Brasil e o ciclo extrativo do petróleo
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- Felipe Coutinho
- 23/10/2019
O Brasil está sendo submetido à exploração do tipo colonial, depois dos ciclos do pau-brasil, do açúcar, do ouro, prata e diamantes, do café, da borracha e do cacau, é a vez do ciclo extrativo e primário exportador do petróleo brasileiro.
O petróleo do Brasil tem sido exportado em volumes recordes, cerca de 1,2 milhões de barris de petróleo por dia, volume equivalente a 45% da produção de petróleo cru no país.
Existe relação entre o consumo de energia, o crescimento econômico e o desenvolvimento humano. O consumo per capita de energia no Brasil é muito baixo, quase seis vezes menor em relação aos Estados Unidos e quase cinco em relação à Noruega. No entanto, quase metade do petróleo produzido no Brasil não tem sido consumido no país, está sendo exportado, em grande medida por multinacionais estrangeiras.
Enquanto se exporta o petróleo cru do Brasil, o país importa cada vez mais seus produtos refinados. São importados cerca de 500 mil barris de derivados de petróleo por dia, a maior parte produzida nos Estados Unidos.
A política de preços da Petrobrás, desde 2016, é de paridade em relação aos preços dos combustíveis importados. A prática de preços mais altos que os custos de importação tem viabilizado a lucratividade da cadeia de importação e a competitividade dos combustíveis importados, em especial dos Estados Unidos.
O combustível brasileiro mais caro perde mercado para o importado, o que resulta na ociosidade das refinarias da Petrobrás, em até um quarto da sua capacidade.
O consumidor brasileiro paga preços vinculados ao petróleo no mercado internacional e à cotação do dólar, além dos custos estimados de importação, apesar do petróleo ser produzido no Brasil e de haver capacidade de refiná-lo no país. Enquanto isso a Petrobrás perde mercado.
De janeiro a julho de 2019, 82% do diesel importado pelo Brasil foi produzido nos Estados Unidos. Da gasolina 71% e do etanol - que ocupa o mercado da gasolina - 94%.
Nenhum país se desenvolveu exportando petróleo cru por multinacionais estrangeiras e importando produtos refinados, é preciso estancar as veias dilaceradas do Brasil e interromper este novo ciclo do tipo colonial.
Crescimento econômico depende do aumento do consumo de energia
Existe forte correlação entre o crescimento econômico e o consumo de energia. Para que haja crescimento da economia, do Produto Interno Bruto (PIB), é necessário aumentar o consumo de energia.
Figura 1: Produto Interno Bruto (PIB) mundial em função do consumo de energia primária (Tverberg, 2018)
Melhora do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) depende da elevação do consumo de energia per capita
Para a melhora das condições de vida - que podem ser medidas pelo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) - é necessário o aumento do consumo de energia por pessoa.
Figura 2: Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em função do consumo de energia por pessoa para diversos países (R. J. Fragaszy, 2011)
Consumo per capita de energia no Brasil é muito baixo
O consumo brasileiro de energia por pessoa é muito baixo. No Brasil se consome cerca de seis vezes menos energia por pessoa em comparação com os Estados Unidos. Em relação à Austrália cinco vezes menos, e na comparação com a Noruega o consumo é 4,5 vezes menor.
É necessário aumentar muito o consumo da energia no Brasil para que haja crescimento da economia e melhoria nas condições de vida e desenvolvimento humano.
Figura 3: Consumo de energia primária por pessoa em vários países, em mil toneladas de petróleo equivalente por milhão de pessoas (2014)
Matriz energética mundial revela a importância dos fósseis
As fontes primárias de origem fóssil - carvão, petróleo e gás natural - responderam por 80,2% da demanda total em 2000. Em 2017, a participação dos fósseis se elevou para 80,8%.
A participação das energias de origem fóssil na demanda de energia mundial se manteve estável nos últimos 25 anos. É improvável que percam importância relativa nas próximas décadas, considerando sua qualidade (flexibilidade, facilidade de uso, densidade energética e confiabilidade) e quantidade (disponibilidade), em comparação com as demais fontes primárias de energia.
Figura 4: Consumo por fonte de energia primária mundial (2017) (IEA, 2019)
Política de preços causou ociosidade das refinarias da Petrobrás
A Petrobrás produz e refina o petróleo nacional, e, com isso, produz combustíveis de alta qualidade no Brasil. Mas a direção da Petrobrás, desde 2016, decidiu adotar preços equivalentes aos da importação para os combustíveis produzidos nas suas refinarias.
Com preços altos em relação ao custo de importação, o diesel da Petrobrás fica encalhado nas suas refinarias e parte do mercado brasileiro é transferido para os importadores. A ociosidade das refinarias brasileiras aumenta, há redução do processamento de petróleo e da produção de combustíveis no Brasil. Aumenta, ainda, a exportação de petróleo cru.
A elevação do preço relativo do diesel aos produtores e importadores no Brasil tornou lucrativa e viabilizou a elevação da importação do combustível, como consequência as refinarias da Petrobrás ficaram com um quarto de sua capacidade ociosa.
