Correio da Cidadania

Hipóteses outonais

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Algo significativo ocorreu após as manifestações de 18 de março. Acabou a farsa dos órgãos do Partido da Mídia de noticiar ampla e com falsa neutralidade as manifestações de rua. O silêncio a respeito das manifestações contra o golpe foi ruidoso.

 

Acabou também a farsa dos noticiários televisivos darem 30 segundos para os adversários do golpe e 10 minutos para os favoráveis ao golpe. Agora não há sequer um segundo para os que defendem a ordem democrática.

 

Também parece haver acabado a farsa de prender magnatas envolvidos em ações corruptoras na Petrobras, de modo a demonstrar neutralidade na caça ao PT e a Lula. Além dos magnatas delatores haverem devolvido apenas uma merreca do que ganharam e estarem curtindo a “prisão” em seus palacetes ou casas de veraneio, está sendo preciso desencavar casos passados e julgados, que nada têm a ver com a Petrobras.

 

Paralelamente, o sistema financeiro já não esconde que especula com o câmbio e com as ações, negativamente, toda vez que a disputa parece pender para a defesa democrática e, positivamente, toda vez que a disputa parece pender para o golpe. E ninguém da oposição golpista se acanha em apoiar Cunha no comando do processo de impeachment contra Dilma.

 

Em outras palavras, os próximos dias serão decisivos para saber se a corrente conservadora e reacionária da sociedade brasileira vai se impor, através da Câmara e do Senado, à maioria da população brasileira. E se vai continuar, com o mesmo despudor, em seus planos de liquidar as conquistas democráticas e sociais da Constituição de 1988 e retirar o PT e Lula do cenário político, com reflexos negativos sobre toda a esquerda brasileira.

 

Nesta hipótese, quase tão trágica quanto a vitória do golpe militar de 1964, a esquerda terá que fazer um esforço político ainda mais intenso. Primeiro, para unificar seu programa de lutas em defesa dos direitos democráticos e sociais. Segundo, para evitar seu estilhaçamento em pequenos grupos, tanto de direita quanto de extrema esquerda. E terceiro para evitar que prosperem aventuras que rompam com a experiência histórica de que a violência, mesmo democrática, só se justifica diante das violências sem peias dos reacionários.

 

Em outras palavras, na hipótese acima, a esquerda, em particular o PT, terá que realizar um esforço considerável, num quadro de derrota política, para reajustar suas políticas. Isto é:

 

a) redefinir sua estratégia socialista;

 

b) elaborar táticas que deem destaque às lutas em defesa dos direitos democráticos e sociais;

 

c) reestruturar seu sistema de organização, priorizando as organizações de base da sociedade e a ligação com as grandes massas do povo;

 

d) fazer um acerto de contas com os erros de captação de recursos financeiros do empresariado, mesmo que tal captação tenha sido formalmente legal.

 

Se esses reajustamentos não ocorrerem e permanecer o atual cenário de múltiplas estratégias, táticas conflitantes, estrutura organizacional baseada em mandatos parlamentares e negativa em reconhecer os erros relacionados com a arrecadação financeira, será inevitável o desmanche. A vitória conservadora e reacionária se consolidará e talvez seja necessária uma década ou mais para que a esquerda volte a se reagrupar como força real e potente.

 

Embora a previsão acima seja a mais pessimista, é preciso ter em conta que a possível vitória democrática contra o impeachment é uma hipótese possível, mas não significará ingressar num mar de rosas sem espinhos. A direita conservadora e reacionária ainda terá forças empresariais, midiáticas, parlamentares, estatais e sociais para continuar batalhando pelo objetivo de liquidar o PT e Lula e destroçar o restante da esquerda o mais rapidamente possível.

 

Na melhor das hipóteses para as forças democráticas, a esquerda manterá o governo, mas terá que enfrentar:

 

a) a ofensiva do sistema financeiro e demais parcelas empresariais para completar o desarranjo da economia, pressionando a elevação dos juros, elevando a inflação, embaralhando o câmbio, disseminando o desemprego, impedindo os investimentos produtivos e a industrialização etc.;

 

b) a ofensiva dos diversos setores políticos da direita para paralisar o governo através de ações judiciais contra investimentos públicos, obras, transferências de renda para os mais pobres etc.;

 

c) a ofensiva do Partido da Mídia para desqualificar a esquerda e derrotar seus candidatos nas eleições de 2016 e 2018.

