implantem medidas preventivas para o enfrentamento das mudanças climáticas nas áreas de:
1.7.1. Gestão das águas, incluindo prevenção de secas e enchentes destrutivas, recomposição das florestas ciliares e proteção contra poluentes sólidos e efluentes químicos;
1.7.2. Esgotamento sanitário;
1.7.3. Coleta e reciclagem de lixo sólido e de efluentes;
1.7.4. Arborização urbana;
1.7.5. Utilização da energia solar para o aquecimento de água e geração elétrica complementar.
VI. Dar à agricultura, além de sua finalidade econômica, uma finalidade social
1. Introduzir mudanças no Imposto Territorial Rural, de modo que o agronegócio pague a renda fundiária ao Estado e à sociedade, e contribua para o desenvolvimento econômico e social.
2. Impor ao agronegócio e à agricultura como um todo:
2.1. A preservação do meio ambiente;
2.2. O impedimento, legal e administrativo, de expropriar, mesmo através de operações mercantis, terras de pequenos e médios agricultores;
2.3. A aceitação da reforma agrária dos latifúndios improdutivos, compreendendo:
2.3.1 Eliminação da propriedade territorial improdutiva;
2.3.2 Aproveitamento das terras devolutas do Estado;
2.3.3 Parcelamento dessas terras na forma de:
2.3.3.1. Propriedade familiar;
2.3.3.2. Propriedade empresarial pequena e média;
2.3.3.3. Propriedade em regime cooperativo.
3. Promover um modelo de desenvolvimento rural sustentável que:
3.1. Garanta acesso ao crédito, técnica, equipamentos, preços mínimos e seguro agrícola prioritariamente para as unidades agrícolas cuja produção se destina ao mercado doméstico;
3.2. Seja direcionado para alimentar uma agroindústria avançada e para superar as causas da pobreza, da exclusão e da desigualdade, e melhorar as condições de vida no campo;
3.3. Fortaleça, através da Embrapa e outras empresas estatais de fomento agrícola, o papel das agriculturas cooperativa, familiar e privada não proprietária do solo;
3.4. Coíba a compra de terras por estrangeiros e combata a “grilagem”;
3.5. Universalize entre as pequenas e médias agriculturas:
3.5.1. Programa Nacional da Agricultura Familiar (PRONAF), que financia produção e fornece assistência técnica;
3.5.2. Programa Garantia-Safra, voltado para os agricultores familiares do semiárido nordestino;
3.5.3. Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que garante renda e contribui para o abastecimento de escolas públicas, hospitais e instituições beneficentes.
3.6. Fomente um sistema cooperativo agrícola, que eleve a produtividade, diversifique os produtos, evite a erosão do solo, promova a recuperação ambiental, atenda às necessidades alimentares de toda a população e compita com o agronegócio.
Com isso encerro minha contribuição ao texto “Mudar para Sair da Crise...”, pelo menos até que surjam novos reclamações sobre a falta de “narrativas”.
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Wladimir Pomar é escritor e analista político.