Correio da Cidadania

Eventos históricos da disputa pelo pré-sal e a renda petroleira (2)

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Brasil e Petrobras são alvos da espionagem dos EUA – 2013

Documentos da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA) vazados pelo ex-analista da agência Edward Snowden indicam que a Petrobras foi espionada. Além da Petrobras, espionaram a presidente do Brasil e o Ministério das Minas e Energia (MME). (Ciriaco, 2013)

Cerqueira Filho relata em sua monografia:

“Os documentos divulgados por Snowden mostraram ainda que empresas que atuavam no Brasil foram parceiras da NSA em operações executadas em nosso território (GREENWALD, 2013). De acordo com estes documentos, apenas no mês de janeiro de 2013 a NSA tinha recolhido 2,3 bilhões de dados de usuários brasileiros (MAPA..., 2014). ” (Filho, 2014)

Operação Lava Jato e “cooperação internacional” - março de 2014

A operação teve início em 17 de março de 2014 e conta com dezenas de fases operacionais. Investiga crimes de corrupção ativa e passiva, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, organização criminosa, obstrução da justiça, operação fraudulenta de câmbio e recebimento de vantagem indevida.

De acordo com investigações e delações premiadas recebidas pela força-tarefa da Operação Lava Jato, estão envolvidos executivos da Petrobras, políticos dos maiores partidos do Brasil, incluindo presidentes da República, presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e governadores de estados, além de empresários de grandes empresas brasileiras. A Polícia Federal considera-a a maior investigação de corrupção da história do país. (Wikipedia, Operação Lava Jato)

Não se discute a necessidade de combater a corrupção. Controversa é a maneira de fazê-lo e as consequências econômicas e sociais do método da Lava Jato. Prisões preventivas alongadas, delações premiadas, suspeitas de relação indevida entre agentes do Estado, investigados e bancas de advogados, vazamentos seletivos e ilegais, condenações midiáticas e manipulação da opinião pública para defender interpretações controversas da Constituição. Resultando em politização da Justiça, enorme prejuízo para empresas brasileiras, desvalorização de ativos, depressão e internacionalização econômica.

Há denúncias de que “juízes e procuradores à frente da Lava-Jato tiveram parte significativa da sua formação acadêmica de pós-graduação bancada por instituições do governo norte-americano, com vários deles acabando cooptados pelas agências de inteligência dos EUA para que viessem a atuar, no âmbito do judiciário brasileiro, como agentes dos norte-americanos” (Naveira, 2018).

O jornalista Luís Nassif relatou declarações de Kenneth Blanco, vice-procurador adjunto do Departamento de Justiça dos EUA em evento ocorrido em julho de 2017.

“Depois, deu uma aula completa sobre como se desenvolveu o relacionamento do Departamento de Justiça (DOJ) com o Ministério Público Federal brasileiro, que ele taxou de melhor relação da história...

E também sobre a maneira como Sérgio Moro e os procuradores de Curitiba tiveram acesso a informações tão relevantes que permitiram a eles, no interior do país, assumir o controle de uma investigação cujos crimes foram cometidos no Rio de Janeiro com personagens de Brasília. Segundo Blanco, o Departamento de Justiça ajudou na coleta de provas e na preparação do caso. Criou-se uma relação de confiança que permitiu que procuradores tivessem comunicação direta, íntima, sem depender de procedimento oficiais, que geralmente levam tempo. Criou-se uma metodologia passando ao largo dos procedimentos legais. No início da investigação o procurador brasileiro pode ligar para seu parceiro estrangeiro e pedir informações. Quando a denúncia estiver pronta, formaliza o pedido de envio de provas, aí através do Ministério da Justiça.... “ (Nassif, 2018)

Golpe do impeachment da presidenta Dilma Roussef – maio de 2016

Não cabe aqui detalhar o processo que culminou com a destituição da presidenta eleita. Registro o fato geopolítico que irá marcar a mudança das políticas públicas relativas ao petróleo e demais setores sensíveis para a soberania nacional.

Temer assume agenda das multinacionais do petróleo e desgraça o Brasil – a partir de maio de 2016

Desde que Temer ascendeu ao poder, o governo assumiu a agenda das multinacionais do petróleo e de seus controladores. Trata-se da agenda do sistema financeiro internacional e dos países estrangeiros que controlam as multinacionais, privadas e estatais.

