Correio da Cidadania

Reflexões sobre a guerrilha do Araguaia - 1

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O major Curió, oficial do exército que atuou diretamente na repressão à guerrilha do Araguaia, ocorrida entre 1972 e 1974, entregou à imprensa, há pouco, novos documentos sobre a repressão a esse movimento armado. Por um lado, seus documentos comprovam as denúncias, feitas há muito, sobre o fuzilamento de prisioneiros pelas tropas do exército. Por outro, eles têm servido para novas reflexões a respeito desse episódio histórico.

 

Por exemplo, parece ser consensualmente reconhecido que o PC do B transferiu das zonas urbanas para uma região ao sul do Pará e às margens do rio Araguaia, a partir de 1966, cerca de 60 militantes e dirigentes partidários, com o objetivo de dar início a uma guerra popular prolongada. Até 1972, esses militantes e dirigentes dedicaram seus esforços para desenvolver atividades econômicas e sociais, integradas à realidade local, através das quais granjearam uma ampla simpatia da população com que conviviam.

 

A partir desse reconhecimento consensual, os demais fatos e interpretações sobre as ações daqueles militantes e dirigentes se embaralham. Alguns supõem que, após serem atacados pelas tropas do exército, eles teriam não só iniciado a resistência armada, como também empreendido um amplo trabalho político, através da União pela Liberdade e Democracia do Povo (ULDP). Isto seria a comprovação de que aquela resistência não teria constituído qualquer tipo de "foco".

 

O trabalho político, realizado após o início da resistência armada, não teria conquistado a adesão de apenas 11 camponeses, como afirma o relatório de Ângelo Arroio, assassinado pelas forças policial-militares durante o massacre da Lapa, em dezembro de 1976. Os documentos do major Curió teriam ampliado esse número para 20 habitantes locais, além de acrescentarem a informação de que a guerrilha teria contado com 98 combatentes (não 69, como afirmara Arroio), e o suporte logístico de 158 moradores.

 

Teria havido, pois, um trabalho político prévio entre os camponeses, que garantira uma forte simpatia aos jovens guerrilheiros e o "apoio de 90% da população local à luta armada". Na prática, portanto, os guerrilheiros teriam seguido firmemente as exigências da guerra popular. Isto é, forjado sólidos vínculos com as massas, formulado suas reivindicações e conhecido o terreno. Este, por suas condições geográficas, teria sido favorável às forças revolucionárias e desfavorável às do inimigo.

 

Infelizmente, essa apreciação não explica por que as condições geográficas acabaram por se mostrar desfavoráveis para os guerrilheiros. Foram os militares que conseguiram mobilizar, mesmo à força, os grandes conhecedores das condições geográficas locais, os índios suruís e os mateiros.

 

Afora isso, essa apreciação também reduz apenas à guerra popular a necessidade de forjar vínculos sólidos com as massas e saber formular suas reivindicações. Na verdade, esta é uma exigência geral para o trabalho de qualquer partido popular, ainda mais revolucionário, em qualquer situação, conforme debatemos em comentários anteriores.

 

Se isto é verdade, o que se deve perguntar é se atividades sociais, como participar de puxirões ou de trabalhos econômicos de ajuda mútua, ou demonstrar solidariedade diante de doenças e outras dificuldades, representam trabalho político. Ou até que ponto tais atividades contribuem para o aprendizado político.

 

Que se saiba, atividades sociais são uma das bases sobre a qual a atividade política pode se desenvolver. Mas, simpatia social e adesão política são coisas diferentes. Confundi-las, na luta política e, mais ainda, na luta militar, pode levar a tragédias.

 

Portanto, se aqueles militantes e dirigentes só começaram a realizar o trabalho político da ULDP após serem atacados pelas forças armadas do regime, na impossibilidade de desenvolverem uma ação abertamente política entre 1966 e 1972, na prática isto representa uma inversão da teoria política. Segundo esta, a guerra é a continuação da política por meios armados.

 

Sem os camponeses haverem passado pelo aprendizado da luta política dos diversos meios pacíficos, e chegado à conclusão de que não poderiam viver como até então, seria pedir demais a eles que aderissem à forma extrema dos meios armados por mera simpatia social.

