Correio da Cidadania

Luta armada – começo da guerrilha

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No início de 1972, quando os destacamentos armados localizados no sul do Pará foram atacados e deram início à guerra de guerrilha, os camponeses do sudoeste do Ceará ainda precisavam passar, necessariamente, por um longo processo de lutas, de diversos tipos, para ganhar consciência política e se dispor a participar de uma luta armada. Não era possível forçar algum movimento de guerrilha, naquele momento.

 

Apesar disso, logo depois do ataque das forças militares contra os grupos que preparavam a luta armada no Araguaia, cresceram as pressões de uma parte da comissão executiva do partido para que transformássemos a região numa base armada. Essa pressão se tornou ainda mais forte em virtude dos golpes desferidos pela repressão policial-militar contra a direção partidária nas cidades.

 

Vários membros da comissão executiva foram assassinados, entre os quais os responsáveis pelos contatos com o dispositivo militar no Araguaia. Assim, em reuniões com os remanescentes da direção, inclusive com o antigo comandante daquele dispositivo militar, fui instado a apressar a preparação do trabalho militar no Ceará, para criar zonas de dispersão das forças inimigas.

 

Me vi às voltas, novamente, com as mesmas discussões de 1969. Disse compreender as dificuldades que os guerrilheiros e o partido estavam enfrentando, mas argumentei que não havia condições objetivas para realizar qualquer atividade armada no sudoeste do Ceará. Se os companheiros do dispositivo no sul do Pará não estavam preparados, seria possível imaginar que nós estávamos menos ainda.

 

No entanto, para minha surpresa, fui informado de que, ao contrário do que pensava e do que estava sendo divulgado, a luta armada naquela região não teria sido iniciada apenas pelo fato de o dispositivo militar secreto haver sido descoberto e atacado pelas forças militares da ditadura. O comando militar da região considerava que as forças revolucionárias estavam prontas e que as condições gerais estavam maduras para o início das operações militares.

 

Antes da intervenção das tropas da ditadura militar, estavam em planejamento alguns ataques de repercussão, fora da área das forças da guerrilha, para anunciar publicamente o início da guerra popular. Esse planejamento teria sido apenas abortado pela iniciativa das tropas do regime. Não se tratava, então, de pedir auxílio para uma situação inesperada, mas de mobilizar as demais áreas do país para incendiar a pradaria.

 

Essa avaliação sobre o amadurecimento das condições para o desencadeamento da guerra popular parecia ir na contramão das condições reais no restante do país e, certamente, do trabalho no sudoeste do Ceará. Embora aqui o partido houvesse crescido, e feito um esforço positivo para desenvolver as organizações populares, como as comunidades e os sindicatos de trabalhadores rurais, a mobilização era muito incipiente. Forçar uma situação armada seria um desastre.

 

Assim, embora algumas das lideranças partidárias da região tenham ficado sensibilizadas pela pressão da direção central, a resistência a realizar uma aventura militarista contou com o apoio da maior parte. Mas as pressões continuaram. Primeiro concentraram-se nos ataques à política de fingir-se de morto, aumentando as exigências para que o partido realizasse uma propaganda ampla de sua presença na região.

 

Paralelamente, numa conferência da direção local, com a presença de dirigentes de base e representantes dos comitês central e estadual, o representante do comitê central rompeu com o acordo de sigilo, declarando a todos minha condição de membro do comitê central e minha obrigação de cumprir as ordens da direção, sem restrições.

 

O desenlace, no início de 1973, numa reunião da comissão executiva, foi minha destituição da direção do trabalho partidário no sudoeste do Ceará e a saída imediata da região. O núcleo da divergência continuava sendo a questão da necessidade do trabalho político, como condição para a decisão sobre a luta armada.

 

Como, apesar de tudo, eu continuava membro do comitê central, e o número de dirigentes fora reduzido consideravelmente pelos golpes da repressão policial-militar, não era possível deixar-me totalmente à parte dos acontecimentos. O que me tornou uma peça ainda mais incômoda, principalmente com as novas divergências em torno da divulgação das notícias a respeito da guerrilha do Araguaia. Elas não tinham base nas notícias reais que chegavam ao nosso conhecimento por diversas vias, menos pelos combatentes, com os quais a direção do partido perdera qualquer contato.

 

Paralelamente a isso, diante do sangramento de quadros e militantes, como resultado da repressão haver se voltado para a liquidação das organizações urbanas do partido, este se via obrigado a discutir seriamente a política de fingir-se de morto, um dos principais pretextos para os ataques ao trabalho realizado no sudoeste do Ceará. Alguns, porém, ao admitirem essa necessidade, avaliavam-na como decorrente, momentaneamente, dos estertores da ditadura, no desespero de evitar que a guerrilha do Araguaia se espraiasse por todo o país.