Mas o que exatamente desejam as multinacionais e seus controladores? Querem a propriedade do petróleo brasileiro, ao menor custo possível, com total liberdade para exportá-lo. Querem acesso privilegiado ao mercado brasileiro. Querem comprar os ativos da Petrobras a preço de banana.

Querem garantir a segurança energética dos seus países, no caso das estatais. Querem maximizar o lucro no curto prazo, no caso das privadas.
Resumo os principais pontos da agenda antinacional assumida pelo governo Temer no setor do petróleo:

1) Fim da liderança da Petrobras como operadora única no pré-sal; 2) Privatização dos ativos e desintegração da Petrobras; 3) Renovação dos subsídios à importação do REPETRO; 4) Redução das metas do conteúdo nacional; 5) Aceleração dos leilões de privatização do petróleo; 6) Alienação do petróleo excedente da Cessão Onerosa; 7) Redução dos impostos sobre a renda petroleira; 8) Privatização do petróleo da Cessão Onerosa; 9) Abertura do mercado de trabalho para estrangeiros; 10) Desvio da obrigação contratual do investimento em Pesquisa e Desenvolvimento e Inovação (PD&I) no Brasil. (Coutinho, Temer assume agenda das multinacionais do petróleo e desgraça o Brasil, 2017)

Nova política de preços da Petrobras, exportação de petróleo cru, importação de derivados e ociosidade do refino – desde outubro de 2016

A Petrobras adotou nova política de preços dos combustíveis, desde outubro de 2016. Em resumo, foram praticados preços mais altos que viabilizaram a importação por concorrentes. A estatal perdeu mercado e a ociosidade de suas refinarias chegou a um quarto da capacidade instalada.

A exportação de petróleo cru disparou, enquanto a importação de derivados bateu recordes. A importação de diesel se multiplicou por 1,8 desde 2015, dos EUA por 3,6. O diesel importado dos EUA que em 2015 respondia por 41% do total, em 2017 superou os 80% do total importado pelo Brasil.

Ganharam os produtores norte-americanos, os “traders” multinacionais, os importadores e distribuidores de capital privado no Brasil. Perderam os consumidores brasileiros, a Petrobras, a União e os estados federados com os impactos recessivos e na arrecadação. Batizamos essa política de “America first! ”, “Os Estados Unidos primeiro!”, como gostava de dizer Trump em sua campanha. (AEPET, Política de preços de Temer e Parente é “America First! ”, 2017)

“Parcerias estratégicas” é o novo codinome da privatização dos ativos da Petrobras – desde 2016

Pesquisa recente apontou que 70% dos brasileiros são contra a privatização da Petrobrás, enquanto 78% são contra o capital estrangeiro na companhia. (Folha de S.Paulo, 2018) Talvez por isso a atual direção da Petrobras evite usar a palavra “privatização”. Sob o eufemismo “parcerias e desinvestimentos”, o plano estratégico tem a meta de privatizar US$ 34,7 bilhões de ativos da estatal entre 2015 e 2018. (Petrobras, PNG 2017-2021, 2016) (Petrobras, PNG 2018-2022, 2018).

Até o momento foram firmados memorandos, acordos e contratos sob a bandeira das “parcerias estratégicas” com cinco multinacionais, a francesa Total, a chinesa CNPC, a inglesa BP, a estadunidense ExxonMobil e a norueguesa Statoil. As parcerias permitem a privatização dos ativos industriais e das concessões de petróleo e gás da Petrobras, sem seguir o regramento acordado com o TCU e descumprindo a legislação brasileira. (Bercovici & Coutinho, 2018)

Pagamento de US$ 2,95 bilhões aos acionistas dos EUA – janeiro de 2018

Sobre este fato reproduzo trechos da nota da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET).

“Nossa Associação recebeu com tristeza e indignação a informação de que a atual direção da Petrobrás acordou pagamento de quase dez bilhões de reais aos acionistas norte-americanos, para encerrar ação movida na corte de Nova Iorque.

Causa-nos repulsa constatar que apesar de a Petrobrás ser a vítima da corrupção, condição reconhecida pela companhia e pelas instituições competentes brasileiras, o Mistério Público e a Justiça, a atual direção decida indenizar, bilionária e antecipadamente, os acionistas norte-americanos.