 

Wladimir Pomar é escritor e analista político.

 

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Comentários   

0 #2 Excelente Artigo!Raymundo Araujo Filho 07-08-2009 13:48
Um único reparo: A participação de militantes no seio do Povo, não pode ser utilitarista. Pessoas são pessoas, e não ferramentas. O Povo não é um instrumento para a Revolução, é a causa e o sujeito dela. Portanto, participar de Mutirões, festas, atividades de ajuda mútua, enfim, participar da vida social e econômica das pessoas, tem de ser algo absolutamente natural e é indispensável para que a sociedade faça a sua Revolução.

Ao meum ver, a esquerda persiste em um grande erro, até hoje, que é achar que o partido ou as vanguardas é que vão fazer a Revolução, e não serem apenas um instrumento para que o Povo a faça. Por causa disso é que as paixões partidárias os nivelam com algo como times de futebol. Muitos se apegam tão apaixonadamente, que perdem o espírito crítico, e às vezes da capacidade de percepção do ridículo.
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0 #1 Ampliando o Debate sobre a guerrilha do Aldo Santos 06-08-2009 18:02
As Verdades sobre a Guerrilha do Araguaia.
“MUITOS DIRÃO QUE SOU AVENTUREIRO E SOU MESMO,SÓ QUE DE UM TIPO DIFERENTE,DAQUELES QUE ENTREGAM A PRÓPRIA PELE PARA DEMONSTRAR SUAS VERDADES”. CHE Guevara
Sob o pretexto de combater comunistas e revolucionários que estariam tomando conta do país no início da década de 60, os militares entraram em ação através de um abjeto golpe Militar, deixando um rastro de mortes, ressentimentos e uma ferida aberta que nunca cicatrizou.
Como se não bastasse a indignação com os atos provocados, ainda tentam passar um mata-borrão no passado sob pretexto de um eventual revanchismo no que diz respeito aquele período histórico.
Na verdade os militares estavam dentro de um contexto histórico latino-americano de usurpação do poder civil pelos ditadores, e nesse contexto reprimiram, suprimiram as liberdades mínimas que existiam, prenderam, torturaram e mataram lutadores do povo que ousaram acreditar e lutar por uma Pátria Livre do jugo do Capitalismo.
Do ponto de vista da classe trabalhadora, as lutas de resistências eram intensas com os movimentos sindicais, estudantis e políticos, vez que lutavam pela ampliação das liberdades e direitos políticos no país.
O ponto central da luta estratégica visava derrotar o capitalismo e instituir uma nova sociedade socialista, onde todos poderiam partilhar os bens produzidos que até então eram centralizados nas mãos da burguesia nacional e internacional.
O Golpe de 31 de março de 1964, entra para a história do país como um momento tenebroso de supressão dos direitos, com o fechamento do congresso e permanente publicação de atos institucionais que delimitava espaços e assassinava quem ousassem pensar diferente dos militares que estavam ditatoriamente a frente do poder político do país.
Ao restringir as liberdades democráticas, abriu-se várias perspectivas e leituras sobre o momento conjuntural no país onde inúmeras organizações implementaram ações que iam da luta por liberdades e melhorias salariais, às lutas por liberdades partidárias e até a luta armada como ação concreta e direta para se contrapor a ofensiva ditatorial que era a marca registrada dos militares que golpearam o país a partir de 1964.
Dentro dessa leitura de resistência armada, um movimento chama atenção por sua ousadia, convicção e ação direta nesse período. A denominada Guerrilha do Araguaia, teve uma ação concreta de 1972 á 1975.
Segundo várias publicações, a partir de 1966 um grupo liderado pelo PCdoB, instalou-se em três regiões no Bico do Papagaio, ao sul do Pará, objetivando ganhar corações e mentes para a luta armada, cujo propósito era levar a classe operária ao poder através das lutas de guerra de guerrilhas do meio rural para o meio urbano e fazer um cercamento ao poder burguês no intuito de derrubar o sistema capitalista.