 

Em outras palavras, mesmo que obtenha uma vitória contra o impeachment, a esquerda no governo terá que fazer com que este perca o medo de desagradar o sistema financeiro e mude radicalmente sua política econômica. Ou seja, rebaixe os juros, administre o câmbio, retome os investimentos públicos e a industrialização, trace uma política soberana de atração de investimentos externos e retome o crescimento da economia e do nível emprego.

 

Essa é a maneira mais segura de retomar a iniciativa política e enfrentar a ofensiva da direita. Se ela não for efetivada, os cenários políticos se tornarão novamente muito nublados. E a vitória contra o impeachment não passará de um belo e fugaz canto outonal.

 

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Wladimir Pomar é escritor e analista político.

 

 

 

 

 

Comentários   

0 #3 Faz tempo que o PT já não é de esquerdaLeandro Parra 08-04-2016 17:54
Caracterizar o governo atual como de esquerda beira o ridículo, além do mais quem prejudicou sua posição no cenário político foi o próprio PT e seu mandatário maior, com as alianças com o capital financeiro e o agronegócio, sem citar outros setores da burguesia. Que existe uma articulação de amplos setores da burguesia para liquidarem o PT é um fato, todavia, a partir do momento que este partido abandonou sua posição à esquerda, deixando de levar a cabo uma real politização da sociedade ou de significativas parcelas dela no intuito de disputar a hegemonia visando implementar mudanças efetivas nas áreas da educação, saúde, reforma agrária, segurança pública (buscando colocar fim no entulho autoritário da ditadura militar, em especial batalhando intensivamente pelo fim das polícias militares), sem falarmos da ausência de ousadia nas questões referentes a regulamentação da mídia com a quebra dos monopólios por exemplo, ele próprio preparou o terreno para o avanço das forças conservadoras e reacionárias. Enfim, continuar acreditando que o PT e Lula poderão ser instrumentos para uma reorganização da esquerda - quase usei a palavra articulação, sinto arrepio só de pensar nesta nefasta tendência do PT - é quase como acreditar em papai noel, mesmo ele sendo "vermelho"...
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0 #2 DILMA BOBABEMAníbal Rodrigo 06-04-2016 22:59
A Dilma tem medo não só dos agiotas, tem medo dos pastores, medo dos ruralistas, medo dos empresários, medo da grande mídia (Globo à frente)... Resumo: tem medo de todos os que mandam e desmandam no Brasil.

Só não teve medo de trair seus compromissos de campanha e governar com o programa do Aécio. Perdeu apoio dos seus eleitores e não ganhou apoio algum da oposição, só ódio e desprezo.

A CNA - Confederação Nacional da Agricultura e a Frente Parlamentar Evangélica acabam de anunciar seu apoio ao impeachment. A Globo (apesar das verbas publicitárias) está no comando midiático ao golpe faz tempo, como a FIESP no setor empresarial. Valeu a pena tanta subserviência e covardia diante dos poderosos do país?

A Dilma Coragem, na verdade se revelou a "Dilma Bobagem" que fez as tais "pedaladas" por causa do déficit causada pelas isenções fiscais generosas aos empresários (Bolsa Empresário) e os incríveis 513 bilhões pagos de juros no ano passado (Bolsa Banqueiro).

Lulinha Paz e Amor, dono do PT, escolheu sozinho a sua herdeira e não foi cobrado por isso; Dilma, aposto, só esta esperando a poeira baixar para ir fazer mais um omelete no programa da Ana Maria Brega.

A discípula superou o mestre no quesito "paz e amor".
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0 #1 Cantilena,,,vini alves 06-04-2016 22:10
Em 2001, eu entreguei cópia de dissertação de meu mestrado nas mãos do autor desse artigo sobre os perigos de uma mídia sem controle! Em 13 anos de (des)governo, seu partido nada fez para colocar os meios de comunicação pagar por seus crimes ideológicos. Acho que o autor nem leu meu estudo! Está agora pagando pela arrogância!
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