Correio da Cidadania

A Eletrobras aguentou o “desanimado” setor privado

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O argumento principal sobre a privatização da Eletrobras tem sido o de que, no Brasil, com o tipo de sistema elétrico que tem, não há sentido ter o setor privado dono de tudo. É o argumento da empresa pública “estratégica”. Deveria ser suficiente, mas, estamos no Brasil.

Esse motivo sozinho esquece de contestar que, o setor privado, ao contrário do que propala o ministro Paulo Guedes, nunca teve o interesse de investir na expansão por sua conta e risco na proporção necessária.

Seria bom ter dados concretos dos investimentos, início de obras e empresas responsáveis, mas tal dado não está disponível. Os problemas de transparência de dados é muito grave no Brasil. Como um exemplo, a ANEEL só divulga dados de tarifas a partir de 2003, apesar da agência existir desde 1996.

Assim, vejam esse esforço de Sherlock Holmes de tentar mostrar o que nos parece óbvio.

O gráfico abaixo é o dado de capacidade instalada anual em MW. A fonte é o Balanço Energético o que já é uma aproximação, pois o que nos interessa é o dado apenas do sistema interligado. Mas, como a proporção é muito alta, temos que aceitar que estamos no Brasil e esse número básico não se encontra facilmente.

Vejam como um gráfico pode enganar. A derivada (inclinação) é mais alta depois do ano 2002. Então, estaríamos errados! O sistema de mercado adicionou mais usinas de que o sistema de serviço público!

Só que esquecem que a curva é de MW! No período privado mercantil as térmicas fizeram a festa. Primeiro, o programa de térmicas emergenciais de FHC. Depois, de 2006 até hoje, abandonando novos projetos hidroelétricos, as térmicas triplicaram. Caras, geram sua inflexibilidade ou um pouco mais com as bandeiras. Muito MW e pouco MWh. Térmicas com fator de capacidade de 10% são comuns. Portanto, o gráfico pode iludir.

Um outro modo é ver o acréscimo percentual de cada ano.

 

O período da “ideia fixa” em privatizar é esse aqui.

Estimando que, em média, o início do investimento se dá 3 ou 4 anos antes da entrada em operação das usinas, se a curva é deslocada para 3 ou 4 anos antes, o resultado é esse. Reparem no “vale” de 2003 a 2007.

Outra maneira de evidenciar essa ausência de investimentos é lembrar que, historicamente, para manter o equilíbrio oferta demanda, seria preciso ter, no mínimo, 2.000 MW novos todo ano, pois a carga cresce a essa taxa de 2001 até 2015.



Uma estimativa dos MW médios acrescidos pode ser feita adotando um Fator de Capacidade de 50% até 2006 e dali em diante, 40% por conta da entrada das térmicas. O FC de 40% poderia ser até menor, mas, mesmo adotando essa hipótese, vejam o resultado.

 

Ou seja, a década de 90, com as tarifas das então estatais sendo usadas para conter inflação, foi um desastre e o racionamento de 2001 não deveria ser surpresa.

Mas, mesmo depois dessa penúria e do racionamento, não se aprendeu a lição, pois há um verdadeiro “buraco” de novos MW médios não construídos de 2002 até 2007.

Traduzindo:

Depois da liquidação do governo FHC (onde foi vendida toda a geração da Eletrosul), depois do racionamento com queda de 15% da carga e com o verdadeiro Bolsa MW com energia quase gratuita no período 2003 – 2012 no mercado livre, na área azul, temos apenas uma “pista” reveladora que o setor privado não investiu o necessário para substituir a já fragilizada Eletrobras. Daí a necessidade de Sociedades com o setor privado, pois, sem elas, nada feito! Não se esqueçam do BNDES!

Como “estratégia” final desse período, ainda foi aplicada a intervenção nas tarifas no governo Dilma, que, mesmo depois de todo esse histórico, achou que era justo reduzir tarifas recordes às custas da Eletrobras.

A falta de transparência de dados que deveriam ser públicos nos obriga a um comportamento de Sherlock Holmes. Será alvo de críticas, mas, se forem, dão oportunidade de pedirmos os números que contestem.

No país em que cidadãos morrem por falta de atendimento médico, crianças ficam semianalfabetas por falta de escola e espaços públicos são dominados por milícias, o que se poderia esperar?

Roberto Araujo é engenheiro, ex-assessor da Eletrobrás e diretor do Instituto Ilumina.

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