Mobilização e avaliação de erros
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- Wladimir Pomar
- 24/03/2016
Virou moda, entre analistas de esquerda que acordaram para a gravidade da situação vivida pelo país, repetir à exaustão que o principal, neste momento, é a mobilização popular. É verdade! A única força capaz de conter os golpistas e seus seguidores é o povo brasileiro mobilizado.
Por outro lado, tendo isso como pressuposto, esses analistas agregam que não é o momento de dispersar esforços. Consideram que seria dispersivo, neste momento, realizar avaliações sobre erros cometidos, mesmo que tais erros tenham contribuído para a atual crise em que o país e o PT estão mergulhados.
Ainda, segundo eles, não seria possível fazer previsões sobre a atual conjuntura. Com os dados de um ou mais anos atrás, não seria previsível supor o presente caos político, nem a crise econômica. Mesmo que alguém houvesse previsto isso, não teve capacidade de convencimento e de mobilização para evitar os erros e prevenir os presentes acontecimentos.
Cá entre nós, esse é um método canhestro de jogar sobre os ombros de outros a própria responsabilidade. Ou seja, se aqueles que previram o que ia ocorrer com as políticas errôneas adotadas não tiveram capacidade de convencer e de mobilizar forças suficientes para a adoção de outras políticas, eles seriam os responsáveis pelos resultados. Mesmo que isso fosse verdade - mas não é - a negação em reconhecer e avaliar os erros praticados continua sendo um empecilho para enfrentar com acerto a presente situação.
Como corrigir um erro, sem analisá-lo e tirar dele os ensinamentos decorrentes? A humanidade tem avançado num constante processo de tentativa e erro, no qual o reconhecimento do erro é a base para sua correção e para novos passos adiante. Nas novas tentativas de ação, novos erros ocorrerão, num processo contínuo, exigindo constantes avaliações e correções. Ao contrário de atrapalhar os passos adiante, o reconhecimento, avaliação e correção dos erros os ajuda.
No entanto, se houver resistência ao reconhecimento dos erros e, em consequência, à sua superação, não estaremos capacitados para enfrentar plenamente os novos desafios. Por exemplo, estamos forjando uma ampla unidade quanto à necessidade imperiosa de mobilizar as grandes camadas populares e intermediárias da população em defesa dos direitos democráticos, dos direitos sociais da Constituição de 1988, e da manutenção das eleições democráticas como forma de resolver as disputas políticas.
No entanto, isso não basta para mobilizar a maioria do povo brasileiro. Isto é, as grandes camadas trabalhadoras e populares da população, cuja participação é decisiva para barrar a ofensiva conservadora e golpista. Em outras palavras, o problema consiste em reconhecer que a mobilização social só ganhará o volume necessário para tornar patente a verdadeira porcentagem da mobilização de direita se, àquelas bandeiras políticas democráticas, incluirmos as bandeiras econômicas e sociais, também democráticas, de direito ao emprego, ao salário justo, à aposentadoria digna, à moradia, à saúde e à educação.
O que nos remete à necessidade de corrigir, no próprio processo de mobilização popular, o rumo econômico e social errado adotado pelo governo Dilma. E de evitar, nesse processo de correção, os erros estruturais dos períodos anteriores, mascarados pela situação econômica internacional favorável dos anos 2002 a 2010. Situação que permitiu, por algum tempo, o sucesso da política de elevação do poder de compra das camadas miseráveis e pobres da população brasileira sem o forte acompanhamento de uma política de investimentos e de correções cruciais na política macroeconômica.
Isto é, investimentos que promovessem a elevação constante da oferta de alimentos e de bens industriais não duráveis necessários pela crescente demanda da população de baixa renda. Investimentos que também consolidassem, paralelamente ao agronegócio, a presença de uma forte economia agrícola destinada ao mercado interno, e a retomada da industrialização, sem a qual é pirotecnia falar em soberania econômica. E correções macroeconômicas, particularmente nos juros e no câmbio, que estimulassem os investimentos produtivos e a industrialização.
Se corrigirmos os erros do governo Dilma com a adoção das mesmas políticas dos anos 2003 a 2010, estaremos substituindo uns erros por outros. Portanto, não é consistente sugerir que o reconhecimento e a avaliação dos erros atrapalhem o esforço pela mobilização popular. Ao contrário, são condição para a efetivação de uma mobilização realmente massiva.
Além disso, continua pesando sobre o PT o estigma da corrupção, sem que o partido tenha respondido com firmeza a isso. Embora a questão econômica seja o ponto nodal para reverter o processo de mobilização, seria conveniente que os petistas começassem a pensar seriamente em acertar as contas, em profundidade, com uma política organizativa e institucional que permitiu que meliantes e aloprados de “Padrão Delcidio” se tornassem figuras de proa no partido.
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Wladimir Pomar é escritor e analista político.