Segundo o Estadão, calcula-se que “Da força guerrilheira, 98 pessoas pegaram em armas ou atuaram em trabalhos de logística. Deste total, 78 foram recrutadas pelo partido nas grandes metrópoles brasileiras e 20 na própria região do conflito.”
As forças Armadas realizaram três campanhas para destruir a guerrilha. Só conseguiram derrotar o movimento na terceira ofensiva, com um efetivo com mais de 5 mil agentes afins: Policia Federal, Rodoviária, Militar e Civil.
Embora as forças reacionárias tentem sepultar definitivamente as agruras do período militar, não podemos permitir que o silêncio se sobreponha aos direitos elementares dos familiares e da sociedade como um todo: sobre o paradeiro e o sepultamento dos mortos e a retomada livre da história desse período que precisa ser aberto a opinião pública.
O agente da ditadura Sebastião Curió Rodrigues de Moura, abre a “mala de ferramenta” e começa a publicar seus arquivos como parte das “verdades” que deveriam ser reveladas pela instituição das Forças Armadas, que até o momento insiste em ocultar aquilo que é direito inalienável da sociedade humana.
Nas ruas derrubamos a ditadura militar, mas até hoje o governo LULA não tem feito esforços suficientes para abrir os arquivos da ditadura militar no Brasil, bem como, ajudar nos esclarecimentos dos golpes em outros países.
Curió relata sobre o período de 1972-1975, onde confirma que 41 militantes presos, foram barbaramente executados pelos militares; diferentemente do que se afirmava até então pelos mesmos.
Os documentos apresentados por Curió desvendam a terceira ofensiva militar contra os militantes que estavam na guerrilha, na qual as forças armadas dizimaram os lutadores no período de outubro 1973 a janeiro de 1975. Segundo dados da imprensa, existiu uma política de extermínio, deliberadamente, como forma de eliminar todos e a tudo que estivesse na mira da ditadura.
Esse período da história está encravado na memória da esquerda mundial e na historia dos lutadores, dos democratas e dos familiares e militantes que tiveram seus entes destroçados pelo regime ditatorial capitalista.
Presidentes, militares e o próprio Curió, são escórias de uma época e personas não grata a história e memória do povo brasileiro.
É nosso dever e responsabilidade elucidar os fatos, exigir e defender o povo brasileiro dos verdugos sempre presentes na história, como estamos acompanhando mais um golpe militar em Honduras cujo presidente foi deposto ao propor que o povo participasse de um plebiscito e pelo ingresso desse país na Alternativa Bolivariana das Américas (Alba) .
Exigimos a imediata abertura dos arquivos da ditadura militar; prisão aos assassinos que prenderam, torturaram e mataram nossos lutadores.
Independentemente das leituras que temos sobre esse episódio em si, somos solidários aos bravos lutadores que devotaram suas vidas a causa dos oprimidos .
Para contextualizar os ideais da guerrilha do Araguaia, reproduzimos um texto de Fidel Castro que busca traçar em linhas gerais e definir o que é uma Revolução:
“Revolução é:sentido do momento histórico;
é mudar tudo o que deve ser mudado;
é igualdade e liberdade plenas;
é ser tratado e tratar os demais como seres humanos;
é emanciparmos por nós mesmos e com nossos próprios esforços;
É desafiar poderosas forças dominantes dentro e fora do âmbito social e nacional;
É defender valores nos quais se crê ao preço de qualquer sacrifício;
É modéstia,altruísmo, solidariedade e heroísmo;
É lutar com audácia , inteligência e realismo;
É não mentir jamais nem violar princípios éticos;
É convicção profunda de que não existe força no mundo capaz de derrotar a força da verdade e das idéias.
Revolução é unidade, é independência,é lutar por nossos sonhos de justiça para Cuba e para o mundo, que é a base do nosso patriotismo, de nosso socialismo e de nosso internacionalismo”

Revolucionar é preciso!!!
Aldo Santos , Sindicalista, Membro do Diretório nacional e presidente do Psol de
SBC. (29/06/09)
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