Nossa Associação denunciou os prejuízos potenciais da perda da soberania brasileira ao alienar parcela relevante das ações da Petrobras na bolsa de valores dos EUA.

Agora vemos um dos mesmos responsáveis pela venda das ações e submissão as normas, legislação, cultura e interesses estrangeiros afirmar que “o acordo atende aos melhores interesses da companhia e de seus acionistas tendo em vista o risco de um julgamento influenciado por um júri popular, as peculiaridades da legislação processual e de mercado de capitais norte-americana, bem como o estágio processual e as características desse tipo de ação nos Estados Unidos...”.

Então a companhia é vítima, se reconhece como tal, assim como o fazem todos os poderes constituídos do Brasil, mas decide antecipar indenização multibilionária aos acionistas norte-americanos por causa do risco de se submeter a júri popular, peculiaridades e legislação ianque? O que é isso senão o pagamento histórico pela perda de soberania que é resultado, entre outros fatores, da venda das ações em Nova Iorque?

O pagamento desses dez bilhões de reais é mais uma etapa da transferência da renda petroleira brasileira, por sua vez fruto de um ato continuado de corrupção e de crime de lesa pátria... (AEPET, Nota da AEPET sobre acordo de pagamento de US$ 2,95 bilhões aos acionistas dos EUA, 2018)

Pré-sal representa mais de 50% da produção brasileira de petróleo - 2018

Entretanto, nenhum país se desenvolveu exportando petróleo por multinacionais. Nenhum país, continental e populoso como o Brasil, se desenvolveu exportando petróleo cru ou matérias primas.

O desenvolvimento do Brasil depende da utilização dos nossos recursos naturais em benefício da maioria dos brasileiros. Temos que superar a sina colonial e condenar as elites que servem aos interesses estrangeiros, em prejuízo da maioria. Os antigos senhores de engenho e seus feitores, são hoje os 0,01%, os rentistas, os executivos vassalos das corporações multinacionais e, no topo da cadeia parasitária, os banqueiros.

No artigo “Energia e desenvolvimento soberano em dez lições” - que escrevi a pedido da Escola Superior de Guerra – detalho dez fatos que todo brasileiro precisa conhecer, condição necessária para que se mobilizem para se apropriar das nossas riquezas, em benefício dos 99,99%.

São eles: 1) Qualidade de vida e consumo de energia são correlacionados; 2) Para que haja crescimento econômico é necessário aumentar o consumo de energia; 3) Não há substituto para o petróleo barato de se produzir, mas ele acabou e a humanidade vive as consequências econômicas e sociais deste fato; 4) Tudo depende da energia, do que comemos à internet; 5) Os combustíveis fósseis respondem por 86% da matriz energética mundial, os renováveis apenas 2,8%.

Destaco ainda: 6) As multinacionais privadas de petróleo são decadentes. O Brasil que tem a Petrobras, o pré-sal e potencial na produção dos renováveis, é um dos países mais espionados pelos EUA; 7) O Senador José Serra prometeu a Chevron mudar as regras da exploração do pré-sal, com a aprovação de seu projeto o governo Temer pretende acelerar os leilões de privatização do petróleo brasileiro; 8) Guerras são movidas por petróleo e na busca por mais petróleo, na disputa por matérias primas, assalariados e mercados entre as corporações e seus governos; 9) Desde 1973 se troca petróleo por dólares, os dólares são criados, sem lastro, pelo banco central norte americano em troca de títulos da dívida. Vender petróleo em troca de papel pintado não desenvolverá o Brasil; 10) A Petrobras é fundamental para garantir o desenvolvimento soberano do Brasil, assim como nossa segurança energética e alimentar. (Coutinho, A energia e o desenvolvimento soberano em 10 lições, 2017)

Conclusão

A descoberta e produção do petróleo do pré-sal pode ser o primeiro ciclo do tipo colonial e primário-exportador do século 21, repetindo o projeto econômico de séculos de exploração do Brasil. Também pode ser a base fundamental do desenvolvimento, com aumento da produtividade, desenvolvimento industrial, apropriação e distribuição da renda petroleira.

A História dará passos decisivos em 2018, mas quem a conduzirá?

O entreguismo pode ser mantido, interrompido ou revertido, o nosso futuro depende da consciência, da organização e da união popular para garantir a realização das Eleições Gerais de 2018 e determinar que seus resultados favoreçam a maioria dos brasileiros.

