Luta armada – testemunho sobre os anos 1950
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- Wladimir Pomar
- 01/09/2009
No início dos anos 1950, quando comecei a militar entre os comunistas, a questão da luta armada não estava posta como oposição a qualquer outra forma de luta fundamental. Era consensual, às vezes até de forma pouco consciente, de que uma revolução social no Brasil teria que ocorrer através de meios armados.
Essa compreensão não se baseava apenas na experiência histórica das revoluções russa e chinesa, ou das guerras de libertação que ocorriam no Vietnã e em várias outras regiões da Ásia e África. Tinha como pressuposto a própria experiência brasileira, onde até mesmo as reformas conservadoras, como a República, o voto secreto e o início da industrialização, foram obtidas com algum tipo de participação dos fuzis.
Por outro lado, os comunistas daquele período, apesar de viverem na clandestinidade, não se afobavam em determinar o momento em que a luta armada deveria ocorrer. Mesmo as diretivas do Manifesto de Agosto, de 1948, que insistiam no assunto, foram frustradas e tiveram que ser modificadas pela ação prática das bases partidárias. Como várias dessas bases tinham vínculos reais com amplos setores populares, conseguiam resistir às políticas dissociadas do nível de luta e consciência desses setores.
Assim, apesar de orientações políticas contraditórias, como a de construir sindicatos paralelos, ou de realizar alianças eleitorais meio inexplicáveis, havia uma razoável unidade em torno da construção de organizações de base no chão de fábrica das empresas industriais, e de realizar um trabalho de massa calcado nas reivindicações reais dos trabalhadores e demais camadas populares. Dirigentes e militantes não-operários eram incentivados a se tornarem metalúrgicos, têxteis, químicos, gráficos e outros tipos de trabalhadores fabris.
Foi por isso que trabalhei na metalúrgica Arno, em São Paulo, e pude participar na greve de 1953. Nessa empresa, como em muitas outras, havia células comunistas com influência sobre os demais trabalhadores, que foram decisivas para que as diversas categorias profissionais articulassem um forte movimento unificado.
Essa greve e, logo depois, as eleições municipais foram uma demonstração da distância que existia entre a consciência dos trabalhadores a respeito de seus direitos econômicos, que os comunistas souberam traduzir adequadamente, e sua consciência política, que levou a maioria a votar nos candidatos não-apoiados pelos comunistas. Eram processos desse tipo que faziam com que os pés se mantivessem no chão, quanto aos limites do processo prático de luta.
Por outro lado, apesar de a teoria comunista da época afirmar que a revolução democrática e nacional seria realizada com base na aliança operário-camponesa, o trabalho de massa e o trabalho político entre o campesinato eram relativamente pequenos. Isto num período em que a população rural compreendia cerca de 70% da população total, e em que a expansão das fronteiras agrícolas era marcada por choques armados entre posseiros, grileiros e policiais militares.
Os comunistas chegaram a se envolver nas lutas dos posseiros em Porecatu, no Paraná, e em Trombas-Formoso, em Goiás. Essas experiências de luta, porém, pareciam contos de fadas para a grande maioria da militância. Além disso, os comunistas não tinham enraizamento entre os rendeiros, parceiros e foreiros, ou agregados dos latifúndios, nem entre os assalariados agrícolas, que começavam a ser empregados em algumas culturas agrícolas comerciais.
Nessas condições, a propalada perspectiva de uma aliança operário-camponesa não passava de retórica. Faltava trabalho real, seja econômico, social ou político, entre as camadas rurais de trabalhadores. Isso contribuiu para que os comunistas não prestassem a devida atenção ao significado do processo de modernização dos latifúndios, iniciado nos anos 1950, para liberar força de trabalho para a indústria urbana. Erroneamente, eles continuavam acreditando que a burguesia industrial tinha interesse na reforma agrária.
Wladimir Pomar é escritor e analista político.
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Comentários
Hoje, o PCB (felizmente) tem uma linha diametralmente oposta, a meu ver, a do Documento de Março de 58, rompendo com que ficou conhecido como "colaboração de classes", um termo forte é verdade, mas que corrobora com a análise equivocada sobre as "boas intenções" e "sentimentos nacionalistas, não colonizados" da burguesia brasileira. E quem, hoje exerce a mais enfadonha e perniciosa "colaboração de classes" a meu ver, é o PC do B, criado justamente pela cisão de inconformados com a então inflexão do PCB, sob as ordens de Stálim, e o abandono da internacionalização da Revolução, por interesses provenientes dos acordos do pós guerra, no novo redesenho "tordesilhesco" do mundo entre EUA, Europa e URSS.