 

De qualquer modo, havia um conjunto de situações negativas, constrangendo a direção partidária a, mais uma vez, voltar um passo atrás em relação à continuidade de minha participação. Fui incorporado ao processo de entendimentos com a Ação Popular, para o ingresso desta no partido. E foi em meio a isso que, no início de 1974, Ângelo Arroio conseguiu chegar a São Paulo e informar o desastre da guerrilha, no Natal de 1973.

 

A partir de então, participei ativamente daquilo que se poderia chamar de operação salvamento, na expectativa de que mais alguns houvessem escapado da carnificina.

 

Wladimir Pomar e escritor e analista político.

 

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Comentários   

0 #2 Marilia_Socióloga_SorocabaMarilia Carrenho Camillo Coltr 26-10-2009 15:15
Realmente é um depoimento contundente de uma época que marcou a história do país. Enquanto a massa, alienada com as pressões da mídia, muitos brasileiros lutaram incansavelmente pela dignidade do povo brasileiro. O "ame-o ou deixe-o" propunha um ufanismo exacerbado em demagogia, que resumia-se em amar a bandeira nacional, cantar o hino e adorar os "líderes" militares. Fui de uma época em que tinhamos que hastear a bandeira e cantar o hino todos os dias e lembro-me muito bem do retrato do Médici na sala de aula. Apesar dele, tive uma formação bastante crítica e não é de hoje que ouço falar em sobrenomes como, Pomar, Arroyo, Vanucchi, etc. Um dos acontecimentos mais marcantes e que os jovens de hoje desconhecem foi o massacre da Lapa, onde foram cruel e violentamente assassinados, os líderes partidários Pedro Pomar e Angelo Arroyo. Muitos afirmam que a polícia de repressão conseguiu a informação daquela reunião com seus informantes despratriados, pois o CCC era implacável.A polícia quando quer ser implacável ela consegue! Soube que minha mãe e tias paternas queimaram numa só tarde quase quinhentos livros considerados subversivos para a época. Tive um tio que fora exilado e um pai que possuia pseudônimo. Meu tio faleceu de doença de chagas e meu pai completará no próximo dia 5, 80 anos. Considero-o um sobrevivente da repressão. Ele conhecia Pedro Pomar e Angelo Arroyo, foram companheiros de luta, teve mais sorte. Porém, viu cair o muro de Berlin e ruir o bloco socialista. Viu a esquerda mundial e brasileira perderem seu referencial de luta e o movimento sindical tornar-se pelêgo. Vivemos, todos nós, de ideologia. Alimentamos nossas esperanças na luta no passado, mas; honestamente não vislumbro a possibilidade de alcançarmos nossos ideais de uma sociedade baseada na equidade, na ética e na dignidade. Marilia C Camillo Coltri_Socióloga e Professora Universitária_Sorocaba.
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0 #1 Duro Relato!Raymundo Araujo Filho 22-10-2009 09:42
É duro, e penso ser penoso, decertto, para o articulista expor este inventário históruico, do qual foi um dos protagonistas.

Mas, gostaria de deixar um adendo e um alerta a todos que lerem estas sensíveis análises do Wladimir Pomar, que o contrário de Colaboração de Classes (na época proposta pelo PCB, dwede 58) NÃO é necessariamente a Luta Armada.

Ao contrário, algumas vezes, como já vimos em nossa história, o tiro pode sair pela culatra, atingindo justamen5te quem se revilta, ou aquieles a quem quer defender.

O contrário de colaboração de Classes é Inserção Social, no seio do Povo, mas sem nenhuma proposta utilitarista, como se a população fosse uma massa pronta a ser moldada e "ganha" para as minhocas que temos em nossas cabeças, e com todo o direito de tê-las.

Apenas, que ou a inserção popular dfaqueles que ganham consciência política e não provêm extamante dos "bairros proletários", deve se dar através de um processo de viés cultural e afetivo, para que possamos ter credibilidade nas falas e ações políticas.

Querer recrutar quem quer que seja, apenas de forma utilitarista para uma tal "Revolução", nada mais é do que agir como os Capiães de Indústria fazem com seus operários, visando o lucro, os encarando como meras peças funcionais.

A Acolaboração de Classes e subserviência, mesmo um pouco crítica, a governos entreguistas, só porque é um ex-operário o Chefe, apenas é mais um capítulo para iludir o Povo.
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