Parte 1


Referências

AEPET. (2017). Política de preços de Temer e Parente é “America First! ”. Fonte: https://felipecoutinho21.wordpress.com/2017/12/15/politica-de-precos-de-temer-e-parente-e-america-first/

AEPET. (2018). Nota da AEPET sobre acordo de pagamento de US$ 2,95 bilhões aos acionistas dos EUA. Fonte: http://www.aepet.org.br/w3/index.php/artigos/noticias-em-destaque/item/1200-nota-da-aepet-sobre-acordo-de-pagamento-de-us-2-95-bilhoes-aos-acionistas-dos-eua

Bercovici, G., & Coutinho, F. (2018). Parceria estratégica é novo codinome da privatização. Fonte: http://www.aepet.org.br/w3/index.php/artigos/artigos-da-aepet-e-colaboradores/item/1518-parceria-estrategica-e-novo-codinome-da-privatizacao

BP. (2017). BP Statistical Review of World Energy. Fonte: https://www.bp.com/en/global/corporate/energy-economics/statistical-review-of-world-energy.html

Ciriaco, D. (2013). Por que os EUA espionam o Brasil? Fonte: https://www.tecmundo.com.br/espionagem/45400-por-que-os-eua-espionam-o-brasil-.htm

Coutinho, F. (2017). A construção da ignorancia sobre a Petrobrás. Fonte: https://felipecoutinho21.files.wordpress.com/2017/02/a-construcao-da-ignorancia-sobre-a-petrobras_por-felipe-fev17.pdf

Coutinho, F. (2017). A energia e o desenvolvimento soberano em 10 lições. Fonte: http://www.aepet.org.br/w3/index.php/artigos/noticias-em-destaque/item/641-a-energia-e-o-desenvolvimento-soberano-em-10-licoes

Coutinho, F. (2017). Temer assume agenda das multinacionais do petróleo e desgraça o Brasil. Fonte: https://felipecoutinho21.wordpress.com/2017/11/02/temer-assume-agenda-das-multinacionais-do-petroleo-e-desgraca-o-brasil/

Estadão. (2008). Roubo de dados da Petrobras foi espionagem, diz PF. Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,roubo-de-dados-da-petrobras-foi-espionagem-diz-pf,127128

Filho, C. R. (2014). OS ARQUIVOS SNOWDEN: o episódio e os reflexos no Brasil. Fonte: http://www.esg.br/images/Monografias/2014/CERQUEIRAFILHO.pdf

Folha de S.Paulo. (2018). Sete em cada dez brasileiros são contra privatizações. Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/12/1945999-sete-em-cada-dez-brasileiros-sao-contra-as-privatizacoes.shtml

Lessa, R. (2018). Petrobrás perde influência no Brasil com chegada de estrangeiras. Fonte: http://www.aepet.org.br/w3/index.php/artigos/noticias-em-destaque/item/1596-petrobras-perde-influencia-no-brasil-com-chegada-de-estrangeiras

Montesanti, E. (2016). Onda de Protestos no Brasil: Primavera ou Massa de Manobra? Fonte: http://port.pravda.ru/sociedade/curiosas/19-03-2016/40606-brasil_manobra-0/#

Nassif, L. (2018). Xadrez de como os EUA e a Lava Jato desmontaram o Brasil. Fonte: https://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-de-como-os-eua-e-a-lava-jato-desmontaram-o-brasil-por-luis-nassif

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OperaMundi. (2017). Wikileaks: EUA criou curso para treinar Moro e juristas. Fonte: http://operamundi.uol.com.br/dialogosdosul/wikileaks-eua-criou-curso-para-treinar-moro-e-juristas/15072017/#comments

Petrobras. (2016). PNG 2017-2021. Fonte: http://www.petrobras.com.br/fatos-e-dados/plano-estrategico-da-petrobras-tem-metricas-para-aumentar-seguranca-e-baixar-alavancagem.htm

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Wikipedia. (s.d.). Operação Lava Jato. Acesso em 2018, disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Opera%C3%A7%C3%A3o_Lava_Jato

Wikipedia. (s.d.). Quarta Frota dos Estados Unidos. Acesso em 2018, disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Quarta_Frota_dos_Estados_Unidos#Reativação_em_2008

Felipe Coutinho é presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

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