Mas, onde quero chegar é na origem da grande parte da energia Revolucionária, utilizada inclusive, e por incrível que pareça, na própria organização do Partidos Comunistas no Brasil, alinhados e internacionalizados com a URSS e China principalmente, que é apontada e descrita no artigo do W. Pomar, com descrição factual das produtivas e politizantes jornadas grevistas e mobilizatórias.
E, não temo em afirmar que sua origem, a desta maravilhosa energia e ação popular de base está na gana, coragem e experiência em escaramuças várias, no combarte ao Capital e à Burguesia dos egressos e memória política dos Anarquistas, não só os históricos, mas os que compunham o que se conhecia como Ação Anti-Capitalista, a partir dos medos sec. XIX no Brasil, vigoroso na virada para o sec. XX, até a fundação do PCB em Março de 1922, na então gloriosa cidade e Niterói, onde resido, e que mhoje está se transformando em uma Miami, de tão alienada..
E por que digo “até Março de 22”? Porque é fato que boa parte da militância DA BASE que se incorporou ao PCB era proveniente do Movimento Anarquista, que também sofreu sua inflexão (na história não há “méritos” exclusivos – todos erram e acertam), com o perfilamento destes à Internmacional vigente.
Tenho cá minhas convicções ideológicas, eu diria fortemente influenciadas pelos Anarquistas originários (principalmnete Proudhon e Kropotnik, além de outros mais modernos), mas também refratário a muito do que também se intitula como Anarquismo mas, a meu ver, totalmente desfocado das tarefas necessárias, que muito ultrapassam o mero “reinvindicalismo” e a formação de uma espécie de “mundo paralelo”, de valor, mas apenas para soluções individuais.
Assim, quero ressaltar, seguindo a intenção de não jogar a criança (a esquerda) fora junto com a água do banho, que mesmo os marxistas e grande parte da esquerda brasileira, independente de preciosismos intelectuais ou divergências ideológicas precisam resgatar a gana por estar na Luta, “no chão das fábricas” (e outros cenários populares, que não a burocracia estatal e partidária).
Urge rejuvenescer a esquerda com o vigor das Mobilizações de Base e de Massas. Mas, para isso, precisamos convencer as lideranças que, ao meu ver, erram se incorporando a este pérfido Plano Internacional que tem em Lulla uma espécie de representante dos pobres, mas que se espelha nos chefes.
Na impossibilidade deste convecimento (e acho que está claro isso), não podemos ter receio em “dividir a esquerda”, os denunciando como cúmplices da burguesia e não dignos do título de esquerda, mas no máximo “esquerda”, pois não se divide o que não existe.
Temos de combater com mais vigor ainda, esta edição pós moderna do Documento de Março de 58, pois ele se repete como uma farsa e uma tragédia, ao mesmo tempo.
E, não vejo isso como ato arrogante, mas sim como um mecanismo de, no mínimo, instaurar um debate, mais do que necessário, sobre o que é Esquerda neste mundo pós moderno, onde as corporações sindicais, como previram muitoa anarquistas históricos, tornaram-se, e contentam-se em ser “sócios menores” da burguesia, do capital e adeptos do insustentável “progresso industrial-tecnológico-predado r e estratificanmte”, que não é nada mais que o modelo burguês de concentração dos bens e meios de produção, capital e patrimônios dfe clãs (agora corporativos), portanto incompatível com maioria da população, quenão é proletária industrial majoritariamente, e ainda com a Revolução Cibernética que se avizinha (nanociência, tecnologia robótica, comunicação virtual) será menos ainda. O Sindicalismo corre o risco de se tornar apenas a azeitona da empada do Capitalismo.
Portanto, para tentar contribuir com o rejuvenecer da maior parte da esquerda brasileira, em lembrança, quero aqui lembrar dois militantes anti capitalistas históricos , Clara Brandão (28-08-1891 a 28-01-1942) e Oswaldo Brandão - Tio José - (12-09 -1896 a 15 – 03 -1980) que nunca foram Anarquistas, mas sim Comunistas do PCB, mas que mantiveram acesa a chama do inconformismo, e por isso foram segregados por seus pares partidários na época. Então, neste período de 28 – 08 a 12 – 09 que compreende os aniversários de seus nascimentos, reverenciemos estes dois legítimos militantes de esquerda, inquietos e avançados em suas perspectivas históricas.
Bibliografia: Anarco Sindicalismo no Brasil – Jaime Cubero, História do Anarquismo no Brasil : organizado por: Rafael Demincis e Daniel Reis, Poesia: Laura e Otávio – Dionysia Brandão
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