Setor Elétrico por dois lados
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- Roberto Pereira D’Araujo
- 15/02/2022
O ponto de vista do consumidor: Atualizando os dados relativos às tarifas médias nos setores residencial e industrial com os dados de 2021 até junho, os aumentos de custos para o consumidor, acima da inflação, estão mostrados no gráfico abaixo.
Nesses números não estão incluídos os dados das bandeiras tarifárias. A bandeira da “escassez”, é R$ 14,2 por cada 100 kWh, ou R$ 142/MWh. No caso do setor residencial, a aplicação dessa bandeira significa um aumento de 22%.
Ao comparar essa bandeira com os valores que venceram leilões para energia nova (usinas novas), fica claro que o nível chega a ser superior a alguns casos.
Por exemplo: Leilão A-3 e A-4 de 2021: R$ 136/MWh para Eólicas e R$ 123/MWh para fotovoltaicas. Portanto, o consumidor está pagando hoje o que um investidor aceitaria para construir um novo ativo de geração. É uma evidência adicional de que faltam usinas, pois está mais caro gerar e consumir um MWh adicional do que construir um ativo que gere esse MWh.
Já chamamos a atenção para a posição brasileira em comparações internacionais de preço de energia. Veja aqui, vale a pena dar uma lida.
O ponto de vista das empresas
Agora, é interessante ver o outro lado. Como estão as finanças do nosso setor elétrico, que já é majoritariamente privado? A nossa fonte de dados é a publicação Valor 1000, que analisa as 1000 empresas mais importantes de toda a economia brasileira.
Em primeiro lugar, os números dos dez setores mais produtivos. Os dez que mais contribuíram em algumas medidas. Abaixo, três importantes situações.
Aumento do EBTIDA (earnings before interest, taxes, depreciation and amortization), em português, também é conhecido como LAJIDA, ou lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização. EBITDA e LAJIDA são o mesmo indicador.
Como se pode perceber, o impressionante aumento tarifário vivido desde 1995, proporcionou uma situação muito confortável para as empresas do setor, apesar da crise econômica e sanitária que vivemos.
Abaixo, mais alguns dados que deixam evidente que a energia elétrica é cara para o consumidor, mas é um ótimo negócio para as empresas.
Empresas ainda estatais em vermelho, privadas em preto e comercializadoras em azul.
Hoje, ao contrários das posições de liderança do passado, a Eletrobras ocupa o 27o lugar entre as empresas brasileiras com maior receita líquida, e, nessa medida, no setor elétrico, já perde para ENEL, NEOENERGIA e CPFL.
Ainda é preciso olhar com cuidado a receita líquida da Eletrobras. Além de estar faturando uma receita reduzida pelos ativos atingidos pela MP 579, está recebendo indenizações de ativos não corrigidos desde 2017, cujo pagamentos foram alterados pela ANEEL como mostra o gráfico abaixo. Portanto, a receita líquida não é inteiramente originada da venda de serviços e nem é uma receita recorrente.
Este é o quadro geral do nosso setor elétrico e esperamos que as autoridades, os técnicos, os empresários e a agência reguladora ANEEL reconheçam que há muita coisa errada. Como consumidores e cidadãos, temos que exigir que haja um diagnóstico profundo e isento do que ocorreu nos últimos 30 anos que foi capaz de destruir a grande vantagem comparativa que tínhamos.
Roberto Pereira D'Araujo é engenheiro, ex-assessor da Eletrobrás e diretor do Instituto Ilumina.