Figura 5: Preços médios ponderados aos produtores e importadores de óleo diesel no Brasil relativo ao preço spot no porto de Nova Iorque e ociosidade das refinarias da Petrobrás (2014-2017)
Em 2018 houve a greve dos caminhoneiros e foi adotada pelo governo a subvenção aos produtores e importadores de diesel de até R$ 0,30 por litro. A limitação do preço aos produtores e importadores foi compensada com a subvenção, a ociosidade das refinarias da Petrobrás se manteve elevada, em 24%.
De janeiro a julho de 2019, o preço médio do diesel aos produtores e importadores no Brasil foi 25% superior ao preço internacional no porto de Nova Iorque. No 2º trimestre de 2019 a ociosidade das refinarias da Petrobrás se manteve alta, em 24%
Elevação da exportação de petróleo cru e da importação de derivados
A produção e a exportação do petróleo cru brasileiro têm aumentado significativamente.
Em 2013, foram produzidos 2,1 milhões de barris equivalentes de petróleo por dia (bep/dia), dos quais 19,1% foram destinados à exportação. Em 2019, de janeiro a junho, foram produzidos 2,7 milhões de bep/dia e exportados 44,7%.
Figura 6: Produção de petróleo no Brasil (bep/dia) e fração destinada à exportação. (Ano de 2019 referente ao período de janeiro a junho)
Em termos líquidos, a exportação de petróleo cru descontada da importação, também tem aumentado muito nos últimos anos.
Em 2013, não houve exportação liquida de petróleo cru, a importação foi residualmente maior que a exportação. Em 2019, de janeiro a junho, a exportação liquida de petróleo superou um milhão de barris por dia.
Figura 7: Exportação líquida de petróleo cru, em bep/dia (Ano de 2019 referente ao período de janeiro a junho)
Enquanto a exportação de petróleo cru dispara, a importação dos derivados de petróleo também aumenta.
Em termos líquidos, a importação de produtos refinados do petróleo aumentou por três vezes entre 2015 e 2019. Em 2015 foram importados 160 mil, enquanto em 2019 (de janeiro a junho) foram 482 mil bep em derivados.
Figura 8: Importação líquida de derivados de petróleo, em bep/dia (Ano de 2019 referente ao período de janeiro a junho)
Elevação da produção de petróleo por multinacionais estrangeiras
A elevação da exportação do petróleo cru brasileiro, com o aumento da importação dos produtos refinados e da ociosidade das refinarias da Petrobrás, foi acompanhada da elevação da produção de petróleo do Brasil por multinacionais privadas e estatais estrangeiras.
Em maio de 2019, a Petrobrás, na condição de empresa concessionária, foi responsável por 75,15% da produção nacional de petróleo e gás natural, alcançando 2,61 milhões bep/d. A Shell/BG Brasil, com a produção de 427 mil bep/d, que representa 12,29% do total nacional, classificou-se como a 2ª em produção. A 3ª empresa concessionária com maior produção foi a Petrogal Brasil, tendo obtido 3,36% da produção do País, com média de 117 mil bep/d. A Repsol Sinopec foi responsável por 2,62% da produção nacional, sendo a 4ª concessionária com maior produção, obtendo 91 mil bep/d. A Equinor Energy, como a 5ª maior concessionária, produziu 1,47%, com 51 mil bep/d e a Equinor Brasil, como a 6ª produtora, atingiu 1,15% da produção, com 40 mil bep/d. As demais concessionárias alcançaram a parcela de 3,96% da produção nacional, com o volume de 137,4 mil bep/d.
Em termos absolutos e relativos cresce a desnacionalização da produção do petróleo brasileiro.
Figura 9: Produção total de petróleo e gás natural, em bep/dia, por concessionário, relativa ao mês de maio no período de 2013 a 2019 (MME, 2019)
China e Estados Unidos são os maiores importadores de petróleo cru do Brasil
Uma típica colônia extrativa e primário exportadora fornece matérias primas a países estrangeiros, sem agregar valor, e importa produtos, tecnologias e serviços valorizados.
Em maio de 2019, foi exportado petróleo cru do Brasil para os seguintes países: China (51%), EUA (21%), Uruguai (6%), Chile (5%), Espanha (4%) e outros (13%).
Elevação da importação combustíveis produzidos nos Estados Unidos
Enquanto China e Estados Unidos são os principais destinos da exportação do petróleo cru brasileiro, na importação dos combustíveis pelo Brasil a hegemonia é dos Estados Unidos.
Em 2015, o diesel produzido nos Estados Unidos representou 41% do total de 16200 toneladas por dia importado pelo Brasil.
Em 2019, de janeiro a julho, a fração do diesel importado dos Estados Unidos se elevou para 82% do total importado que alcançou 25561 toneladas por dia.
Figura 10: Importação do diesel pelo Brasil e fração originada dos Estados Unidos (Ano de 2019 referente ao período de janeiro a julho)
Para a gasolina também, tanto a importação total, quanto a proveniente dos Estados Unidos dispararam desde 2015.
Em 2015, a gasolina produzida nos Estados Unidos representou 23% do total de 5020 toneladas por dia importadas pelo Brasil.
Em 2019, de janeiro a julho, a fração da gasolina importada dos Estados Unidos se elevou para 71% do total importado que se elevou para 9874 toneladas por dia.